Desde que Lula assumiu o governo, formando em torno de si um heterodoxo e complexo grupo de apoio, tornou-se possível realizar as reformas, em especial a tributária e a previdenciária. Isso porque, além de construir uma base parlamentar muito maior do que as suas próprias tropas petistas, ainda atraiu (não de graça!) outras forças políticas, inclusive o PMDB. Contou ainda com a preocupação de coerência do PSDB e do PFL, partidos que formaram a base do governo Fernando Henrique Cardoso. Esses partidos e FHC tentaram as reformas, com maior empenho a da Previdência, que só não se concretizou em razão da dura oposição do PT. Que ironia! Hoje, peessedebistas e pefelistas comprometem-se com a reforma para serem fiéis ao que pregaram no passado, facilitando assim a tramitação os projetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O movimento contra as reformas e os primeiros arranhões no elevado prestígio de Lula surgiram dentro do próprio PT: 24 deputados são contra pontos cruciais da reforma da Previdência e, principalmente, contra a política econômica do atual governo, que consideram o prosseguimento da praticada por FHC. Prosseguimento com maior rigor. Também das partes interessadas, categorias que sairão perdendo, como professores e magistrados, que começam a se manifestar, até vaiando Lula ou fazendo ruidosas passeatas.
Quando esses movimentos de oposição a pontos da reforma previdenciária, dentre elas a idade para aposentadoria e a taxação dos inativos, começam a ganhar corpo e a criar forças para pressionar o Congresso Nacional, que em última instância tomará as decisões, parece que Lula comete senão um erro, pelo menos uma temeridade política.
Fernando Henrique Cardoso, no “site” do PSDB, fez algumas críticas à administração Lula, a principal das quais a demora para baixar os juros. Essa crítica é a mesma que fazem, hoje, quase toda a população, sindicatos e empresários. Poderia ter desagradado o presidente, mas não justificaria a reação que teve. Excelente orador, Lula respondeu com firmeza a FHC, dizendo que recebeu dele o País quebrado e que em apenas seis meses já recuperou o real em relação ao dólar e o chamado risco Brasil caiu pela metade. Verdade, se bem que até o início do governo Lula esses constrangimentos se deviam aos temores do mercado em relação ao que Lula, como um candidato com história de esquerda, faria uma vez no governo.
Decidindo brigar, não aceitando a moderada crítica de seu antecessor, Lula põe em risco o apoio que para as reformas vem recebendo do PFL e principalmente do PSDB. É certo que as bancadas desses dois partidos não chegarão a votar contra as reformas, mas é provável que, em alguns pontos que o governo Lula considera essenciais, passem a somar-se com os chamados rebeldes do PT e com as classes que se consideram ameaçadas de prejuízos.
Quebra-se, assim, uma paz que muito interessava ao governo Lula e que seu ardor político e sua eloqüência puseram a perigo.
As reformas tributária e da Previdência serão aprovadas, mas agora é mais provável que isso não aconteça exatamente como desejava o governo.