O ministro do Trabalho, Ricardo Berzoini, anda um pouco triste. Um ano depois de lançado, o programa Primeiro Emprego está um fracasso. Da meta de setenta mil vagas previstas, pouca coisa mais que duas mil foram criadas e das mais de setecentas mil empresas convidadas a participar, pouco mais de quatro mil se inscreveram. No cadastro nacional do Primeiro Emprego, entretanto, quase duzentos mil jovens entre dezesseis e vinte e quatro anos aguardam vez. No Brasil dos trabalhadores, descobriu o ministro, não está fácil nem o primeiro, nem os demais empregos.

Entre as causas do fracasso estão algumas conhecidas. Entre elas, as dificuldades econômicas e os juros altos que, com o endereço no combate à inflação, freia os investimentos. Embora o governo diga que não, vai bem quase só empresa que trabalha com exportação. Quem cuida do mercado interno está de mãos atadas. Outra, para não dizer mais: a velha e conhecida burocracia. Somente para se inscrever no programa Primeiro Emprego cada empresa tem que apresentar quatro certidões negativas. Depois de esperar algum tempo para a indicação do candidato à vaga, o empregador descobre que para receber os subsídios previstos em lei a luta é ainda maior. Descobre-se assim, tardiamente, que lei ou decreto (nem mesmo apenas vontade política) não cria emprego.

Mas que o ministro Berzoini não fique triste por muito tempo. No governo a que ele serve as preocupações maiores e mais urgentes nem sempre são as sociais, repetidas em tantos discursos desde antes da posse, há quase dois anos. A provar a assertiva está aí a escalada cada vez mais crescente dos tributos e contribuições cobrados dos contribuintes. E a confirmar a escalada, a mais nova iniciativa pertence à seara do próprio Berzoini – o Ministério do Trabalho: medida administrativa acaba, na prática, com o serviço de fiscalização do trabalho infantil em todas as Delegacias Regionais do Trabalho e transforma cada fiscal num agente forçado a cumprir metas para o aumento da arrecadação baseada na fiscalização de irregularidades trabalhistas. Fato que, dadas as características de nossa legislação, inibe a criação de novos empregos formais e incentiva a informalidade.

Uma portaria publicada no último dia 15 acaba com os Grupos Especiais de Combate ao Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente – Gectipa, criados no governo anterior em todas as DRTs do País. Tais grupos foram responsáveis pela retirada de quase um milhão de crianças do trabalho irregular (às vezes, quase escravo) desde 1996. A portaria criou o que chama de Gratificação de Incremento da Fiscalização e da Arrecadação – Gifa, ao mesmo tempo em que estabeleceu metas para o bônus concedido aos agentes fiscais (cerca de R$ 2.200 mensais).

A gratificação tem como endereço o aumento de uma fiscalização que traga arrecadação para o Tesouro Nacional. Não há nada relacionado ao trabalho infantil, mas pontos concedidos pelo número de empresas notificadas, por direitos trabalhistas regularizados, por verificação de pagamento do FGTS, e aí por diante. Ações que não contribuam para o reforço orçamentário ficam de fora. Pelo menos por enquanto. Mesmo que algum fiscal resolva dar uma de xerife por conta própria, será desestimulado a partir do momento em que ele percebe que não está contribuindo para as metas que, em tese, beneficiam a todos os colegas do grupo. Consta que a medida não está agradando nem mesmo aos fiscais que são incentivados à base de polpudas gratificações. “A prioridade agora é nenhuma – diz um fiscal frustrado e precavido no anonimato. É um trabalho de anos, que deu certo, jogado fora.”

Se no seio da corporação beneficiada há insatisfação pela medida, que dizer do resto? A máquina do Estado, não há dúvida, precisa estar a serviço do cumprimento das leis. Mas é preciso que isso seja feito na dose certa, e com o intuito de contribuir para esse esforço maior e coletivo que é alcançar o desenvolvimento e a paz social. Em época de vacas magras, só as do governo ruminam em verdes pastagens. Uma ordem assim explícita para arrecadar, enquanto se descuidam compromissos importantes na área social, como dizíamos inicialmente, não ajuda nem o primeiro emprego, nem os demais dez milhões prometidos solenemente.

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