O governo, o Congresso e a Justiça brasileiros brigam. Aqueles reclamam controle externo do Poder Judiciário, apoiados pela OAB, agora presidida, pela primeira vez, por um paranaense.
Sobre o assunto, há mais emocionalismo que discernimento, embora pareça claro que, sendo o Brasil uma democracia, pelo menos na intenção, não pode tolerar interferências externas no Poder Judiciário que possam significar intromissões em suas decisões, prerrogativas e independência.
Isso, entretanto, não anula a idéia de controle externo. Seus limites é que irão ditar sua admissibilidade ou não. Não poderá esse órgão de controle externo mudar sentenças. Seria colocar no Judiciário uma cunha ditatorial. Nas ditaduras é que gente de fora manda na Justiça. E no Poder Legislativo. Isto quando admitem que exista, pois a maioria dos governos de força simplesmente fecha as casas legislativas ou as faz de marionetes, como ocorreu na última ditadura brasileira.
Nessa discussão, é preciso esclarecer bem que intervenção se pretende numa Justiça que, evidentemente, não funciona de acordo com as necessidades da nação. Que não funciona de acordo com as necessidades do nosso povo, concordam todos, inclusive, se não principalmente, o próprio Judiciário. Esse esclarecimento se faz urgente não só para acabar com os arrufos que estão comprometendo o bom nome do Judiciário, como para evitar que se macule, como está acontecendo, a sua imagem até no exterior.
Asma Johangir, relatora especial da ONU para execuções sumárias, que já propôs uma inaceitável intervenção internacional no Judiciário brasileiro, divulgou há poucos dias um relatório em que diz que os tribunais brasileiros “não inspiram confiança”. Lembra ela que há uma grande confusão entre a independência que se quer para o Judiciário brasileiro, verdade que acabamos de referir e que nos parece evidente. E inconveniente. No mesmo relatório, a senhora Asma ataca as freqüentes violações de direitos humanos cometidas pela Polícia Militar, no Brasil, omitindo inexplicavelmente a Polícia Civil, que muitas vezes também desrespeita direitos humanos. E fazendo com que, lá fora, confundam tais atos arbitrários de autoridades policiais com os problemas que ocorrem no Poder Judiciário.
Ela, falando da reforma do Poder Judiciário e do pretendido controle externo, lembra o que nos parece essencial. Que falta nesse projeto uma reforma no direito processual. Há sempre preocupação com o direito substantivo e nenhuma com o adjetivo, embora este seja o principal responsável pelo acúmulo de processos, a lentidão nos julgamentos, o engavetamento, muitas vezes por anos, de causas que deveriam ser julgadas em curto espaço de tempo. E pelo excesso de recursos protelatórios. A súmula vinculante, embora tenha adversários bem armados de argumentos, nos parece um dos caminhos para reduzir o número de processos na Justiça, desentravando o seu funcionamento. Além da súmula vinculante, há uma larga responsabilidade dos poderes executivos, pois estes não respeitam os direitos dos cidadãos e não cumprem, de pronto, as decisões judiciais contra si prolatadas. Estancam o funcionamento da Justiça, perdendo autoridade para contra ela reclamar e pretender impor-lhe um controle externo.
É verdade, como diz a autoridade da ONU, que nossos tribunais não inspiram confiança. Mas também é verdade que os argumentos contra eles levantados também não são dos mais confiáveis.