Penso que toda convivência a dois deva seguir uma receita básica: egoísmo do ser e altruísmo do agir.
O egoísmo pode ser uma virtude desde que esteja limitado ao campo do ser, ou seja, à individualidade de cada um. Toda pessoa deve, primeiramente, respeitar-se e valorizar-se. Assim, quanto mais se dedicar ao aprimoramento do próprio caráter, mais chance haverá do relacionamento se estruturar de modo saudável. A entrega à pessoa amada, por exemplo, não deve nunca ser da própria vida, pois o preço que se paga é muito alto. A abnegação do ser é uma atitude sempre insensata (e muitas vezes covarde). É um fardo que ninguém quer carregar. Às vezes, até se carrega por um tempo, mas não por muito. Até mesmo aquele que abriu mão da individualidade por amor, um dia irá se arrepender amargamente e não tardará alegar que fez isso pelo relacionamento e, pior, que não teve a devida recompensa ou reconhecimento.
As atitudes, sim, é que devem ser altruístas e generosas. Conviver bem é ser generoso por excelência. Uma das regras de ouro do relacionamento é, obviamente, fazer ao outro o que gostaria que ele fizesse a você. Antes de cobrar uma atitude ofereça a sua, e assim por diante. A cobrança de atitudes é um jogo cansativo e desgastante onde sempre ambas as partes saem perdendo. No caso da convivência amorosa, deve-se saber que amar é, antes, uma profissão de fé. Ama-se pelo prazer de amar, pelo prazer de fazer o ser amado feliz. Quando cada um no relacionamento passa a agir em prol de si mesmo é sinal de que as coisas não estão indo lá muito bem. Conviver significa viver junto. Dividir e repartir alegrias e tristezas. Esperanças e desilusões. Quando isso não mais existe, é hora de pensar se a convivência não se tornou apenas um motivo de desprazer, do qual ninguém tem a coragem de abrir mão. Um meio para ser infeliz, uma desculpa para não seguir adiante.
Nunca é demais lembrar que ninguém muda ninguém e que ninguém é de ninguém. Não adianta desperdiçar energia com empreitadas dessa natureza. Quanto mais se quer mudar ou apoderar-se do outro, mais ele se sentirá ameaçado e inseguro. E o resultado será justamente firmar ainda mais o comportamento indesejado pelo outro. O amor verdadeiro não é condicional. Ama-se como se é, e pronto. Já o ciúme excessivo deve ser tratado como um desvio psicológico, porque quase sempre é um desejo disfarçado. O ciumento está a todo momento lembrando ao outro da possibilidade da traição, fazendo uma obsessiva propaganda às avessas. Das duas, uma: ou deseja ser traído ou deseja trair. Relacionamentos muito instáveis, onde a convivência abala negativamente as estruturas do ser, quase sempre não têm mais razão de existirem.
Agora, há que se estar atento à vil monotonia disfarçada de doce estabilidade, porque ela pode ser o início do fim ou, até mesmo, o túmulo do amor.
Djalma Filho é advogado
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