O art. 220 da Constituição Federal declara: “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”. O § 2.º do mencionado dispositivo enfatiza: “É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística”.
Também a Lei de Imprensa (Lei n.º 5.250/67), embora editada em um tempo de restrição e supressão de liberdades públicas, direitos e garantias individuais, resguarda essa liberdade em seu primeiro artigo, ao proibir a censura prévia e estabelecer a censura posterior com a advertência de que cada um responderá, nos termos da lei, pelos abusos que cometer.
O princípio, por não ser absoluto, tem limites postos pela própria Carta Política, ao proteger determinados direitos da personalidade (intimidade, vida privada, honra e imagem), cuja violação acarreta a obrigação de indenizar o dano material ou moral (art. 5.º, X).
Um dos assuntos recorrentes no foro cível são os pedidos de indenização apresentados por pessoas físicas que alegam dano moral à imagem e/ou outros direitos da personalidade, como a honra e a intimidade da vida privada, em face da notícia de prisão efetuada pela Polícia ou determinada pelo Judiciário.
Nesses casos, a necessidade e a veracidade da matéria sobre fatos de interesse público caracterizam a legitimidade e a ética dos veículos de comunicação social. No exercício da liberdade de informação é elementar que o jornalista observe a autenticidade da ocorrência a ser divulgada. Essa cautela atende o binômio direito-dever de informar, quanto à imprensa, e os direitos de ser informado e de se informar, relativos aos cidadãos. Sob outro aspecto, procura resguardar os direitos da pessoa indicada como autora do fato. O profissional da comunicação social (rádio, TV, jornal, revista) deve observar, rigorosamente: a) a credibilidade pública da fonte (Autoridade Policial, Juiz, membro do Ministério Público etc.); b) a fidelidade da ocorrência, embora a versão inicial possa sofrer alteração com a investigação posterior.
Perante Juízes e Tribunais, discute-se com muita freqüência a legalidade ou não de notícia da imprensa relativa a fatos delituosos, especialmente quando há prisão de seus autores. O debate traz à tona o conflito aberto entre os direitos da personalidade (intimidade, vida privada, honra e imagem) e as liberdades de informação e manifestação. Ambos são constitucionalmente tutelados (art. 5, IV, IX e X). Mas é a própria Lei Fundamental que estimula o conflito, como se verifica pela regra do § 1.º do art. 220: “Nenhuma lei conterá qualquer dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5.º, IV, V, X, XIII e XIV”. Dois dos incisos referidos tratam, precisamente, dos direitos individuais acima referidos. Qual o critério a ser adotado para resolver o confronto entre os interesses público e privado?
O antigo e sempre renovado confronto entre a liberdade de informação e os direitos da personalidade deve ser tratado pela jurisprudência através de um processo de balanceamento de bens. Em outras palavras: o antagonismo deve ser resolvido em favor do interesse público visado pela informação.
Quando a notícia tratar da prisão de um indivíduo, deve o jornalista ter a cautela de conferir se a informação está de acordo com o registro oficial, como boletim de ocorrência ou peças de inquérito policial. Mas o jornalista não é obrigado a apurar a veracidade do registro oficial.
O dever ético de investigação exigido dos veículos de comunicação não implica assumir a responsabilidade social pela busca da verdade real. A esse respeito, pondera o professor Luís Roberto Barroso: “De fato, no mundo atual, no qual se exige que a informação circule cada ve,z mais rapidamente, seria impossível pretender que apenas verdades incontestáveis fossem divulgadas pela mídia. Em muitos casos, isso seria o mesmo que inviabilizar a liberdade de informação, sobretudo a informação jornalística, marcada por juízos de verossimilhança e probabilidade”(1). Também a favor da liberdade de divulgação da matéria em tal circunstância é o precedente do Superior Tribunal de Justiça, relatado pela sensível Ministra Nancy Andrighi, acentuando que “a simples reprodução, por empresa jornalística, de informações constantes na denúncia feita pelo Ministério Público, ou no boletim policial de ocorrência, consiste em exercício do direito de informar”(2).
Notas:
(1) “Liberdade de expressão versus direitos da personalidade. Colisão de direitos fundamentais e critérios de ponderação”, em Temas de direito constitucional, Rio de Janeiro, Renovar, 2005, t. III, p. 110).
(2) REsp. 613374 (MG), julg. 17/5/2005.
Patrícia Nymberg e Leandro Saboia são advogados.
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