Que saudade da cidade que recebia Paul McCartney de braços abertos. Que convidava David Bowie, Ian Anderson, os remanescentes do Creedence Clearwater Revival, Ramones, AC/DC, Bon Jovi, Iron Maiden, No Doubt e até os três tenores… e, os que tiveram a oportunidade, todos eles saíam boquiabertos com a beleza da Pedreira Paulo Leminski, prometendo voltar na primeira oportunidade.
Mesmo aqueles entre eles que estiveram no Guaíra, no Couto Pereira, na extinta Forum, voltavam aos seus países bastante satisfeitos, e satisfeitos deixavam dezenas de milhares de fãs. A cidade fervia, acolhia caravanas de outras cidades, estados e até dos países vizinhos. O comércio se agitava, criavam-se empregos temporários, hotéis, pousadas, restaurantes, lanchonetes, barraquinhas de cachorro-quente, todos ganhavam.
Pois essa cidade pertence a um passado cada vez mais remoto. Agora, enquanto São Paulo assiste a Coldplay e Deep Purple, Brasília promove um megafestival com Alanis Morrissette, Simply Red e Live, e o Rio se prepara para receber feras do rock (White Stripes, K.D.Lang), hip-hop (Public Enemy), da electronica (Erol Alkan, Peaches) e do jazz (Shirley Horn, Illinois Jacquet), Curitiba fecha a porta na cara do mesmo Deep Purple, do nosso Sepultura e dos novatos suecos do Hellacopters e cava assim um fosso intransponível entre a “capital cultural” e o circuito internacional de música.
OK, parece que Misfits e Marky Ramone ainda vêm hoje ao Via Rebouças. Mas os megashows, os grandes concertos de rock, o sonho de um dia ver Rolling Stones, Rush, Pink Floyd, tudo isso está muito distante. E até os festivais nacionais ficaram comprometidos: o Skol Hip Rock, que em outubro traria Marcelo D2, Nação Zumbi, Los Hermanos e Xis, entre outros, já não vem mais. Manoel Poladian, papa dos grandes mundiais no País, disse que vai riscar Curitiba do mapa, e prometeu “avisar” os colegas.
Ora, direis, o demoníaco show de rock foi cancelado por um laudo do Corpo de Bombeiros. O Expotrade não tinha saídas de emergência suficientes para a expectativa de público da organização, 20 mil pessoas. Correto. Nenhum juiz no mundo assumiria a responsabilidade de se opor à opinião da corporação encarregada da segurança, principalmente depois do trágico antecedente do Jockey.
Os problemas são outros: a falta de profissionalismo, com medidas de última hora, sendo que o show já estava sendo anunciado há pelo menos três meses; a má-vontade do Corpo de Bombeiros em definir as modificações necessárias para a liberação da Pedreira Paulo Leminski, conforme relatou o presidente da Fundação Cultural de Curitiba, Cassio Chamecki, e o preconceito atávico das autoridades contra shows de rock. Porque, como bem lembrou o empresário Helinho Pimentel, 50, 60 mil pessoas num jogo de futebol, divididas entre dois times rivais, pode. Mesmo que as saídas sejam insuficientes e de acesso problemático. Mas 20 mil pessoas num show de rock, torcendo todas para o mesmo time, não. Não é isolando Curitiba dos grandes eventos que novas tragédias serão evitadas. É com seriedade, responsabilidade e profissionalismo.
Luigi Poniwass
(luigi@oestadodoparana.com.br) é editor do Almanaque em O Estado.