José Ricardo Alvarez Vianna

A Legitimidade Democrática do Poder Judiciário

O Poder Judiciário tem exercido seu papel institucional. Prova disso são os brados de “ativismo judicial!”, “politização da justiça!”, “juízes legisladores!” e, a que resume as anteriores, “falta de legitimidade democrática do Judiciário!”
Com efeito, o Judiciário não está acima das Leis e da Constituição. Sua estrutura, competência e limites de atuação estão pautados nestes instrumentos, votados e ratificados pelos “eleitos pelo povo”. Logo, a representação democrática do Judiciário é indireta. E nem poderia ser diferente, a atuação do juiz, aqui entendido em sua acepção ampla, é de ordem técnica, pressupondo bacharelado em Direito, atividade jurídica prévia, e, em regra, aprovação em concurso público, o qual prima pelo mérito do aprovado.

Pensar outro modelo é quase um contrassenso. Imagine, no Brasil, um aspirante a juiz realizar campanha eleitoral. Quais seriam suas promessas de campanha? E com quem? Como ficaria a imparcialidade do juiz e a segurança das partes?

Mesmo nos Estados Unidos não é esse o sistema que prevalece. Nesse sentido, confira-se o artigo de Vicente de Paula Ataíde Júnior, “A eleição de juízes nos Estados Unidos da América”, publicado no Jornal O Estado do Paraná, caderno “Direito e Justiça”, em 18/9/2005, ora disponível no site “www.parana-online.com.br”.

A propósito, a par de “eleições diretas”, democracia também se exerce garantindo e assegurando direitos, sobretudo os de caráter fundamental, conquistados a duras penas em Séculos de civilização. Exerce-a preservando o Estado Democrático de Direito, dando vida à “folha de papel” para utilizar expressão de Lassale , conhecida como Constituição.
Além disso, a máxima “one man, one vote” está longe de concretizar a democracia em si, sobretudo se os demais instrumentos democráticos, previstos na Constituição plebiscito, referendo e iniciativa popular raramente forem lembrados, impedindo que a sociedade participe, de fato, de assuntos do governo e de interesse social.

E mais: conforme anota José Renato Salatiel, ao discorrer sobre a Escola de Frankfurt, no site da “uol”, ideologias são formatadas pelos meios de comunicação em massa, de maneira sutil, junto a cidadãos passivos, “em que diversão e assuntos importantes são “mixados’ num só produto; em que representantes políticos são escolhidos como se fossem sabonetes”.

Não bastasse isso, o Judiciário não escolhe demandas. Ao contrário, recebe-as e, por força do princípio da indeclinabilidade da jurisdição (CPC, art. 126), após o devido processo legal, deve decidi-las. Decisões, por sua vez, não são “opiniões” de “um juiz”. Além de escritas e fundamentadas em bases jurídicas são passíveis de recursos, podendo chegar até ao Supremo Tribunal Federal. Portanto, segundo Maria Francisca Carneiro, na obra “Direito, Estética e a Arte de Julgar”, o Judiciário é “”unitas-multiplex’ (conseguindo assim ser o paradoxo do um e do múltiplo ao mesmo tempo)”.

Ainda neste contexto, se o Judiciário tem sido chamado a decidir sobre fornecimento de medicamentos, garantia de vagas em hospitais e em escolas públicas, infidelidade partidária, bioética, improbidade administrativa, cláusulas contratuais reputadas abusivas é porque direitos e deveres provavelmente não estejam sendo respeitados e/ou cumpridos por quem deveria. Decisões sobre tais matérias, não “usurpam a democracia”. Ao contrário, garante-a!
Em suma, críticas de ativismo, de juízes legisladores, de antidemocrático, além de não encontrarem respaldo fático-jurídico, somente demonstram que o Judiciário, apesar das dificuldades em conferir efetividade em suas decisões, tem cumprido seu papel institucional: garantidor dos direitos fundamentais e do Estado Democrático de Direito.

José Ricardo Alvarez Vianna é professor da Escola da Magistratura do Paraná, juiz de Direito.

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna
Voltar ao topo