A justiça inconsciente

No recente estudo realizado pelo biólogo evolucionário Marc Hauser, da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, afirma-se que o cérebro possui um mecanismo geneticamente determinado para adquirir regras morais. Mais: há mais de setecentos anos, o filósofo religioso Tomás de Aquino concluiu que a ordem moral não depende da vontade arbitrária de Deus, a justiça é algo essencial e parte da natureza humana, inseparável.

Parece-nos, a princípio, que a justiça encontra-se presente no ser humano, ainda que disforme, infantilizada. Mesmo sob a condição vil tão fartamente percebida nas sociedades, encerra-se no homem, justamente, a solução para superar tal obstáculo e evoluir ética e moralmente.

Mas, por que se vive cercado de injustiça? É possível alegar que o homem não se encontra tão desenvolvido quanto se crê. Orgulho e vaidade obscurecem a visão dos fatos e entorpecem a auto-avaliação necessária. Embora se tenha avançado no campo do saber, a ética caminha lenta e preguiçosamente.

É preciso avaliar quão preparado se está para enfrentar o peso da justiça consciente ante a responsabilidade sobre cada efeito daquilo que se causou. Nós erramos abundantemente, em boa parte, em razão do essencial processo de aprendizagem. Será possível suportar com a devida clareza a verdade que se expõe através das injustiças que cometemos freqüentemente? Mal aceitamos o graveto, que dirá o feixe todo? Psicopatologias reinariam  em restrição.

Tudo a seu tempo. O que não se questiona, contudo, é se a justiça pessoal (ou autojustiça), ainda que inconsciente, não se desencadeia enquanto não atinge certo grau de consciência. Todavia, é de se supor que, tal como a criancinha que ainda não anda corretamente, mas consegue se movimentar sobremaneira, assim também deve ocorrer com cada recurso em nós disponível.

Poder-se-ia seguir citando vários pensadores que se dedicaram ao estudo da justiça, porém, outros dois serão suficientes para o arremate da reflexão. Michel de Montaigne, do século dezesseis, escreveu: ?O mal recai em quem o faz?, e, há dois mil e setecentos anos, Hesíodo se pronunciou sabiamente: ?A si mesmo o homem faz mal, a um outro o mal fazendo: para quem a intenta a má intenção malíssima é?.

A consciência sobre a justiça permite a transição do estado concreto e infantil à condição abstrata e madura.

Armando Correa de Siqueira Neto é psicólogo, consultor, professor e mestre em liderança.

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