Não temos procuração para a defesa das empresas que exploram os equipamentos eletrônicos que multam os condutores de veículos em Curitiba. Nem as planilhas de cálculo para aquilatar se as multas que infringem são ou não altas demais. Menos ainda, conhecimentos sobre custos, expectativas justas de lucros e o que mais entre no passivo e os motoristas multados têm de cobrir. Assim, se nos é dito que uma dessas empresas faturou tantos milhões de reais, o número parece grande demais, insinuando existir uma indústria das multas.

A chamada indústria das multas, com empresas particulares, com poderes delegados pelo município, flagrando motoristas dirigindo em velocidade acima da permitida, foi objeto dos debates, principalmente no segundo turno das eleições para prefeito de Curitiba. Um e outro dos candidatos eram contra. E ambos não eram capazes de demonstrar a provável existência dessa indústria. Um era mais radical, desejando acabar com os chamados “pardais”, as máquinas que flagram os motoristas e multam. Outro era a favor da revisão do assunto, talvez com uma diminuição nos valores cobrados e proibição de os “pardais” ficarem escondidos. Nada de máquinas escondidas fotografando os automóveis, suas placas e até motoristas, para depois impingir-lhes multas que o novo Código de Trânsito Brasileiro já não consigna em valores baixos.

Passadas as eleições, cremos que é hora de repensar esse assunto. Ele foi discutido na campanha com sofismas.

Em primeiro lugar, é de se aquilatar da conveniência da delegação de poderes para empresas particulares multarem. E destas, para equipamentos eletrônicos. Não há dúvida que esse processo é mais prático do que imaginar que teremos milhares de guardas de trânsito, dia e noite, cobrindo toda a cidade. Quanto às máquinas ficarem escondidas, houve concordância dos dois candidatos. Ambos, o vitorioso e o perdedor, entendem que os “pardais” devem ficar visíveis, como um aviso para que o mau motorista não infrinja a lei. Que diminua a velocidade quando se aproxima, mesmo que em seguida torne a correr em desabalada carreira e talvez atropele alguém um pouco adiante, bata num poste ou num outro veículo, causando ferimentos e mortes.

Não conseguimos entender por que avisar o mau motorista. Por que protegê-lo das multas. Quem tem de ser protegido é o bom motorista e o pedestre. Os candidatos, mesmo o que ganhou, Beto Richa, esqueceram-se de um fato que, se levantado, poderia ser mais convincente do que essa discussão sem bases fundadas e que cheira a demagogia.

Se os multados têm automóveis e correm acima da velocidade permitida, por isso sendo multados através de flagrantes dados pelos “pardais”, o povão anda a pé, de bicicleta ou de ônibus e nessa luta do trânsito é a vítima. Pouco lhe importa se os maus motoristas são multados e os “pardais” se escondem. Talvez até torça para isso. E esse grupo, o das vítimas do trânsito, muitas das quais morrem porque há quem não tenha medo da chamada indústria das multas, é muito maior do que aquele dos que têm seus possantes veículos e andam em carreira pela cidade.

Assim, se um dos candidatos tivesse encarado o assunto do ponto de vista dos pedestres, contra os infratores das regras de trânsito, poderia conquistar mais votos do que os que bajularam os motorizados infratores. Mas nenhum deles pensou nisso, criando-se uma discussão estribada em sofismas que deu votos e tirou votos de ambos os candidatos, igualmente desconhecedores do âmago da questão.

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