A garantia democrática como meta da ação sindical unitária

O Estado Democrático de Direito está fundamentado constitucionalmente como base e destino de nossa República. Os cinco valores e o princípio de sustentação fixados na regra primeira da Carta Magna sintetizam harmonicamente esta fundamentação.

Soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político demarcam não apenas a regra de conduta individual e coletiva, mas a essência do ser nacional.

E o pressuposto de que todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos constitucionais, complementa cristalinamente a afirmação democrática.

A efetivação, entretanto, dessa norma para o avanço social e político, necessita de instrumentos eficazes. E, justamente, essa instrumentalização é um dos pontos-chave do debate político dos dias atuais.

Desde a ação parlamentar à eficácia administrativa, com o suporte do Judiciário, até a mais elementar organização social nascida da necessidade primeira de sobrevivência dos despossuídos, explorados e excluídos, combinam-se elementos vitais que suportam a ação coletiva da nacionalidade.

A organização sindical dos trabalhadores

Não é, portanto, sem sentido reafirmar que um dos pontos centrais para essa efetivação democrática repousa na organização sindical dos trabalhadores.

Inserida como direito social-fundamental nos artigos 8.º a 11 e 37 da Constituição Federal de 1988, a liberdade associativa profissional ou sindical é a primeira desses sustentáculos de garantia do Estado Democrático de Direito. São normas-princípíos que estão indissoluvelmente ligadas com as garantias individuais e coletivas dos trabalhadores definidas no artigo 7.º, formando um conjunto de conquistas históricas da classe trabalhadora não apenas no Brasil, mas em todo o mundo.

Em decorrência dessa construção jurídico-política, há uma interação. Ao mesmo tempo em que a sociedade outorga aos trabalhadores e suas organizações, direitos básicos de existência e expressão democrática, espera dos mesmos a presença diante de complexas questões da vida nacional e social.

Ou seja, se possível a instrumentalização para a ação em benefício de segmento fundamental para a Nação – os trabalhadores, como categoria-classe – em contrapartida, há necessidade do retorno quanto aos resultados dessa ação na garantia democrática.

Essa responsabilidade é ainda maior na medida em que o texto constitucional, calcado nas normas internacionais, assegura a livre ação da organização sindical dos trabalhadores, liberta da interferência e intervenção do Poder Público.

Significa dizer que, sem as correntes do controle oficial, a organização sindical pode abrir caminhos rumo não apenas à sua consolidação, face a seus direitos e interesses, como à participação na construção do conjunto social.

E essa participação se projeta desde o plano de ação na melhoria das condições de vida e de trabalho, inerente a seu objetivo central, até na presença constante em ações que visam o combate à pobreza, à miserabilidade, à exclusão social e ao profundo desnível entre os que têm e os que nada ou pouco têm, passando pela inserção fundamental na órbita da educação, formação profissional, saúde e defesa do meio-ambiente. É o que se espera do sindicato na linha construtiva da cidadania e da efetividade democrática.

O papel do Estado: assegurar a plena ação sindical

Cabe ao Estado, por final, entender que deve assegurar a plena ação sindical segundo os objetivos constitucionais gerais e específicos, assim como deve facilitar a concretização dessa ação através de meios eficazes no plano institucional e material, quer integrando essas organizações em suas proposições, como dando-lhes meios para a consecução de suas propostas sociais mais amplas.

O sentido destas observações decorre da análise crítica que temos acentuado quanto ao encaminhamento da reforma da organização sindical, ora em vias de iniciar o debate no plano parlamentar.

A crítica nasce quanto a incompreensão dos que pretendem desconstruir e desconstituir o arcabouço básico e quase centenário dessa organização, agora plantado em nossa Constituição como um dos resultados do grande pacto nacional da redemocratização de 1988.

Ao invés de caminhar-se para a efetivação dos meios que possibilitem a ação sindical, nos termos e nos parâmetros atuais da Constituição, há os que pretendem realinhavar o processo estrutural-organizacional das entidades sindicais dos trabalhadores, sob a argumentação de que é necessária a sua alteração para revitalizar esse instrumento.

O erro dessa avaliação poderá levar a que, ao invés de consolidar os elementos de reforço e unidade para a ação sindical-social em um grave momento da vida nacional, se caminhará para o confronto e a polarização de posições antagônicas que só interessam aos que continuam explorando e oprimindo nosso povo.

Por certo que ainda há tempo para ser corrigido o rumo, se a sensatez de pessoas no comando das decisões melhor considerar o quadro das contradições existentes.

Um grande desserviço à Nação

Deslocar-se para a análise do Congresso Nacional o debate e a solução dos problemas que atingem a organização sindical dos trabalhadores, sem um claro e unitário vetor da reforma pretendida, é prestar um grande desserviço à Nação, além de ocasionar fissuras ou rupturas de graves conseqüências para o país.

É de amplo conhecimento público que o Fórum Nacional do Trabalho, formulado na proposta de governo do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva, deveria ser um amplo espaço de debate e convergência de todos os segmentos direta ou indiretamente relacionados com a questão das relações do trabalho no País.

O que se verificou, entretanto, foi a marginalização e exclusão de setores vitais para esse debate. Por isso, o resultado consubstanciado em propostas a serem encaminhadas ao Congresso Nacional sobre reforma constitucional e legislação complementar sobre matéria sindical, não espelha um consenso amplo, efetivo, concreto, mas apenas um acerto parcial dos que têm interesse naquelas propostas.

Recebendo, desde já, a aberta oposição de inúmeros setores de representação dos trabalhadores e de parlamentares que subscreveram proposição parlamentar antagônica às pretensões dos que se encontram na linha da desconstrução e desconstituição do sistema constitucional da unicidade sindical, a proposta pelo pluralismo e a quebra do atual sistema em vias de remessa ao Legislativo, detonará uma crise de desfecho imprevisível no campo das relações sindicais, trabalhistas, sociais e políticas.

De nossa parte, dentro de nossas responsabilidades profissionais, sociais, partidárias e políticas temos acentuado que a efetivação de um sólido contrato social exige a participação unitária da organização sindical dos trabalhadores.

O conviver com as diferenças é parte essencial da Democracia e o trabalhar com objetivos comuns dentro dessas diferenças é o desafio que se impõe aos que pretendem a transformação social rumo a uma sociedade fraterna e igualitária, em especial dos que governam o nosso País.

Sem a incessante procura para a efetividade da participação unitária e com respeito às diferenças naturais existentes em nossa sociedade, segundo a norma constitucional do pluralismo político-ideológico-cultural-religioso e demais valores expressos no primeiro ponto de nossa Carta Magna, a garantia democrática estará, lamentavelmente, comprometida e fragilizada.

E.mail: edesiopassos@terra.com.br

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