A força moral do Judiciário

Vivemos um momento particularmente preocupante na vida pública brasileira. A preocupação não é apenas com os escândalos que se apresentam quase todas as semanas ou com a descoberta de que figuras públicas, de quem se esperava um comportamento idôneo, estão envolvidas em graves desvios de conduta. Tudo isso nos causa indignação, revolta e constrangimento, mas, uma vez denunciados e devidamente processados e punidos, não nos deve mais causar preocupação.

O que nos preocupa de fato é a abordagem dada à instituição Poder Judiciário e como a população de modo geral tem absorvido essas informações. Não estamos nos referindo aos juízes, desembargadores e ministros denunciados, mas sim às irrefletidas referências a um Poder que é um dos esteios no qual se assenta o Estado democrático de Direito.

Ouviu-se todo o tempo que ?a polícia prende e a Justiça solta?. Trata-se de mais um daqueles equívocos que, repetidos à exaustão, se transformam em suposta verdade para quem, desconhecendo os meandros do Judiciário, quer acreditar que nada mais se salva nesse país, nem mesmo a Justiça. Nada mais falso. Se há prisões, é porque antes houve uma ordem judicial que a determinou. Se há determinação de que sejam soltos, é porque, diante do que diz a lei, não há mais motivo para que se mantenha a privação da liberdade.

É preciso lembrar que as prisões determinadas são temporárias e têm a finalidade apenas de assegurar o curso das investigações. Não há ainda condenação final que determine o encarceramento definitivo.

Até mesmo autoridades públicas, que devem conhecer os adequados procedimentos judiciais – note-se que estamos nos referindo a procedimentos básicos -, criticam decisões ainda que com base em supostos dados, sabidamente incorretos.

Nunca é demais lembrar que em passado não tão distante assim, de insegurança institucional generalizada e desrespeito à liberdade pessoal e de imprensa, sob um aparato estatal e político repressor, coube ao Poder Judiciário o resguardo da cidadania e da democracia.

Os juízes do trabalho, sempre comprometidos com a construção de um Judiciário forte e respeitado, não se furtaram de denunciar e protagonizar as lutas para o fim do nepotismo e para a fixação de um teto salarial moralizador no setor público.

Porém não podem concordar com a sanha quase irresponsável utilizada nas referências ao Judiciário brasileiro.

Em um país de sérios percalços institucionais, a sociedade precisa conhecer de maneira ampla e democrática os procedimentos judiciais para poder avaliar corretamente a Justiça e sua contribuição para o fortalecimento de uma sociedade mais justa, distributiva e, sobretudo, solidária.

A atuação firme e prudente do Poder Judiciário brasileiro não pode ser desqualificada de maneira irresponsável sob o pretexto de coibir excessos cometidos por alguns de seus integrantes, nem isso pode servir de justificativa para embaraçar o exercício das funções da magistratura. Ela mesma, ao mesmo tempo em que defende suas prerrogativas essenciais, por imprescindíveis à prestação jurisdicional e à cidadania, se empenha na consolidação do Judiciário, buscando o aperfeiçoamento das instituições.

Absolutamente consciente do seu papel no fortalecimento da democracia, a magistratura do trabalho permanecerá na defesa de um Judiciário verdadeiramente acessível, não verticalizado, transparente e ético, dotado de mecanismos ágeis e eficientes, capazes de democratizar o acesso à Justiça e garantir a integridade da prestação jurisdicional. Mas também zelará para que seja ele respeitado e reconhecido por suas qualidades, lembrando que são milhares de juízes em todo o país, mas muito poucos aqueles que denigrem a instituição.

Por isso mesmo, não pode aceitar que se confunda controle social com a desqualificação de um dos Poderes republicanos, cujo princípio fundamental é a garantia do Estado democrático de Direito.

A capacitação técnica e a força moral do Poder Judiciário são o seu maior patrimônio, e somente por meio delas pode impor suas decisões. Dessa forma, os ataques que sofre, como instituição, fragilizam a sua atuação, a figura do juiz e, conseqüentemente, a própria democracia.

Cláudio José Montesso é juiz titular da 58.ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro e professor licenciado de Direito Processual Civil da Universidade Católica de Petrópolis (RJ), e presidente da Anamatra.

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna
Voltar ao topo