Não existe indústria sem matéria prima!
Pode-se afirmar que a Constituição Federal estabeleceu o conceito para a indenização do dano moral:
Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
O doutrinador Clayton Reis (Dano moral, 4.ª ed. Ed. Forense, p. 85)” enquadra com precisão o entendimento doutrinário sobre o dever de indenizar:
“Assim, toda e qualquer lesão que transforma e desassossega a própria ordem social ou individual, quebrando a harmonia e a tranqüilidade que deve reinar entre os homens, acarreta o dever de indenizar (…). O Dever de reparar os danos morais é hoje um dever iniludível de nossa doutrina e se consagra em nossa jurisprudência de forma marcante e progressiva
Comumente, encontra-se nas contestações das ações de indenização por danos morais o seguinte argumento: o Poder Judiciário não pode ser conivente com a famigerada indústria do Dano Moral, em razão de meros dissabores ou aborrecimentos.
Para entender tal afirmação é necessário buscar uma resposta para a seguinte pergunta: “O que vem a ser essa famigerada indústria do dano moral?”
Para tanto, busca-se auxílio no Dicionário Aurélio Século XXI que determina como famigerada: Que tem fama; muito notável; (…); indústria: Atividade de produção de mercadorias, especialmente de forma mecanizada e em grande escala, abrangendo a extração de produtos naturais (indústria extrativa) e sua transformação (indústria de transformação).
E, para o termo Dano Moral, a conceituação dada por Wilson Melo da Silva (O dano moral e sua reparação. 2.ª ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 1969. p. 13), os danos morais são as “[…] lesões sofridas pelo sujeito físico ou pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, entendendo-se por patrimônio ideal, em contraposição ao patrimônio material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico.”
Pela forma que aquela frase (a famigerada indústria do dano moral) é empregada, passa-se a ideia de que o indivíduo que promove uma ação de indenização pelos danos morais sofridos estivesse litigando de má-fé, pois este estaria buscando uma indenização para meros dissabores ou aborrecimentos.
O dano moral ocorre, por exemplo, quando a honra do indivíduo é atingida a ponto de denegrir sua fama, reputação, a sua posição na sociedade. Vários são os casos: o banco que por uma questão de normas administrativas não confere a assinatura do emitente e, mesmo assim, devolve o cheque alegando falta de fundos; a empresa que inscreve o nome de seu cliente no SERASA, indevidamente, alegando inadimplemento; a empresa que não comunica ao cliente previamente que seu nome será inscrito nos bancos de restrição de crédito, possibilitando que o mesmo cumpra com seu dever.
Percebe-se que várias são as formas que o indivíduo pode ser atingindo em sua honra. Importante destacar que, na maioria dos casos, o seu nome – bom nome – é seu único patrimônio (para os menos abastados).
Pode-se citar, como exemplo, o caso da empresa que realiza a inscrição indevida do nome de um cliente nos bancos de restrição ao crédito. Pode até ser mero dissabor para quem realiza a inscrição, todavia, para quem tem o nome inscrito nesses órgãos, é humilhante e constrangedor.
É salutar entender, conforme determina o conceito apresentado acima pelo Dicionário Aurélio – Século XXI, para que uma indústria exista, é necessário a existência de matéria prima. Dessa forma, a famigerada indústria do dano moral só existe porque existe a matéria prima, ou seja, uma lesão ao patrimônio imaterial do indivíduo.
Portanto, a matéria prima da famigerada indústria do dano moral é a afronta aos direitos da personalidade (a vida, a integridade física e psíquica, ao nome, a honra, a dignidade, etc).
Carlos Alexandre Moraes é doutor em Ciências da Educação, mestre em Ciências Jurídicas, especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil, especialista em docência no Ensino Superior, especialista em Direito Agro-financeiro, autor do livro: Responsabilidade Civil das Empresas Tabagistas. Editora Juruá, 2009, professor do Curso de Direito do Cesumar, advogado.