Cento e quinze milhões de brasileiros têm hoje encontro marcado com as urnas. É a primeira eleição presidencial em que, em vez de fazer sinais em cédulas de papel, o eleitor deverá digitar números e apertar seguidas vezes a tecla de confirmação ? confirmação do sistema eletrônico em uso e confirmação da vontade de mudança que permeou todos os motes da presente campanha eleitoral.

Pessoas não familiarizadas com teclados e computadores terão um problema a mais que a simples escolha dos seis candidatos que cada um deverá fazer ? deputado federal, deputado estadual, senador um e senador dois, governador e presidente da República ? num total de 25 toques que podem mudar os rumos da história do País. A estimativa é que, em função da novidade, pelo menos vinte e cinco milhões de eleitores se omitam do processo que traz ao Brasil dezenas de observadores de outras nações com a tarefa de colher subsídios capazes de influenciar no processo da inevitável mudança. Tantas omissões, se confirmadas, terão peso de uma catástrofe.

Mas votar apertando teclas ou fazendo sinais sobre papel, como ainda acontece no resto do mundo, é sempre um ato de cidadania responsável. Esse direito-dever, provavelmente pela última vez de caráter obrigatório no Brasil, não pode ser exercido com os olhos apenas no passado ou nas conveniências do presente; deve ser cumprido com a fé dos que acreditam na construção de uma nação soberana, sim, mas, antes de outros predicados, verdadeiramente digna de seus filhos.

No processo de debates para a renovação do parlamento e na escolha dos novos chefes de governo da União e dos estados, infelizmente tivemos mais jogo de cena que fundada análise sobre propostas de como administrar a coisa pública. Acusações, calúnias até, não faltaram nos horários reservados pela Justiça Eleitoral em emissoras de rádio e televisão. Esse baixo nível certamente em nada ajudará a decisão do eleitor, que hoje, tomada só, precisa ser serena e pensada.

Com certeza também não haverá de contribuir para engrandecer o governo do eventual vencedor, que precisa, mais que cantar vitória, assumir o cargo e o encargo de suas próprias promessas, e reconquistar todos os dias a confiança do povo e a legitimidade de seus atos, conforme nos lembrou recentemente o presidente Fernando Henrique Cardoso. Depois de contados os votos, coisa que será reduzida a questão de poucas horas, a avalanche de apoios e preferências se dissolve como neve ao sol. Fica a lição para a próxima eleição ou para o segundo tempo dos embates, onde existir o segundo turno.

O clima de euforia ou festa que naturalmente produz uma eleição não pode, sob nenhum pretexto, empanar a visão realista segundo a qual não haverá milagres. Ganhe quem ganhar, o Brasil é esse que temos. Os problemas são tantos e maiores que aqueles colocados sobre a mesa das discussões nem sempre honestas a que presenciamos. E as soluções igualmente nem sempre serão tão fáceis quanto as arquitetadas nesse atabalhoado processo de atração da simpatia dos eleitores que, pelo menos hoje, detêm poder de decidir.

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