A discussão a respeito da Lei dos Crimes Hediondos

Em julho de 1994, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, órgão do Ministério da Justiça, previsto na Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210 de 11 de julho de 1984), o qual presentemente integro, através da edição das Diretrizes de Política Criminal e Penitenciária, que por Lei Federal lhe incumbe propor, em seu artigo 1º enfatizava a necessidade de se efetivar a reforma do Código Penal, do Código de Processo Penal e da Lei de Execução Penal como pressuposto básico para o aperfeiçoamento e dinamização da Justiça Criminal. Além de outras orientações contidas no documento, este se revelou importante para os estudos que vieram a se desenvolver, propiciando, hoje, reflexão acerca dos graves problemas criminais que assolam o País.

Em 19 de julho de 1999, através da Resolução de n.º 5, Novas Diretrizes foram editadas, não só reforçando as anteriores, mas, no ângulo que aqui nos interessa, alertavam para a ineficácia de regramentos normativos que visem alargar a tipificação penal e oferecer maior rigor no tratamento de certos crimes, especialmente quando venham a contrariar o regime progressivo de cumprimento de pena, cientificamente voltado para a reintegração social do condenado. É exatamente o que hoje se faz com as questões relacionadas à legislação dos Crimes Hediondos e assemelhados. As propostas efetivadas pelo Exmo. Sr. Ministro da Justiça, em Reunião da qual participei no último dia 9, em Brasília, como integrante do Conselho de início referido não foi um apregoamento puro e simples da revogação da Lei, mas sim, uma reflexão séria, honesta, científica, sem paixões, mas com racionalidade.

Não bastassem os documentos referidos, no desideratum constante de aperfeiçoar os instrumentos jurídicos, ao findar o ano de 2003, o mesmo Conselho editava através da Resolução nº 16, de 17 de dezembro de 2003, outras Diretrizes e em seus considerandos destaca que as estratégias de prevenção e de combate à criminalidade englobam políticas públicas de caráter social bem como a atuação do sistema de justiça criminal… e que essa coerência advém da vinculação de tais princípios aos fundamentos do Estado Democrático de Direito, nomeadamente a dignidade da pessoa humana vista na sua individualidade e na sua dinâmica inserção social. Mais precisamente, na parte que aqui interessa, em seu art. 3.º, no que concerne às Diretrizes referentes à elaboração legislativa alude quanto à manutenção do regime progressivo de cumprimento de penas, independentemente da natureza do crime praticado, não esquecendo a proteção e amparo às vítimas e testemunhas de crimes.

Vê-se, pois, que a discussão hoje instalada vem sendo acompanhada pelo órgão incumbido das Diretrizes de Política Criminal e Penitenciária, desde a edição do primeiro documento (1995), sem esquecer que esta foi precedida de longos estudos, mesmo porque o Conselho em questão existe desde 1980, antecedendo a própria Lei de Execução Penal.

Se a Lei dos Crimes Hediondos de 1990 e as que posteriormente vieram a ser editadas refrearam a criminalidade ou a fomentaram; se a questão prisional relacionada àqueles que foram recolhidos aos cárceres pela prática dos crimes assim etiquetados melhorou ou piorou, enfim, questionamentos vários que se fazem pela proposta lançada, são respostas que à Sociedade interessa, e os veículos de comunicação e segmentos comunitários os mais diversos são instados, agora, a se manifestar, sob pena de, pelo silêncio, serem coniventes com as transformações.

Urge, pois, o debate, mas debate sério, racional, sem paixões.

É o que se espera seja feito.

Maurício Kuehne

é professor de Direito Penal e de Execução Penal da Faculdade de Direito de Curitiba; presidente do Conselho Penitenciário do Estado do Paraná e 2.º vice-presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, órgão do Ministério da Justiça.

 

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