Agora livre de reprimendas por manifestar abertamente sua opinião, o vice-presidente da República, empresário José de Alencar, volta ao seu tema predileto: os juros. Para ele, é preciso que haja uma tomada de posição, uma “cruzada nacional” contra os juros altos. O Brasil tem que despertar, repete Alencar, contra a usura da agiotagem que rouba dos setores produtivos todas as forças que poderiam estar fazendo nossa economia crescer e gerar empregos.
Houve tempo em que Alencar falava sobre o assunto como um clandestino no governo em que ele é, queiram ou não alguns, a segunda estrela. Houve quem quisesse encrencá-lo contra o presidente Lula e contra a equipe econômica do governo, formada basicamente por ex-militantes do PT. Gente importante como o presidente do Senado, o ex-presidente José Sarney, disse que ele deveria calar a boca, pois vice não fala. Alencar parecia um estranho no ninho. Baixou a bola mas não se deu por achado, tendo repetido várias vezes que o caminho dos juros altos representa suicídio. De todos. Não só do governo, mas principalmente de quem tem alguma responsabilidade com a nação, industriais e comerciantes, desestimulados de investir no progresso por conta da agiotagem institucionalizada.
Pois outro dia veio o próprio presidente Lula a público para fazer parecido discurso, enquanto seu articulador principal – o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu – fazia um solene desafio à rede bancária, dela recebendo, depois, naturais críticas. O governo convenceu-se, enfim, de que é preciso tomar a dianteira. Baixou os juros básicos em mais dois pontos percentuais e liberou a falação contra a usura de Norte a Sul. Para ser mais convincente, lançou programas de crédito mais barato à população, que, querendo, pode se endividar sonhando com o “paraíso”…
Um momento: Alencar está dizendo que não é bem assim. No Japão, por exemplo, a nossa taxa Selic de 20% (ainda exageradamente alta para os padrões globais) seria um absurdo ciclópico. Lá, qualquer dinheiro na especulação rende coisa de apenas um por cento. Ao ano. Por conta disso, os japoneses preferem investir no mercado produtivo, aquele que gera bens, serviços e empregos. Como nós, os japoneses têm dúvidas se o dinheiro traz felicidade. Mas preferem sorrir… Como os chineses, outro povo que abomina a grana volátil, preferindo investimentos estrangeiros em atividades produtivas que lhe garantam o invejável crescimento de 8% ao ano.
De volta à sua seara, José Alencar quer que essa cruzada nacional contra os juros altos chegue à casa de todos. Ao mercado, à escola, farmácias e hospitais, onde o preço do remédio está pela hora da morte. “Vamos denunciar isso aos brasileiros para que eles reajam, para que uma dona de casa saiba que ela não pode pagar esses juros, para que um pequeno comerciante saiba que não pode pagar esses juros, pois vai quebrar.” Para evitar novas trombadas, ressalva que o pessoal que integra o Conselho de Política Monetária é gente de primeiro time, técnicos, economistas, doutores, PhDs e tudo o mais. Mas, entre tantos amigos, ele se bate “contra o regime de juros brasileiros, divorciado do mercado internacional”, que nos coloca em posição de extrema desigualdade nos negócios.
E concorda com o presidente Lula quando diz que o Brasil tem que deixar de ser um País menor. Mas para deixar de ser um País menor e levantar a cabeça, o Brasil precisa dar um basta nos juros elevados que, além de outros males, tiram das empresas brasileiras toda capacidade de competição. O governo também lucrará com isso. Segundo Alencar, somente o custo de nossa dívida leva o correspondente a dez por cento do PIB brasileiro – “uma barbaridade”.
A cruzada de Alencar está lançada. Embora ele não conte com o aparato da mídia à disposição do presidente, é palavra de vice que merece ser considerada. E acatada imediatamente.