O princípio, inserto em nossa Carta Magna e no Estatuto da Criança e Adolescente, parece claro e simples, porém, nem sempre é fácil dar cumprimento ao mesmo. O poder público, responsável pelos programas sociais, muitas vezes se omite e geralmente alegam falta de verbas para maiores investimentos, o que, em muitos lugares, choca com os escândalos do desvio do dinheiro público. A revista Veja publicou na edição de n.º 1.851, de 28 de abril do corrente ano, matéria que denuncia que a corrupção e inépcia nas prefeituras desviam mais de 20 bilhões de reais por ano. A favor de nossas crianças e adolescentes, imaginem o que poderia ser feito com este dinheiro, que poderia ser somado a outras vultuosas quantias das quais temos notícias, que foram surrupiadas do povo brasileiro e acabaram no exterior nas mãos de pessoas inescrupulosas e egoístas que obviamente não tem nenhuma preocupação com o seu semelhante. É função do poder público, o combate à corrupção e a luta para que o dinheiro dos brasileiros reverta a favor do povo, garantindo a saúde, educação e vida com mínimo do dignidade. Não se pode esperar, no entanto, que apenas o poder público tenha a responsabilidade pelos problemas sociais de nosso país e aí estão as Organizações Não-Governamentais e outras milhares de empresas e entidades dispostas a colaborar em todos os sentidos. Cada indivíduo pode também fazer a sua parte, iniciando por afastar o preconceito, enxergando nossa realidade com olhos de bondade e não de desprezo. A absoluta falta de recursos da famílias que vivem abaixo da linha de pobreza levam a um círculo onde os mais jovens repetem a história de seus pais, porque, sem educação e sem estrutura, não conseguem melhorar por falta de perspectiva, de iniciativa e de apoio. A falta de estrutura reflete direta e impiedosamente sobre as crianças, que serão adolescentes sem rumo, que serão adultos com problemas, que terão filhos, os quais serão crianças vitimizadas e serão adolescentes desajustados, que serão adultos com problemas…

Junto ao poder público, todas as pessoas que de alguma forma trabalham ou tem algum envolvimento com crianças e adolescentes, devem se unir em busca incessante para a melhoria da condição de vida do povo brasileiro. Só com movimento constante para erradicação da miséria e da violência, poderemos assegurar prioridade absoluta aos nossos infantes e jovens, eles sim, as maiores vítimas do descaso, do abandono, das drogas e da violência em todas as suas formas.

Felizmente, se existem aqueles que não colaboram e não se importam, temos, do outro lado, um verdadeiro exército de pessoas comprometidas com as causas sociais, trabalhando incansavelmente para atingir seus objetivos. O Poder Judiciário bem como o Ministério Público devem ter participação efetiva neste processo dando também, prioridade absoluta para a área da infância e juventude. São os operadores do direito que podem, muitas vezes, fazer valer os preceitos constantes do ECA através de ações dinâmicas e eficientes que visem garantir os diretos previstos no Estatuto, seja cobrando do Poder Público competente que cumpra com as suas obrigações, seja, promovendo ações que visem garantir a aplicação das medidas de proteção previstas no artigo 101 do Estatuto, agilizando sobretudo as ações que visem a destituição do poder familiar para garantir o direito à convivência familiar posto, que, na impossibilidade que esta convivência possa se dar junto a família biológica, que seja garantido o direito à família substituta.

Temos que lembrar que as crianças não ficam congeladas esperando que alguém tome alguma providência, elas crescem dia a dia e, quando, percebermos, pode ser tarde demais. Lembremos que os adultos, de uma maneira ou outra, sempre vão em busca de seus direitos, ou pelo menos daquilo que eles entendem por direito, ao contrário da criança que permanece inerte, sem a menor noção do que acontece ou do que lhe é devido. Sabe apenas a história de seu sofrimento, de suas dores, de suas amarguras. Precisamos, então, de maneira cada vez mais eficiente, buscar o cumprimento do artigo 19 do ECA, assegurando a convivência familiar, dando às nossas crianças e jovens a oportunidade de serem felizes.

Lídia Munhoz Mattos Guedes é juíza da Vara da Infância e Juventude – Risco – de Curitiba.

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