A realização em São Paulo da 11.ª Conferência das Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento (Unctad) foi excelente oportunidade para reflexão sobre medidas voltadas a ampliar a competitividade do País. Em seminário preparatório ao evento, enfoquei pontos essenciais ao sucesso da política industrial do governo, atração de mais investimentos e fomento do comércio exterior. O primeiro refere-se ao Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC), cuja revisão é necessária, pois a globalização, tecnologia da informação e choques que abalaram os mercados internacionais o tornaram obsoleto.
As fusões e incorporações no sistema financeiro e a oligopolização do grande varejo não têm passado pelo crivo do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), vinculado ao Ministério da Justiça. No outro extremo, estão os casos ligados à indústria, transportes e outros setores. Estes são submetidos ao SBDC e julgados pelo Cade. Os atuais ritos, porém, são complexos, lentos e confusos, ou seja, incompatíveis com a dinâmica do setor privado, fomentando insegurança nas empresas dispostas a investir em fusões e/ou aquisições. Também falta articulação entre o Cade e demais organismos do SBDC: Secretaria de Direito Econômico, vinculada ao Ministério da Justiça; Secretaria de Acompanhamento Econômico, ligada à pasta da Fazenda; e Departamento de Defesa Comercial do Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior. Às vezes, a ausência de sintonia causa pareceres antagônicos e prazos elásticos.
Iniciativa que poderia atenuar as falhas seria, conforme sugere o advogado Rodrigo B. Fontoura, a adoção do pré-contrato, que fixa entendimentos anteriores à efetivação do negócio, concedendo às partes, no caso de imprevistos, o poder de trazer à baila o status quo ante original. Esta possibilidade é crucial, pois, considerando que o Cade pode interferir no pacto contratual é necessário mecanismo capaz de minimizar o impacto de eventuais vetos a uma fusão.
Aporte tecnológico é o segundo ponto decisivo. Os produtos brasileiros têm baixo grau de inovação. Isto reduz a rentabilidade sobre o capital e limita o potencial exportador. Parcerias com empresas internacionais podem agilizar os resultados positivos, em especial se orientadas a reforçar a subsidiária brasileira como plataforma de exportação. Além disso, a necessidade suplementar de poupança externa requer política de atração de investimentos em setores com vocação para o comércio exterior. Isto implica esforços de promoção, facilitação do acesso, simplificação e desburocratização de processos/requisitos.
Também é preciso ampliar o desenvolvimento tecnológico nacional, pois o Brasil ainda investe relativamente pouco em pesquisa, apresenta resultados apenas razoáveis em produção científica, registra número baixo de patentes e tem participação pequena dos setores de alta intensidade tecnológica no sistema produtivo. Assim, são necessários estudos e mecanismos eficazes para aumento da taxa de sucesso das atividades de inovação, à semelhança das economias desenvolvidas.
A superação das deficiências competitivas do Brasil também não pode prescindir da constituição de grupos empresariais de porte mundial. Não se recomenda restrição ao investimento estrangeiro, que continua bem-vindo, mas se deve estimular a formação de companhias nacionais de padrão mundial e o desenvolvimento de médias e grandes empresas de alta tecnologia, em hardware e software. Além disso, é preciso dar tratamento adequado à propriedade intelectual, comércio eletrônico, inclusão digital e economia baseada em conhecimento.
O desenvolvimento regionalizado do País deve, ainda, estar associado ao fomento das pequenas empresas, com a formação de clusters e processos de inovação e aprendizado competitivo, promovendo-se o associativismo empresarial, consórcios de exportação e centros de compras, design e tecnologia. É imprescindível, para isso, atuação vigorosa e criativa do sistema de apoio às micro, pequenas e médias empresas, em associação com os organismos ministeriais e as instituições federais de crédito, tudo em sintonia com o setor produtivo.
Finalmente, diminuir o imenso custo das empresas (em especial impostos e juros) é condicionante ao sucesso da adesão do País a novos blocos econômicos e intensificação do comércio externo. Isto inclui a perspectiva de reduções tarifárias adicionais para viabilizar o incremento do chamado comércio Sul Sul, como se propugnou na 11.ª Unctad. A rigor, para multiplicar o intercâmbio comercial com as nações emergentes e também com União Européia e Alca, o Brasil não pode mais adiar a solução dos gargalos que o separam da prosperidade.
Ruy Martins Altenfelder Silva
, advogado, é presidente do Instituto Roberto Simonsen e vice-presidente do Conselho Administrativo do CIEE. Foi secretário da Ciência, Tecnologia, Desenvolvimento Econômico e Turismo do Estado de São Paulo.