A averbação e a fraude de execução na reforma do CPC (Art. 615-A)

A reforma promovida pela Lei n.º 11.382, de 6 de dezembro de 2006, alterou importantes aspectos da execução civil.

Uma das mais significativas reformas é aquela que consta no art. 615-A do Código de Processo Civil (CPC), segundo a qual, no momento do início de uma ação de execução ou da fase de execução, se se tratar de título judicial(1), o credor poderá obter uma certidão comprobatória do início da ação e, com isso, providenciar o registro ou a averbação dessa informação nos cartórios de registros de imóveis e nos órgãos encarregados do registro de veículos.

O credor passa, então, a ter uma garantia mais efetiva, pois conseguirá evitar que o devedor, mesmo antes da citação, aliene seus bens em fraude de execução.

Não obstante ter proporcionado maior efetividade ao processo, a nova regra tem despertado uma inquietante preocupação. Ocorre que, no § 3.º do art. 615-A, consta uma exigência aparentemente desnecessária e, em certa medida, conflitante com a doutrina e a jurisprudência existentes a respeito do tema.

De acordo com essa regra, ?presume-se em fraude à execução a alienação ou oneração de bens efetuada após a averbação (art. 593)?. Uma leitura menos atenta dessa regra pode levar ao entendimento de que a averbação teria se tornado obrigatória na nova execução civil, como se não fosse mais possível haver fraude de execução sem que o credor tivesse cumprido essa exigência.

Não é essa, no entanto, a melhor interpretação da nova regra.

Segundo a jurisprudência consolidada de nossos Tribunais, basta que o devedor tenha sido citado e, em seguida, alienado seus bens, no processo de conhecimento ou no processo de execução, para que a fraude de execução fique caracterizada (art. 592, V, do CPC).

A doutrina também acolhe esse entendimento porque, como fica fácil perceber, a existência de citação permite presumir que a alienação de bens, pelo devedor, a ponto de reduzi-lo à insolvência, caracteriza fraude de execução.

Seria mesmo difícil imaginar que um determinado devedor, já citado, não agiria fraudulentamente em circunstâncias assim, mesmo não tendo ocorrido a averbação a que se refere a regra contida no § 3.º do art. 615-A.

Como a lei, ao menos em tese, não contém palavras inúteis, a melhor interpretação que se pode dar a essa regra é a de que, conquanto não constitua requisito indispensável para a configuração de fraude de execução, a exigência de averbação deve ser observada, a fim de evitar a alegação de boa-fé por parte do adquirente dos bens, de maneira análoga ao que acontece na hipótese prevista no art. 659, § 4.º, do CPC, segundo a qual a exigência de registro da penhora de bens imóveis torna absoluta a presunção de que os eventuais adquirentes de bens, pertencentes a um determinado devedor, tinham conhecimento da existência de uma ação em curso, em que o patrimônio desse devedor pode responder por uma dívida.

Nessas hipóteses, os adquirentes, chamados terceiros, não podem alegar boa-fé para evitar a caracterização da fraude de execução, mas isso não significa que a averbação seja absolutamente necessária para que ocorra essa fraude de execução.

Nota:

(1) Não deve ser descartada a hipótese de averbação no início de uma ação de conhecimento, pois, nos termos da doutrina em geral, pode ocorrer fraude de execução quando, na pendência do processo de conhecimento, o réu aliena seus bens com o propósito de evitar o cumprimento da obrigação de pagar.

Marcelo José Magalhães Bonício é mestre e doutor em Direito Processual Civil pela Universidade de São Paulo (USP), procurador do Estado de São Paulo e professor no Complexo Jurídico Damásio de Jesus.

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