1. Efeito preclusivo em caso de ausência de manifestação sobre cálculos apresentados pela parte contrária
O parágrafo 2.º do artigo 879 da CLT, com a redação da Lei n.º 8.432, de 11/6/92 (DOU 12/6/92) estabelecia: “Elaborada a conta e tornada líquida, o Juiz poderá abrir às partes prazo sucessivo de 10 (dez) dias para impugnação fundamentada com a indicação dos itens e valores objeto de discordância, sob pena de preclusão“.
De imediato, surgiu controvérsia sobre a exata interpretação desse texto legal, que até hoje seguia polêmica e longe de ser pacificada.
A primeira corrente defendia a tese que: “Aberta vista dos cálculos, terão as partes que se manifestar sobre aqueles. Não o fazendo, não mais poderão externar sua manifestações quando dos embargos, no caso do executado, ou na impugnação, na hipótese do exeqüente, pela ocorrência da preclusão. As partes não mais poderão falar sobre a questão nos embargos à execução ou na impugnação de que trata o parágrafo 3º do artigo 884 da CLT, em razão da ocorrência da preclusão” (MARTINS, Sergio Pinto. Comentários à CLT. 4.ª ed. São Paulo: Atlas, 2001, p. 855).
A segunda corrente, que podemos chamar de restritiva, posicionou-se no sentido que: “A faculdade prevista no parágrafo 2.º do artigo 879 da CLT tem aplicação restrita aos cálculos apresentados pelo contador, e não pelas partes, sob pena de tratamento diferenciado aos litigantes, em flagrante ofensa ao artigo 125, I, do CPC, uma vez que a preclusão estabelecida estaria restrita ao devedor” (TRT-PR-AP-3.491/98. Ac. N.º 6.632/99 ? 2ª T, publicado no DJPR em 16-04-99, Rel. Juiz Luiz Eduardo Gunther).
Ainda não pacificada essa questão, surge a Lei n.º 10.035/00, que acrescenta os parágrafos 1.º-B e 3.º ao artigo 897 da CLT.
O § 1.º-B do art. 879 da CLT menciona: “As partes deverão ser previamente intimadas para a apresentação do cálculo de liquidação, inclusive da contribuição previdenciária incidente” e o § 3.º do mesmo dispositivo estabelece: “Elaborada a conta pela parte ou pelos órgãos auxiliares da Justiça do Trabalho, o juiz procederá à intimação por via-postal do Instituto Nacional do Seguro Social (…) para manifestação, no prazo de dez dias , sob pena de preclusão“.
Antes de dizermos qual seria a interpretação razoável, sobre o tema, a partir de agora, recordamos que a palavra preclusão tem sentido de “perda, caducidade de um direito de um termo ou de uma faculdade legal ou processual que não foi exercitada dentro do tempo prefixado” (NUNES, Pedro. Dicionário de Tecnologia Jurídica. Vol. II 9.ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos,1976. p. 681).
Em face, assim, do que está posto no artigo 879 da CLT, pela Lei n.º 10.035, através dos parágrafos 1.º-B e 3.º, pode-se entender que, desde 26.10.00, como leciona o Professor Antonio Manoel Teixeira Filho, em seu atualizadíssimo, e sempre esclarecedor “Execução no Processo do Trabalho”, “a critério exclusivo do juiz, os cálculos de liquidação poderão ser feitos pelas partes ou por algum auxiliar do juízo, como é o caso do contador. Sendo assim, se uma das partes deixar de manifestar-se acerca dos cálculos apresentados pela outra, haverá, para aquela, preclusão, por forma a impedi-la de discutir os cálculos (por meio de embargos, de agravo de petição, de recurso de revista etc.) na mesma relação processual. Não fosse assim, não faria sentido a preclusão de que trata a lei” (TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Execução no Processo do Trabalho.7.ª ed. São Paulo: LTr, 2001. p. 22).
O que pode se controverter é se existe condição para a aplicação dessa regra geral. A Seção Especializada do E. TRT da 9.ª Região, em sua maioria, entende que sim, ou seja, posiciona-se no sentido de que não havendo a necessária intimação sob pena de preclusão, ela não se aplicaria.
Em resumo, esta foi a posição defendida recentemente no AP 175/02, julgado em 3/6/02: em face da nova redação do artigo 879, com os parágrafos 1.º-B e 3.º, não remanesce mais o antigo entendimento no sentido que somente os cálculos apresentados pelo contador atrairiam a preclusão. Desde a Lei 10.035/00, que passou a viger em 26/10/00, sempre que determinado pelo juiz, sob cominação prévia e expressa de seus efeitos, se uma das partes não se manifestar sobre os cálculos apresentados pela outra, terá que ser reconhecida, a preclusão, impossibilitando que sejam controvertidos em embargos e agravo de petição (Rel. Juiz Luiz Eduardo Gunther).
2. A quem se dirige os efeitos da preclusão
Essa preclusão, contudo, vale lembrar, trata-se de penalidade dirigida à parte, e não ao juiz. Este pode, evidentemente, rever a conta mesmo diante de preclusão para a parte. Isto ocorre, por exemplo, em caso de manifesto erro material que eive a coisa julgada. Erro do tipo corrigível de ofício, na forma dos artigos 833 e 897-A, parágrafo único, da CLT.
O Professor Sergio Pinto Martins ensina: “É de se destacar que o § 2.º, do art. 879, da CLT, ao usar a expressão pena de preclusão, mostra que tal penalidade é dirigida à parte e não ao próprio juiz. O juiz pode rever os cálculos mesmo tendo havido preclusão da parte, se houver um erro manifesto, como de zeros. A conta poderá ser revista pelo juiz até para se adequar à coisa julgada. Os erros, inclusive, poderiam ser corrigidos até mesmo antes da execução, como indica o art. 833 da CLT” (MARTINS, Sergio Pinto. Direito Processual do Trabalho. 17.ª ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 581).
3. Oportunidade de apresentação de cálculos pelas partes continua sendo faculdade do juiz
Por fim, sobre a alteração legislativa em comento, é importante salientar que não desapareceu o caráter facultativo da abertura de prazo para impugnação aos cálculos de liquidação. O parágrafo 3.º do artigo 879 da CLT deixa evidenciado que a iniciativa para a liquidação do julgado compete às partes ou aos órgãos auxiliares da Justiça do Trabalho.
4. Conclusões.
Em face da nova redação do artigo 879, com os parágrafos 1.º-B e 3.º, não remanesce mais o antigo entendimento no sentido que somente os cálculos apresentados pelo contador atrairiam a preclusão; b) Temos assim, desde a Lei 10.035/00, que passou a viger em 26/10/00, sempre que determinado pelo juiz, sob prévia e expressa cominação, se uma das partes não se manifestar sobre os cálculos apresentados pela outra, terá que ser reconhecida a preclusão, impossibilitando que sejam controvertidos em embargos e agravo de petição; c) A preclusão trata-se de penalidade dirigida à parte, e não ao juiz, que pode, sempre, diante de manifesto equívoco, rever a conta, mesmo diante de preclusão para a parte; d) não desapareceu o caráter facultativo da abertura de prazo para impugnação aos cálculos de liquidação (parágrafo 3.º do art. 879 da CLT).
Luiz Eduardo Gunther
é juiz do TRT da 9.ª Região. Cristina Maria Navarro Zornig é assessora de juiz do TRT da 9.ª Região.