Soubessem os petistas e simpatizantes de Lula que a política fiscal do seu governo seria a que está sendo praticada e, muito provavelmente, nele não teriam votado. E o eleito poderia ser um de seus opositores. Soubesse o atual governo que, aumentando o superávit fiscal para o ano que vem, sustentar-se-ia perante a opinião pública e, muito provavelmente, a meta deste ano, que é de 4,25%, poderia vir a ser maior.
Seria ideal que o Brasil pudesse ter um superávit primário, ou seja, diferença favorável entre receitas e despesas, excluídos os juros, suficiente para fazer um bom caixa e reduzir substancialmente a dívida externa. Ou torná-la tão pequena, quando financeira e não de investimentos diretos, que tornasse o nosso país efetivamente independente. Independente de capitais de terceiros e capaz de andar pelas próprias pernas, sustentando o seu próprio desenvolvimento.
Nada disso aconteceu e é possível que, em 2005, continue a mesma política, agravada com uma meta de superávit ainda maior. Maior do que queriam os petistas, do que eles condenavam no governo passado, do que vêm praticando e ainda do que fixaram na LDO para o próximo ano. Sabidamente, a área da Fazenda, o ministro Antônio Palocci à frente, consideram que quanto mais dinheiro for possível economizar para pagar os nossos mutuantes, governos, banqueiros, investidores e instituições financeiras internacionais, mais rapidamente estaremos ajustando a base para o desenvolvimento econômico sustentado.
A situação atual é mandar para fora, para pagar juros, o dinheiro que aqui dentro faz falta para promover o desenvolvimento econômico e cumprir com as metas sociais. Uma política que pode até ser necessária, mas sem dúvida é, para o povo brasileiro, de sacrifícios dolorosos.
No atual governo, tanto a oposição quanto parte do situacionismo insistem em reduzir os pagamentos dos serviços da dívida, para que mais dinheiro sobre para as necessidades de desenvolvimento e sociais dos brasileiros. No governo Lula, entretanto, já se cogita o contrário. Foi o que fez entender o secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, certamente não contrariando o ministro da Fazenda, seu chefe, e ganhando aplausos do Fundo Monetário Internacional e dos credores.
É de se crer que o que faz o governo pensar num ousado aumento do superávit fiscal para o ano que vem são a melhoria nos índices de popularidade do governo Lula, as razoáveis chances que tem no próximo pleito, o aumento pequeno, porém real do PIB, e o controle, um tanto quanto frouxo, mas ainda assim existente, da inflação. Essa situação permitiu a ousadia de aumentar a taxa básica de juros e outras pode estar inspirando. Dentre elas, o aumento do superávit.
Mas essa política pode ser uma armadilha. Embora haja quem a defenda, dos dois lados, oposição e situação, a verdade é que o retardamento da retomada do desenvolvimento e a procrastinação dos programas sociais podem significar uma séria armadilha. Temos ainda um alto índice de desemprego, um percentual de brasileiros enorme abaixo da linha da pobreza, greves espoucando, elevado desemprego e invasões de terras. O tecido social, em vários setores, está se esgarçando e pode, em alguns casos, chegar ao rompimento.
Mais um ano de sacrifícios para as forças produtivas e a população pode significar o contrário do que hoje parece estar sendo colhido. Seria semear ventos, para colher tempestades. Arriscar uma estabilidade institucional precária, perigosa e temerária. Algo como o que se vive na vizinha Venezuela.