A ameaça da inflação

Não será necessário esperar muito para que o “efeito Regina” (o medo ou temor de uma nova escalada da inflação) se confirme na economia brasileira: a semana começou com o anúncio de coisa nada agradável ? a previsão de aumento médio da ordem de vinte por cento no custo das tarifas de energia elétrica. E não se trata de especulação. A alta é admitida até pela Agência Nacional de Energia Elétrica ? Aneel, o órgão governamental que controla o setor. Para o próximo ano, o governo já trabalha, baseado nos contratos vigentes, com reajuste das tarifas de energia elétrica da ordem de 20,7%.

A tendência altista está sendo puxada pelo dólar, que amarra o setor e que sobe em função da especulação e dos temores e incertezas do mercado financeiro diante da realidade política brasileira. Analistas calculam que a variação do dólar influenciará em mais de 60% os custos não administrados pelas empresas que incluem energia comprada, impostos e encargos setoriais. A participação desses custos nos reajustes das tarifas podem chegar a 80% do índice autorizado pela Aneel. Também em outros setores o preço do dólar tem efeito semelhante. Assim, por mais que o medo seja transformado em objeto de patrulha ideológica nestas vésperas de eleição, ele é um fato que existe de verdade e, também de verdade, já faz estragos. Para constatá-lo, é só ir ao supermercado.

Será este, sem dúvida, o principal desafio do futuro governo ? seja ele de Lula da Silva, o metalúrgico, seja ele de um já quase improvável José Serra, o ex-exilado. Em matéria de economia e finanças, os milagres não existem e o estrago de hoje pode ser a ruína de amanhã. Por isso, a primeira resposta do candidato favorito das pesquisas ao temor oportunamente manifestado por uma artista foi sintomática. A tentativa de criminalizar a manifestação de medo não ajuda. Alheio ao discurso político, o dólar continua nas alturas, contaminando preços, custos e produzindo mais terror. Para dissipar o medo, por temer revés em sua campanha, Lula mudou de tática. Prometeu comando pessoal sobre a economia. Isso seria suficiente para o dólar baixar, o risco Brasil diminuir, os investidores voltarem a acreditar? Pelo visto, isso não contribuiu para dissipar as nuvens de maus presságios, fabricadas por maus brasileiros, por especuladores internacionais, por bancos sedentos de lucros absurdos, por políticos que tentam influenciar o povo e alterar a vontade das urnas de domingo. Um comandante supremo, no caso o presidente da República, além de orientar subordinados, precisa estar familiarizado com a arte da guerra. E Lula certamente está preparado para enfrentar a borrasca. Como também está o seu adversário, José Serra.

A angústia que o candidato da oposição diz já estar sentindo diante da certeza da vitória de domingo é, assim, a mesma incerteza que o Brasil, disposto a mudar, haverá de experimentar com a revelação das urnas: a grande maioria dos brasileiros quer que as coisas mudem, sim, mas não aprova a idéia de uma volta da inflação aos moldes antigos, quando os que mais perdem são exatamente os que menos têm. Se impedir essa desgraça anunciada, o próximo presidente pode ter a certeza de vida longa.

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