Por meio das plataformas digitais de música, Zé Renato monta playlists que funcionam como trilha sonora para atividades corriqueiras do dia a dia, como lavar louça. Uma delas foi dedicada apenas a canções de Paulinho da Viola. Algumas conhecidas, outras nem tanto. Mas todas com características melódicas e líricas que evidenciam a qualidade de um dos grandes compositores da música brasileira.

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Ao escutá-las com atenção, o cantor descobriu que poderia contar uma história por meio de algumas delas e foi tirar as harmonias no violão. “Fui me tocando da grandiosidade da obra dele”, conta Zé. Daí surgiu a semente de O Amor É Um Segredo – Zé Renato Canta Paulinho da Viola, álbum com nove canções de Paulinho. Ele faz os shows de lançamento em São Paulo nos dias 11 e 12, no Sesc Bom Retiro. Os ingressos já estão à venda nas bilheterias e no site da instituição.

Há algum tempo, Zé, que tem 63 anos, vem se aproximando das canções de Paulinho em seus álbuns. Zé Renato Ao Vivo (2007) e O Vento na Madrugada Soprou (2014), este gravado por ele com os instrumentistas Rômulo Gomes (baixo) e Tutty Moreno (bateria), são abertos por músicas do compositor.

O músico quis que a ideia despretensiosa de fazer um projeto em homenagem a Paulinho da Viola se refletisse no clima da gravação, feita no estúdio da produtora de publicidade Luni, no Recife. A empresa pertence ao compositor Lula Queiroga, amigo e parceiro musical do cantor há mais de 30 anos.

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Quando foi fazer um show com o Boca Livre na capital pernambucana, Zé contatou Lula para gravar o disco na sala de áudio do espaço, que ele já conhecia. Voz e violão foram registrados em apenas um dia, com sopros e detalhes de percussão colocados no dia seguinte.

Das canções do álbum, poucas podem ser consideradas sucessos. Zé diz que a aposta em lados B de Paulinho surgiu naturalmente. “Foi acontecendo à medida que fui ouvindo as músicas e achando os caminhos no violão. Isso me ajudou a dar o caminho da interpretação. Por coincidência, alguns sambas eram menos conhecidos. Mas é um estímulo chamar atenção para um repertório menos ouvido”, conta.

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Ele conversou com Paulinho sobre a ideia do disco antes da gravação. O homenageado gostou das músicas escolhidas, justamente pela maioria delas serem pouco conhecidas. “Sempre que o encontro temos uma conversa ótima, ele é muito tranquilo e atencioso. Fiz questão de avisar que ia gravar. Mas falei com ele muito rapidamente, com o cuidado de não deixá-lo em saia justa. Não é porque eu gravei que ele é obrigado a gostar”, diz Zé. Quando o cantor conversou com o Estado, Paulinho ainda não tinha ouvido o disco.

A proposta de O Amor É Um Segredo, segundo Zé Renato, foi fazer uma “leitura pessoal” das músicas de Paulinho. Com canções falando de amor e das múltiplas sensações que podem vir dele, ele escolheu como título um verso de Só o Tempo. “Os sambas têm uma dose de tristeza. Os mais lindos são os mais tristes”, afirma.

Ele também resgatou canções de Paulinho feitas com parceiros marcantes na trajetória artística do compositor.

Elton Medeiros, que morreu na véspera da gravação do álbum, tem conexão com o próprio Zé Renato. Os dois eram amigos e fizeram um disco juntos em 1997, ao lado de Mariana de Moraes. “Elton foi muito importante na minha ligação com o samba”, reforça Zé, que da parceria entre Paulinho e Elton optou por Vida.

De Paulinho e Mauro Duarte, ele incluiu Foi Demais, de 1979. O cantor não conhecia a música e gostou da letra que fala sobre uma pessoa que quer se reerguer depois do fim de um amor.

Candeia também é lembrado com Minhas Madrugadas, que Zé já cantava informalmente. “Pela primeira vez na minha vida eu gravei assoviando. Fiquei um pouco receoso, mas Lula deu força para que o assovio ficasse”, diz Zé.

No estúdio, ele não teve a referência do metrônomo para guiar o andamento das canções. “Foi uma gravação absolutamente solta”, afirma. Apenas três músicos tocam no disco. O saxofone do Maestro Spok, nome forte do frevo pernambucano, reforça a elegância de quatro faixas. Uma delas é o clássico Para Um Amor no Recife. Zé diz que a presença da música no disco pode soar óbvia pelo registro ter sido feito no Recife, mas que ela serve como referência do clima inspirador da cidade.

Em Cidade Submersa, ele quis evocar o estilo de Chet Baker e perguntou a Lula quem era “o Chet Baker pernambucano”. O músico Fabinho Costa foi ao estúdio e gravou trompete com surdina na releitura. Produtor do disco ao lado de Zé e do irmão Lula, Tostão Queiroga também toca percussão em algumas faixas.

Com foto feita por Juarez Ventura, a capa do disco foi idealizada por Lula. A imagem mostra um casal de negros idosos – o motorista que trabalha na Luni e sua mulher – se beijando. “Não deixa de ser um manifesto, nesses tempos de brutalidade, colocar essa capa com o poema de amor que a foto representa”, afirma o cantor.

Show. Nos shows de lançamento de O Amor É Um Segredo, Zé interpreta todo o repertório do álbum e músicas de Paulinho que ficaram de fora. O cantor se lembra com carinho de uma delas. “Meu pai (o jornalista Simão de Montalverne) era amigo de vários músicos, entre eles Cartola, e adorava cantar Coisas do Mundo, Minha Nega, que Paulinho inscreveu na Bienal do Samba. Foi a primeira música do Paulinho que ouvi na vida”.

Ele ainda canta músicas de outros autores que seu homenageado gravou, como Duas Horas da Manhã, de Nelson Cavaquinho e Ary Monteiro, e Coração Oprimido, de Zorba Devagar e Walter Alfaiate. Zorba também traz boas memórias a Zé. O sambista foi assistente de direção do primeiro show do Boca Livre, ao lado de Edu Lobo, no final dos anos 1970. “Ele era assistente do Fernando Faro, já era compositor de sambas e eu não sabia. Era um cara simples e gentil.”

Projeto

Além de seguir fazendo apresentações pelo Brasil para divulgar O Amor É Um Segredo, Zé já tem outro disco engatilhado para este início de 2020. Em fevereiro, ele entra em estúdio novamente e grava para o Selo Sesc Água Pras Crianças.

Concebido há mais de dez anos, o projeto dedicado ao público infantil tem músicas sobre as águas do planeta. Há canções de Zé feitas com Joyce Moreno, Pedro Luís e também com Zélia Duncan.

SERVIÇO

ZÉ RENATO
SESC BOM RETIRO. ALAMEDA
NOTHMANN, 185. DIA 11/1, 21H,
E DIA 12/1, 18H. DE R$ 9 A R$ 30.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.