Vida em capítulos

Se nem todo filho de pais artistas se torna um bom ator, Ana Rosa é a prova de que o talento muitas vezes vem do berço. Antes mesmo dar seus primeiros passos, a atriz conheceu o palco pela primeira vez ainda bebê – quando foi levada ao picadeiro de um circo pelos pais. Sua estréia na tevê foi em Alma Cigana, novela de Ivani Ribeiro exibida na Tupi em 1964 – a primeira diária da emissora. De lá para cá, a paulista de 64 anos esteve em exatas 53 novelas. Em 1997, a atriz entrou para o livro dos recordes como a que mais atuou em telenovelas no mundo, somando 43 tramas na carreira. De lá para cá fez mais dez e Bicho do Mato é a sua 54.ª novela. Na atual trama das sete da Record, Ana vive a recatada Jurema, uma servente submissa que ?assina embaixo? de tudo o que diz a amiga Vanda, vivida por Regina Maria Dourado. ?Para mim, o mais gostoso é quando estou em cena atuando e fazendo um bom personagem?, aponta.

P – Para você, que já fez diversas novelas, a televisão mudou muito com as modernas câmaras, iluminações e afins?

R – Com certeza. Olha, na Tupi eram aquelas câmaras com tripé e quatro lentes. Então, o ator sabia quando ele estava em close, quando estava em plano americano, quando estava em plano geral. Era ótimo! Como sabíamos quando o colega estava em close, fazíamos gestos e brincávamos muito um com o outro no set. Bom, com essas novas câmaras – em que o ?cameraman? aperta um botãozinho e faz um zoom – o ator tem de ficar atento o tempo inteiro. Não dá mais para brincar como antigamente.

P – Era mais gostoso trabalhar naquela época?

R – Não sei se foi mais gostoso. Para nós veteranos daquele período tem uma coisa boa que era a nossa juventude. Foi um tempo em que eu e a minha geração estávamos investindo muito na carreira, nos descobrindo. Aprendemos muitas coisas e a televisão nos formou naquela época. Mas não acho que o passado tenha sido melhor.

P – Independentemente disso, você acha que as novelas melhoraram?

R – Veja bem, quando comecei em 1964 na Tupi, as novelas duravam meia hora no ar e tinham apenas dois intervalos. O produto era praticamente artesanal, com um cuidado enorme dos detalhes. Uma coisa que acho que era melhor: quando nós errávamos uma cena durante a gravação, o diretor queria comer o nosso fígado, porque se o ator errasse no final ou fizesse uma cena linda, mas um outro ator abrisse uma porta e errasse sua fala, nós tínhamos de gravar tudo novamente, desde o comercial.

P – Mas por que isso?

R – Tudo porque não existia o ?kill? eletrônico. As gravações eram de comercial a comercial. Se alguém errasse, a cena tinha de ser totalmente refeita. Isso fez com que os atores tivessem um compromisso de não errar. Tanto que, ainda hoje, é difícil o ator veterano parar uma cena. Isso era bom sob um aspecto: se o ator fizesse bem uma cena, ele sabia que ela iria ao ar exatamente da maneira como foi feita. Já com o ?kill?, o editor passa a ser dono do trabalho. Em termos de edição, o capítulo até fica mais bonito. Mas o ator fica muito na mão. Ainda mais se não tiver um editor com sensibilidade.

P – Você acha que o interesse comercial passou a valer mais que o artístico na televisão de hoje?

R – Muita gente fala que a tevê de hoje tem muito atores novatos, jovens. Mas é bem verdade que a televisão é um veículo comercial e visual, que se sustenta em 50% ou mais com gente bonita, atores jovens. Vejo isso com bons olhos. Acho importante porque a renovação é fundamental. Existem jovens com muita garra e talento. É um processo natural. Agora, tem muito veterano que se queixa, dizendo que é uma inversão de valores um bom ator ter menos espaço que outro ainda inexperiente. Pois acho que quem é realmente bom consegue se manter.

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