Sebastian Schipper brinca com o repórter, numa entrevista por telefone, de Berlim. “Se não tivesse feito esse filme, provavelmente estaria preso.” Ele se refere a Victoria, seu longa que estreou na quinta-feira, 24. Durante muito tempo, Schipper sonhou acordado, perseguido pelo que terminou virando obsessão. Ele se imaginava roubando um banco. Como não é ladrão profissional, mas cineasta, resolveu sublimar o desejo realizando um filme. “Até tentei, mas não era a mesma coisa. Comecei a escrever, mas me dei conta de que faltava a excitação do risco.”
E, aí, um dia, ele teve a ideia. “Se o problema era de excitação, poderia compensar, transformando o roubo de mentira num risco de verdade.” Como? Fazendo o filme num único plano-sequência. Alexander Sokurov já havia feito isso, mas Arca Russa, por mais elaborado que seja, não passa de um passeio de hora e meia da câmera pelo Museu Hermitage, com encenações de quadros famosos e eventos históricos. Victoria é outra coisa. Uma garota – uma estrangeira, e Schipper não consegue explicar direito porque queria que ela fosse de outra cultura – se envolve com os caras errados numa balada e eles a arrastam para o grande roubo do banco. A narrativa dura 2h20 e houve momentos em que Schipper e sua equipe tinham a sensação de estar cometendo uma transgressão de verdade.
Tudo foi muito ensaiado e planejado. O filme foi gravado (em digital) num só plano. “Ficou uma m… O desafio técnico foi vencido, mas os atores ficaram tão presos ao que tinham de fazer que o filme não tinha vida. Todo parecia meio robotizado.” Durante uma semana, Schipper e seus atores pararam para pensar. Discutiram alternativas. Não deu certo, de novo. “Na segunda filmagem, se soltaram demais. Foi o caos.” E, então, em menos de 48 horas e após novas discussões, Schipper deu o start novamente. Ação! Um foi pouco, dois não deu, três foi demais.
Começou o falatório do filme do plano contínuo. Schipper e seus produtores tentaram inscrever Victoria no Festival de Toronto do ano passado, mas o filme foi recusado. “Eles não sabiam em que sessão nos colocar.” Victoria foi para a competição de Berlim e, em fevereiro deste ano, ganhou três prêmios. “Toronto voltou atrás e nos intimou a exibir o filme neste ano. Foi muito engraçado. Recusados num ano e necessários, como eles disseram, no outro.” Criou-se um debate. “A tecnologia digital tem sido utilizada pelo cinemão como ferramenta para a criação de universos fantásticos. Nosso filme vai na contracorrente e as pessoas deram-se conta disso. Desde Berlim, e depois em Toronto, tem havido uma discussão intensa sobre a urgência de Victoria. O conceito do filme é fazer com que o espectador acredite no que vê. A realidade é nossa grande personagem. E eu digo mais. É como se fechássemos um ciclo, voltando aos primórdios do cinema. A filmagem como uma coisa lúdica. Meu maior desafio foi convencer os atores, e Laia Costa (a protagonista), que podíamos errar, que o erro era bem-vindo.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.