Personagens do tipo “perua” costumam agradar em cheio. Outra vantagem: são mais fáceis de interpretar. De fato, em quase toda novela há pelo menos uma representante do gênero, de preferência, bem caricata. Mas é justamente disso que Vanessa Lóes pretende fugir.
A intérprete da mimada e egoísta Branca, de “Sabor da Paixão”, sabe que precisa temperar todos os defeitos da personagem com uma boa dose de humor. Mas não quer cair no “lugar-comum”. “Seria fácil fazer da Branca mais uma perua superficial. Na hora é divertido, o diretor acha ?engraçadinho? e quem vê pode até gostar… Mas percebe que a interpretação está vazia. Isso não me interessa”, analisa.
A tarefa de resistir ao estereótipo não é fácil. Afinal, Vanessa precisa encontrar a chamada “verdade do personagem” em cenas absurdas -como a que Branca compra um poodle para suprir a “carência paternal” do marido, Luís Felipe, de Cláudio Lins. “Ela é uma louca! Poderia participar de ?Os Normais? ou ?A Grande Família?”, sugere. Segundo a autora, Ana Maria Moretzsohn, porém, a personagem fútil e ciumenta ainda vai se revelar uma vilã. Tudo para livrar-se da concorrência pelo amor do marido. “A Branca é ciumenta, egocêntrica e infantil, mas, por enquanto, não a vejo tão malvada assim”, argumenta a atriz, que é só elogios à direção cuidadosa da equipe de Denise Saraceni.
Na verdade, este é o segundo trabalho de Vanessa sob a tutela de Denise. O primeiro foi na estréia na tevê, em 95. O “début” aconteceu na minissérie “Engraçadinha… Seus Amores e Seus Pecados”, adaptação da obra de Nelson Rodrigues, assinada por Leopoldo Serran. O papel – da estudante “certinha” Janete -era pequeno. Mas proporcionou à novata um grande prazer e as primeiras lições de interpretação. No ano seguinte, veio a voluptuosa Pietra, na novela “Vira-Lata”, de Carlos Lombardi. “Quando as gravações acabaram, eu chorava de soluçar! Foi duro me despedir das pessoas e, também, da Pietra… Ficava pensando se ela voltaria algum dia”, devaneia.
Ninfomaníaca
O mesmo diretor de “Vira-Lata”, Jorge Fernando, convidou a atriz para fazer “Zazá”, em 97. Na novela de Lauro César Muniz, ela viveu a ninfomaníaca Lavínia Dumont. Inicialmente, a personagem deveria fazer o gênero “gostosona”. “Bem turbinada, como algumas atrizes que vemos por aí”, compara, sem citar nomes. nessa, que acreditava não se enquadrar neste perfil, optou por outro caminho. “Dei a ela um jeito de taradinha, destrambelhada. Até hoje, tem gente que me chama de Lavínia!”, surpreende-se. Em 99, foi a vez da hipocondríaca Maria Antônia de “Suave Veneno”, de Aguinaldo Silva. E, em 2000, a atriz encarou sua primeira protagonista: a Cíntia, de “Marcas da Paixão”, exibida na Record.
Segundo Vanessa, a novela de Solange Castro Neves sofreu com dificuldades de produção, já que a equipe não tinha experiência em teledramaturgia. Mas a atriz garante que teve tratamento de estrela. Morou num apart-hotel em São Paulo e tinha um motorista à disposição. Além disso, recebia com antecedência os roteiros de gravação – o que, hoje, é fato raro nas produções globais. “Felizmente ?Sabor da Paixão? ainda tem uma boa frente de capítulos. Mas, no passado, já cheguei a gravar cena às 15 h para ir ao ar no mesmo dia, às 19 h… Isso é muito estressante!”, garante a atriz, que faz artesanato para relaxar e ganhar algum por fora.
Vanessa retornou à Globo em 2001. Antes de “Sabor da Paixão”, fez a minissérie “O Quinto dos Infernos”, de Carlos Lombardi, mas ficou insatisfeita com o papel da interesseira Mariana. “Esperava mais… Minha personagem tinha tudo para ser ótima, mas não aconteceu”, reclama, discretamente.
Trauma infantil
O ano de 2002 será lembrado por Vanessa Lóes como o que ela venceu o medo do palco. Aos 30 anos de idade e sete de carreira, a atriz se esquivava toda vez que a chamavam para fazer teatro. O “trauma” vem de infância. Carioca, filha e neta de atrizes -a mãe, Dilma Lóes, e a avó, Lídia Mattos – a garotinha costumava ficar na coxia durante os espetáculos. “Era tudo grandioso… Os musicais, então, eram um delírio!”, lembra. Mas, nem com bons exemplos na família, a pequena Vanessa conseguia controlar a tensão durante as apresentações anuais de jazz. Ela sempre se perdia no meio da coreografia. “As meninas iam para um lado e eu, para o outro. Até acertar o passo, a vista escurecia e eu me sentia a pior criança do mundo! Morria de vergonha e culpa”, recorda, aos risos, como quem revela um segredo guardado a sete chaves.