Caio Blat quase não acreditou. Ao subir ao palco do Palácio dos Festivais para receber seu segundo Kikito de melhor ator – havia vencido o prêmio no ano passado por “Bróder”, de Jefferson De -, fez um emocionado discurso de agradecimento. Lembrou o Dia dos Pais e agradeceu à mulher, a atriz Maria Ribeiro, pelos dois filhos. Em princípio, pode parecer estranho o prêmio para Caio. No filme de Lúcia Murat, “Uma Longa Viagem”, documentário nas bordas da ficção – ou será o contrário? -, ele lê as cartas do irmão da diretora. Mas não se trata só de um trabalho de voz. Caio realmente criou um personagem. Ele agradeceu a Lúcia pelo trabalho conjunto. Disse que se sentia lisonjeado por integrar a família da diretora.

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“Uma Longa Viagem” foi o grande vencedor de Gramado deste ano, levando também o Kikito de melhor filme na noite de sábado. Mas não foi o que se pode chamar de vitória acachapante. O júri dividiu os três principais prêmios. Gustavo Pizzi foi o melhor diretor, por “Riscado”, e o trio Leonardo Sette, Carlos Fausto e Karumã Kuikuro ficou com o prêmio especial, por “As Hiper Mulheres”, outro filme nas bordas (do documentário e da ficção). Pode-se preferir “As Hiper Mulheres”, ou “Riscado”, discutindo as escolhas estéticas de Lúcia Murat. As texturas que ela imprime à imagem configuram uma estetização, mas ela também pode ser vista como expressão dos estados de espírito do irmão, que lembra, de forma humorada a relação com as drogas nos anos 1960 e 70. A vitória de “Uma Longa Viagem”, de qualquer maneira, não foi nenhum absurdo do júri.

Como “Diário de Uma Busca”, de Flávia Castro, que concorreu no ano passado, “Uma Longa Viagem” escolhe o caminho mais árduo. Para falar da ditadura militar, as duas diretoras escavam na memória pessoal e das próprias famílias. Flávia fala do pai, Lúcia do irmão. Nenhum dos dois foi aquilo que se possa chamar de ‘herói’. Ao receber seu Kikito, Lúcia lembrou que há 22 anos, também em Gramado, havia apresentado seu primeiro longa, “Que Bom Te Ver Viva”, outro documentário ficcionalizado e que já tratava de mulheres que sofreram na pele a repressão dos anos de chumbo. “Uma Longa Viagem” trata de três irmãos, mas se concentra em dois. Lúcia, na primeira pessoa, evoca os anos em que esteve presa (e foi torturada). Ela admitiu que tinha medo – “um medo de rasgar o coração” – de mostrar “Uma Longa Viagem”, por ser demasiado íntimo e pessoal. Caio Blat disse que está convencido que esse é um dos caminhos mais ricos do cinema. Alimentar-se do pessoal é uma forma de fortalecer o universal.

Talvez o fato de Flávia Castro e Jefferson De integrarem o júri brasileiro tenha sido decisivo para as premiações de Lúcia e Caio. É uma conjectura, apenas. A crítica preferiu destacar “Riscado” e o longa de Gustavo Pizzi, além do Kikito de direção, recebeu também mais dois prêmios sólidos – o de melhor atriz, para Karine Teles, mulher do cineasta, e o de melhor roteiro, que ambos assinam conjuntamente. “Riscado” é sobre uma atriz que se interroga sobre suas chances de triunfar na carreira e o papel que o acaso desempenha no reconhecimento. Karine, em seu agradecimento, lembrou que o filme nasceu dela, mas que foi o marido quem teve a energia de viabilizar o projeto.

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Na competição latina, o argentino “Medianeras” foi o grande vitorioso, ganhando nas categorias de filme e direção (Gustavo Taretto). O segundo Kikito foi dividido com o mexicano Sebastian Hiriart, de “A Tiro de Piedra”, que também ganhou o prêmio de melhor ator (Gabino Rodriguez). A melhor atriz foi a colombiana Magarida Rosa de Francisco, por “Garcia”, co-produção com o Brasil. “Medianeras” ganhou o prêmio do júri oficial e do público. O filme estreia em 2 de setembro, com o subtítulo de “Buenos Aires na Era do Amor Virtual”. É uma história encantadora sobre um homem e uma mulher que vivem existências solitárias em minúsculos apartamentos. Ao mesmo tempo que fala de arquitetura, Taretto expõe o processo de aproximação de sua dupla. Há um toque de Woody Allen e que se manifesta principalmente nos diálogos e nas observações humanas e sociais. Os prêmios de curta recaíram (júri oficial e crítica) sobre a animação “Céu, Inferno e Outras Partes do Corpo”, de Rodrigo John. “Um Outro Ensaio”, de Natara Ney, ganhou diversos prêmios, incluindo melhor direção. É ótimo, mas o melhor curta, “A Mula Teimosa e o Controle Remoto”, de Hélio Vilelas Nunes, teria recebido só prêmios menores, não fosse o júri de estudantes. O melhor longa latino, o chileno “La Lección de Pintura”, de Pablo Perelman, também só recebeu prêmios secundários. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Vencedores

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Mostra brasileira:

Melhor filme – “Uma Longa Viagem”

Melhor diretor – Gustavo Pizzi

Melhor roteiro – Gustavo Pizzi e Karine Teles

Melhor ator – Caio Blat

Melhor atriz – Karine Teles

Prêmio Especial do Júri – “As Hiper Mulheres”

Mostra latina:

Melhor filme – “Medianeras”

Melhor diretor – Gustavo Taretto e Sebastián Hiriart

Melhor ator – Gabino Rodriguez

Melhor atriz – Margarida Rosa de Francisco

Mostra de curtas:

Melhor filme – “Céu, Inferno e Outras Partes do Corpo”

Melhor direção – Natara Ney

Prêmios da crítica:

Melhor filme brasileiro – “Riscado”

Melhor filme latino – “Jean Gentil”

Melhor curta – “Céu, Inferno e Outras Partes do Corpo”