A imagem era quase surreal: instalado precariamente numa pequena sala (abarrotada) do curso de pós-graduação em Cinema da Universidade Tuiuti do Paraná, envergando terno branco, camisa azul-clara e inacreditáveis meias roxas, no último sábado um senhor de ar bonachão e barbas brancas conversava em inglês com os alunos: era Francis Ford Coppola, diretor de Apocalipse Now, da trilogia O Poderoso Chefão e de Drácula de Bram Stoker, vencedor de 5 Oscar. Ele está em Curitiba desde a última quinta.
O cineasta está percorrendo diversas cidades brasileiras, colhendo informações para a sua próxima produção – Megalopolis, uma espécie de antevisão “não-fantasiosa” das grandes cidades no futuro – e foi convidado pelo ex-governador Jaime Lerner para conhecer Curitiba. Ele deve ficar até sábado, quando embarca para Foz do Iguaçu, e depois segue para capitais do nordeste e da região Norte. O convite para a palestra na Tuiuti partiu da professora Denise Araújo, coordenadora do curso, que enviou um e-mail ao cineasta. “Para minha surpresa, ele aceitou”, comemora.
O roteiro de Megalopolis deve ter como protagonista um arquiteto ou urbanista que se questiona como as cidades serão no futuro, e o que fazer para melhorar a qualidade de vida. E Coppola gostou do pouco que viu até agora em Curitiba – elogiou a arquitetura, os parques e os cartões-postais: “Na Rua das Flores você encontra todo tipo de gente, é uma rua charmosa e as coisas parecem muito baratas” (pelo menos para quem ganha dezenas de milhões de dólares). E não perdeu a chance de jogar confete no anfitrião: “Tenho paixão por pessoas capazes de contruir coisas interessantes, ousadas e que trazem bem estar para as pessoas, como faz o Jaime Lerner”. A única coisa “feia” que o cineasta diz ter visto na cidade foram as “pichações deliberadas”, e a ausência de policiais.
A idéia do filme germinou ao longo desses cinco anos longe das telas (seu último filme, O Homem que Fazia Chover, é de 1997), em que Coppola diz ter dado uma de “filósofo”: “Minha maior ocupação era assistir aos noticiários da CNN e ler os jornais, para chegar à conclusão do quanto somos bombardeados pela mídia com notícias ruins e anúncios. Não precisamos comprar tantas coisas assim”. Então ele enumerou o que considera a “chave da felicidade”: “Primeiro a criatividade, depois a vontade de se aperfeiçoar, a qualidade de vida e a capacidade de socializar-se – divertir-se, enfim”. E as cidades do futuro devem oferecer condições para que seus habitantes persigam esse “receituário”.
Business
Coppola também aproveitou a deixa da platéia de estudantes para criticar a indústria da qual faz parte: “Hoje existem sete grandes companhias que só produzem filmes capazes de gerar dinheiro, com grandes astros e orçamentos estratosféricos. São os estúdios que fazem os Batman, Spiderman, X-Man, Thisman da vida, filmes sem risco que geram bilheterias milionárias. E a arte sempre envolve algum tipo de risco”, emendou, confessando que, se dependesse dele, não teria feito nem o segundo O Poderoso Chefão.
Coruja
Mostrou-se ainda um pai coruja ao elogiar várias vezes a filha Sofia Coppola, diretora de Virgens Suicidas, a quem destacou como um dos nomes promissores da nova geração de diretores. Entre os cineastas de quem se admirador, estão Michelangelo Antonioni, Bernardo Bertolucci, Françoise Truffaut, Fellini e outros.
Da filmografia brazuca, limitou-se a dizer que viu Central do Brasil e a produção inacabada Chatô, projeto eterno de Guilherme Fontes, além de se dizer amigo de Glauber Rocha.
Do jeito que Francis Ford Coppola elogiou Curitiba, se não estava jogando para a platéia, não será surpresa nenhuma se Megalopolis contar com uma réplica da Ópera de Arame…
