Uma beleza estranha

Quando aquela orquestra com quarenta músicos começa a atacar os acordes iniciais de um ‘medley’ de sucessos de Frank Sinatra, você começa a se sentir estranho. Olha para o lado, nota claramente os telefones celulares modernos a tirarem fotos e gravarem vídeos. Volta para a frente e a turma, em alto nível, manda o arranjo de Nelson Riddle para Old Devil Moon. Coça os olhos, como se tentasse entender o que está acontecendo, olha de novo para o lado e nota que realmente está no moderníssimo – e novo – teatro Positivo. Mas a orquestra segue ali, tocando agora, como se fosse no LP, a introdução de All The Way.

Sua cabeça está prestes a fundir quando, abruptamente, a banda pára e só se ouve o som do baixo tocando um blues. Aí você se acalma – afinal, está em Curitiba, e é 2 de agosto de 2008. Mas volta a ser São Paulo, 1981, no 150 Night Club, quando você vê um sujeito sessentão vindo de perfil, meio gordinho, cabelos brancos com uma falha no ‘cocuruto’ e de smoking cantando os versos iniciais de Lonesome Road. Demora um pouco, só no momento em que a canção exige mais do cantor, para perceber – ufa! – que o tempo não voltou, e que você está em uma apresentação de Frank Sinatra Jr., a única dele em Curitiba da sua turnê pelo Brasil.

Assistir ao filho do maior cantor de todos os tempos traz uma sensação diferente, como se fosse uma beleza estranha. É tudo muito bom: Sinatrinha melhorou muito como cantor, os músicos que vieram com ele dos Estados Unidos são ótimos (todos integrantes da antiga banda de Frank Sinatra), os músicos locais – recrutados em Curitiba – são excepcionais. Mas, em contrapartida, é estranho porque é um show de um cantor que já morreu. Frank Jr. está ali para homenagear o pai, só que a coisa fica tão parecida que é quase igual, e isso assusta. É praticamente uma ‘sessão espírita’.

Isto porque, deliberadamente, os arranjos são todos iguais aos dos álbuns – estes estavam sob custódia de Sinatrinha, que foi o diretor musical do pai nos últimos dez anos de carreira da Voz. Ouvir as versões do show Sinatra by Sinatra é ouvir uma série de canções praticamente originais, a maioria delas sucessos, como I’ve Got You Under My Skin, Come Fly With Me, Strangers In The Night, New York, New York e My Way. Mas também algumas faixas esquecidas do repertório de Sinatra, como Let’s Fall In Love e Swinging In The Stars. E músicas do álbum com Tom Jobim, como Dindi, Once I Loved e Baubles, Bangles and Beads.

Todas muitíssimo bem executadas, mas que mais emulam o espírito de Frank Sinatra e que não valorizam a presença de Frank Sinatra Jr., que reconhecidamente não tem o carisma e a voz do pai, o que notadamente se percebeu em canções que requeriam mais alcance, como Under My Skin, I Wished On a Moon e The Way You Look Tonight. Aí não se sabe se deliberadamente ou não, o cantor se esconde atrás da memória e acaba não aparecendo – é como se fosse um imenso karaokê ao vivo, uma brincadeira em que só o filho pode usar o presente que o pai lhe deu.

Mas, por conta da beleza das canções, da extrema correção de Sinatrinha como cantor, do sensacional trabalho da orquestra e do respeito com os arranjos originais (Claus Ogerman adoraria ouvir, Don Costa e Nelson Riddle aplaudem lá do céu), o show Sinatra by Sinatra é ótimo. É uma raríssima chance de ver e ouvir ao vivo algumas das grandes músicas do século passado. Só por isso já valeria a pena.

Vazio

Não há explicação para que o show de Frank Sinatra Jr., sábado passado, em Curitiba, tenha recebido apenas meia casa – todas as poltronas laterais estavam vazias e os camarotes desertos. Ou, melhor, há duas razões possíveis. A primeira: o preço dos ingressos, R$ 140,00 o mais barato. A segunda: talvez não haja mais demanda para um espetáculo desses por aqui. É só lembrar que Roberto Carlos só vem para shows gratuitos e Julio Iglesias se apresentou em um clube. Agora, Sinatrinha canta para no máximo 1.200 pessoas. Será que é isso?

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