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Um godê de luzes para Aline Santini

Assim que a assistente de iluminação Aline Santini desligou o telefone, ela começou a chorar. E não era de emoção, por ter aceitado uma ótima proposta. Na verdade, era por ter negado o convite para trabalhar como assistente no Hamlet (2008) de Aderbal Freire Filho. A atitude nada tinha a ver com excesso de trabalho ou luxo: Aline não buscava seu lugar ao sol, mas desejava criar as próprias luzes. “Eu não tinha certeza se era a decisão certa na minha carreira, mas sabia que queria começar os meus próprios trabalhos.”

Formada aos pés de mestres como o iluminador Wagner Pinto e o diretor Gerald Thomas, a artista aprendeu como o rigor técnico pode gerar montagens como Deus Ex-Maquina (2001) e Um Circo de Rins e Fígados (2005), de Thomas, e A Casa dos Budas Ditosos (2004), de Domingos Oliveira. Mais tarde, ficou durante cinco anos na iluminação de Terça Insana, já como iluminadora. “Não se faz comédia com luz dramática”, diz Aline, recordando os conselhos da atriz e diretora de Grace Gianoukas.

Hoje, a iluminadora acumula sua terceira indicação para o Prêmio Shell por Cabras – Cabeças que Voam Cabeças que Rolam, espetáculo da Cia. Teatro Balagan. “Você melhorou o meu cenário”, foi o que o cenógrafo Marcio Medina disse para ela. “Era um espaço único, e ainda tinha uma claraboia”, explica sobre o anexo da Sala Adoniram Barbosa no Centro Cultural São Paulo. “Coloquei refletores do lado de fora e dois técnicos para que cuidassem dos equipamento. O céu se abria sobre o espetáculo.”

Antes disso, o bombardeio entre as duas Grandes Guerras foi tema do espetáculo-documentário As Estrelas Cadentes do Meu Céu São Feitas de Bombas do Inimigo (2013), de Nelson Baskerville, com quem Aline compartilhou a concepção de luz e foi indicada pela primeira vez. A segunda foi com a atual e frutífera experiência com o diretor Eric Lenate, com quem estreou, em 2015, Ludwig e Suas Irmãs. Em seguida, com o mesmo encenador, a iluminadora ambientou a assepsia tecnológica de O Teste de Turing, texto de Paulo Santoro que põe a humanidade à prova de uma inteligência artificial. “Penso na iluminação como uma grande história, e existem diversos modos de contá-la.”

Atualmente, Aline segue em cartaz em O Término do Amor, no Viga Espaço Cênico, às terças, quartas e quintas, e no colorido contraste de Mantenha Fora do Alcance do Bebê, que vai até setembro no Teatro Porto Seguro.

A montagem de Lenate e texto de Silvia Gomez descreve uma alucinada conversa entre uma assistente social e uma mulher que deseja adotar uma criança. O obsessivo diálogo ainda dá espaço para o marido da entrevistada e um lobo misterioso e nada selvagem. Com tantos elementos em cena, a aposta de Aline foi dar um descanso ao olhar do espectador, empregando uma paleta que vai do azul claro ao branco, depois ao verde, se estendendo para o laranja e o lilás. Ela conta que boa parte das ideias de Bebê, como carinhosamente chama a peça, surgiu durante os ensaios de Ludwig e Suas Irmãs. “Havia um experimento de cores e percebemos que algumas eram mais particulares para cada uma das peças.” No palco, o cenário do escritório desliza sob rodízios, acoplados a uma iluminação de LED. O conjunto é movimentado pelo lobo de Diego Dac. “Foi uma forma de criar molduras, que se juntavam às cores.”

E nessas pinturas luminosas de Aline, tudo pode formar uma obra. Mas nem tudo deve estar presente no mesmo espaço-tempo. O LED é um deles. “É uma luz que denuncia o tempo do agora, dada sua criação recente. Se o objetivo é instaurar outro tempo na peça, não vai servir.” Mas a iluminadora tem suas predileções – os contrastes. A última cena de Bebê foi sugerida no desenho feito pela dramaturga. O traços que descreviam três sujeitos de mãos dadas foram concretizados nas atuações de Débora Falabella, Anapaula Csernik e Jorge Emil.

O mesmo contraste ocorreu em Vendo Gritos e Palavras, do Teatro Essencial de Denise Stoklos. “Enquanto ela ensaiava, eu só pensava em como dar mais atenção para todos aqueles gestos”, conta, sobre as silhuetas formada pelos movimentos da atriz. E para quem deseja, futuramente, experimentar a imaterialidade dos hologramas no palco, Aline defende que antes é preciso entender de presença. “Não se faz teatro sozinho.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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