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‘Um Berço de Pedra’ capta a dor de mães em zonas de conflito

“Minhas roupas estão salgadas de tanto mar e travessias; pesam. Oceanos de crianças mortas que as ondas devolvem na orla. As ondas urram de dor nas pedras. As ondas estão gritando na língua dos rochedos. Para esconder o grito de alguma mãe.”

Não é preciso imagem que ilustre esse texto. Todavia, é impossível não recordar da foto feita no ano passado que retratava o corpo do pequenino Alan Kurdi, menino sírio encontrado morto em uma praia da Turquia, no auge da crise migratória. Nesta sexta, 30, o espetáculo Um Berço de Pedra, estreia com a pendência de que não há um nome que possa definir a mãe de Kurdi. “Existe a palavra viúvo, quando se perde o cônjuge, e órfão, quando os pais morrem, mas ainda não conseguiram inventar uma para a mãe que vê o filho morrer”, conta a atriz Cristina Cavalcanti.

A peça de Newton Moreno é uma reunião de cinco textos curtos com um fio condutor direcionado para o ventre, explica o diretor William Pereira. “Inicialmente, não eram escritos feitos para a cena, a poesia presente os uniu ao suscitar o olhar da mulher para o seu corpo e a maternidade.”

No palco, a atriz Débora Duboc encabeça o texto que dá nome ao espetáculo. Ela também atravessa, em momentos decisivos, as outras narrativas. “Sou como uma narradora, que participa e observa cada história.”

Em um palco soterrado por areia, O Canteiro abre a montagem trazendo o sofrimento de uma mãe que busca o filho desaparecido nos tempos da ditadura. Em seguida, há a inquietação de Caminho do Milagre, que expõe o diálogo entre uma mulher vítima de estupro e o criminoso, interpretado por Eucir de Souza. “Newton organiza situações presentes na realidade brasileira de uma maneira inquietante”, ressalta o diretor.

As atrizes Lilian Blanc, Luciana Lyra e Agnes Zuliani encaram “o assassinato político” de uma Medeia nordestina, uma mãe que busca vender o filho e uma grávida que mora numa zona de conflito. “Elas estão em guerra com seus corpos e com o caos que acontece no mundo. Não há descanso para elas”, aponta ainda Agnes.

A força da palavra deve ser o foco do espetáculo, pontua Pereira. “Temos relatos muito fortes e esse estado trágico que elas carregam ganha vida quando compartilhado.” Lilian diz que é preciso estar com os ouvidos abertos para receber as palavras. “A cada frase, muitas imagens são criadas. Nossa interpretação vai no sentido de concretizar esse universo doloroso e igualmente belo.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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