A Turma da Mônica chegou aos morros e conquistou as redes sociais nestes últimos dias. O quadrinista Gabriel Jardim, de 24 anos, publicou em seu Twitter uma releitura dos principais personagens de Mauricio de Sousa – Mônica, Magali, Cebolinha e Cascão -, em que cada um representa um perfil de jovem da periferia.

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O desenhista se baseou em alguns artistas na hora de fazer a arte e alterou os nomes dos personagens. A protagonista Monicat foi inspirada numa pose da Anitta; Maga Li tem traços da MC Pocahontas; MC Cascão lembra o estilo despojado do cantor MC Guimê; e o DJ Cebola faz alusão ao DJ Kalfani, filho do KL Jay, integrante dos Racionais MC’s.

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“Coloquei as músicas deles para entrar no clima enquanto produzia. É viciante. Não consigo parar de ouvir para desenhar”, conta.

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As obras retratam o entretenimento da juventude que vive longe dos grandes centros – como os bailes funk e o futebol de rua -, mas também mostram o dia a dia dessas pessoas. Em uma das ilustrações, por exemplo, DJ Cebola aparece como um entregador de pizza no fim do expediente.

Na comunidade criada pelo artista, MC Cascão joga bola usando uma camiseta do Emicida. Monicat e Maga Li, que são amigas na versão original, aparecem tomando sol de biquíni na laje enquanto comentam a foto de perfil do Cascão nas redes sociais.

Na história oficial de Mauricio de Sousa, Cebolinha é palmeirense e Cascão torce para o Corinthians. Assim, Gabriel Jardim decidiu apresentá-los com símbolos dos times, e planeja ilustrar essa questão mais vezes. “Pretendo desenhá-los passeando juntos e unidos para incentivar a paz no futebol”, afirma.

Continuidade e inspiração

Jardim conta que suas referências foram o youtuber Gil Santos e o ilustrador Wagner Loud, que lançaram um projeto que transforma cantores do rap nacional em personagens de HQs. Além deles, tem também o desenhista Picolo, que faz releituras dos Jovens Titãs vivendo a adolescência.

Gabriel já fez oito publicações da Turma do Morro e anseia continuar. Ele postará em seu Instagram um desenho da Monicat, Maga Li, DJ Cebola e MC Cascão juntos, vai fazer releituras de outras figuras do cartum e já adianta que nem todos serão relacionados ao funk ou ao rap. “A cultura brasileira é muito diversificada para ficar preso só a dois gêneros”, explica.

Ele pensa em transformar Chico Bento em um cantor de sertanejo universitário e relacionar o Do Contra com a cena underground. Além disso, ele destaca que criará histórias que mostrem os personagens reunidos, vivenciando momentos de autoestima e companheirismo.

“Desmoralizar é cegueira e falta de conhecimento”

Gabriel explica que decidiu montar os quadrinhos por uma questão de representatividade e para unir dois ícones da cultura brasileira: a Turma da Mônica e o funk.

O cartunista analisa que a produção hegemônica de HQs não retrata a realidade do Brasil. “Já existem iniciativas periféricas interessantes, mas ainda não se comparam as grandes produções”, afirma.

Segundo ele, é necessário mostrar ainda mais o olhar do funkeiro, do rapper, do pobre, dos negros e de quem vive o cotidiano das periferias. “Só não enxerga esse mundo quem não quer, e existe uma visão muito estereotipada sobre o que é a favela. Por isso quis contribuir um pouco com a minha arte”, diz.

A visão de Jardim sobre a relevância dessa cultura é confirmada por números. A pesquisa Perfil dos Municípios Brasileiros (Munic) de 2017, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), alerta que 11,4 milhões de brasileiros vivem, hoje, em periferias – o que daria quase toda a população da cidade de São Paulo (12 milhões de habitantes), a mais populosa do País.

Além disso, o funk cresceu em mais de 4000% no Brasil e no resto do mundo desde 2016, segundo o Spotify.

Gabriel aponta que um dos quadrinistas que demonstra a complexidade histórica desses dados é Marcelo D’Salete, ilustrador que venceu o Prêmio Jabuti 2018 e o Prêmio Eisner com seus quadrinhos sobre a luta da população negra escravizada.

Consciente da importância de se debater o tema, o criador da Turma do Morro planeja lançar gibis sobre cultura africana e não hesita em criticar os preconceituosos: “desmoralizar esse tipo de trabalho é cegueira e falta de conhecimento”.