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‘Travessia’ e ‘Clube da Esquina’ fazem aniversário neste ano

Quando Milton Nascimento conquistou o segundo lugar do Festival Internacional da Canção com Travessia, em outubro de 1967, a música brasileira estava rachada. Naquele mesmo mês, em outro festival, promovido pela TV Record, Caetano Veloso e Gilberto Gil plantaram as sementes da Tropicália com Alegria, Alegria e Domingo no Parque, estabelecendo tensões com colegas que queriam distância da guitarra elétrica, em nome de um som brasileiro e autêntico.

Milton havia jurado nunca mais participar de festival. Estava decepcionado com o clima de competitividade que viu nos bastidores do festival da TV Excelsior em 1965, quando defendeu Cidade Vazia, de Baden Powell e Lula Freire. O cantor Agostinho dos Santos, que lhe deu apoio em São Paulo quando Milton pensava em voltar a Minas, pediu três músicas para seu próximo disco. À revelia do compositor, Agostinho as inscreveu no FIC. Todas foram classificadas e ele foi apresentá-las para 20 mil pessoas no ginásio do Maracanãzinho.

Com Travessia, Morro Velho e Maria Minha Fé, Milton conquista admiradores dos dois polos. Quase 50 anos depois, o compositor se recorda do clima de embate e diz que o fato de unir turmas esteticamente distintas em torno dele tem a ver com sua abertura a qualquer tipo de música. “No festival, todo mundo estava achando que eu fazia uma música diferente, e eu nem achava que era tão diferente assim, porque era algo que já estava dentro de mim.” A fusão de estilos vem de múltiplas influências, dos discos do pai, Seu Josino, à necessidade de tocar de tudo nos bailes da vida. E daí surge Miles Davis.

Milton conheceu a obra do trompetista depois de se mudar para Belo Horizonte, no início dos anos 1960. O interesse por Miles permanece até hoje. Durante a entrevista ao Estado, o vinil do álbum Someday My Prince Will Come (1961), estava à vista na sala de estar, embaixo do aparelho de som. “Miles mexeu demais comigo. Fui à casa de uns amigos músicos e lá o ouvi pela primeira vez. Quando escutei aquilo, falei com o pessoal que aquilo não era um trompete, era a minha voz. Até achei que eles iriam rir de mim, mas não riram. Acharam que eu estava certo e a partir daí eu me liguei mais no jazz”, relembra.

Seu primeiro álbum, gravado depois do festival, também completa 50 anos. A compositora Geni Marcondes pontua na contracapa. “Havia dois grupos inconciliáveis: aquele, remanescente da fase bossa nova, de rico balanço e rica harmonia, mas inteiramente fechado às características da música rural, por julgá-la pobre e obsoleta. O outro, herdeiro daquela velha linha dos sertanejos, também invulnerável às conquistas da bossa nova, apregoando uma fidelidade um pouco ingênua aos ritmos e modos regionais (…). Com Milton Nascimento, uma ponte se estendeu promissora entre os dois grupos até então antagônicos.” Milton escolheu o Tamba 4, formação ampliada do Tamba Trio do pianista Luiz Eça, para acompanhá-lo.

As pontes que o primeiro disco estabeleceu dão outros frutos cinco anos depois com o lançamento de Clube da Esquina. Depois de reencontrar Lô Borges, irmão de seu parceiro Márcio, em uma visita a Belo Horizonte, Milton decide fazer um disco com ele. Lô era um beatlemaníaco fanático e pede para levar um amigo chamado Beto Guedes.

O álbum, lançado há 45 anos, é um dos clássicos da música brasileira. Milton diz que até hoje não sabe dizer por que os fãs têm um carinho especial por ele. “Aquilo foi uma coisa importante para gente porque era um disco de turma. Sempre que vou em algum lugar, alguém fala desse disco com carinho. O Wagner (Tiso) e o Eumir (Deodato), que fizeram os arranjos, misturaram tudo. Rock com jazz, samba com as coisas do Lô, tudo podia. O Clube tem muito a ver com o que acontece na música dos outros países, onde ninguém impõe diferença de estilos. Mas o que eu gosto mesmo é que esse disco fez com que a amizade com Lô ficasse para sempre.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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