Thiago Lacerda interpreta quem ele considera ser o último herói romântico

Bastam poucos minutos diante de Thiago Lacerda para se perceber que ele é um ator “possuído” pelo personagem que interpreta. De fato, os olhos verdes radiantes e a emoção com que fala de Giuseppe Garibaldi – seu papel em “A Casa das Sete Mulheres”, de Walter Negrão e Maria Adelaide Amaral – chegam a surpreender. Thiago não faz gênero quando diz que o revolucionário italiano é o personagem de sua vida.

Na verdade, desde que interpretou o Matteo de “Terra Nostra”, em 99, o ator vem dedicando-se a pesquisar, por conta própria, a vida de Garibaldi – idealista que lutou na Guerra dos Farrapos e, mais tarde, unificou a Itália. “Ele é grandioso. É o último herói romântico da História. Tinha certeza de que um dia o viveria”, conta o ator que, ao longo de quatro anos, importou diversos livros e leu tudo que encontrou sobre Garibaldi.

Diante de tamanha paixão, seria natural que Thiago tivesse procurado o diretor da minissérie, Jayme Monjardim, e se oferecido para o papel. Mas não foi preciso. Sem fazer idéia do interesse prévio do ator, Jayme só conseguia pensar em Thiago Lacerda para encarnar Garibaldi. “Quando contei para ele o que esse cara representa para mim e tudo que já sabia da sua história, o Jayme quase caiu da cadeira”, lembra o ator, que diz não ter dúvidas: “Alguém soprou meu nome para o papel”.

Para compor o herói, Thiago treinou montaria e artes de guerra, como ensaios com lanças, espadas, facas e garruchas. “No fim do dia o corpo ficava um farrapo, sem trocadilho”, brinca. Boa parte das cenas de ação de Garibaldi se passam em cima de um cavalo. Para fazer bonito, o ator não dispensou os conselhos de Fernando Zandonai, um gaúcho criador de cavalos, convocado por Jayme para dar assistência ao elenco. Thiago – que praticou equitação clássica para “O Beijo do Vampiro” – ouviu de cara que precisava esquecer a postura “certinha”: “Ele riu de mim e disse: ?Bá, olha como tu anda…! Assim, bonitinho, tu não aguenta um dia no lombo, tché!”, diverte-se o ator que, atualmente, chega a dispensar dublês em seqüências perigosas. “Gosto de sentir a adrenalina no corpo. Ela faz parte do espírito do Garibaldi”, justifica.

Giuseppe Garibaldi vem da Europa e adere à causa dos farrapos que, em 1835, exigiam a independência do Rio Grande do Sul. Depois de viver um romance proibido com a sonhadora Manuela -interpretada por Camila Morgado – ele se apaixona por Anita – personagem de Giovanna Antonelli , uma mulher casada que abandona tudo para lutar ao seu lado na guerra. Thiago não se preocupa com o fato de viver outro italiano, depois do Matteo – que o alçou ao posto de galã, em 99. A exemplo do que já vem demonstrando, seu Garibaldi não deve derrapar em manjadas expressões da língua italiana. Pelo menos é o que promete o ator – no que parece estar amparado pelos autores da minissérie. “Ele é um cara objetivo. Não fala ?Amore mio?, ?Dio santo!?, ?Io te voglio benne?…”, enumera, em alusão ao “portuliano” açucarado de novelas como “Terra Nostra” e “Esperança”.

Para compor o personagem, contudo, Thiago investiu na pesquisa histórica. “Acho que li tudo que já foi escrito sobre Garibaldi. E o que não foi, ainda vou ler um dia”, exagera o ator – capaz de descrever, com riqueza de detalhes, toda a trajetória do herói. Contraditoriamente, é esse conhecimento histórico aprofundado que vem lhe trazendo as maiores dificuldades em cena. Como pesquisa de longa data a vida de Garibaldi, Thiago já tem uma concepção formada sobre ele. Mas a minissérie é uma obra sujeita a licenças poéticas. E o ator precisa conciliar a própria imagem que tem do herói com aquela criada no texto de Maria Adelaide e Walter Negrão. Um exemplo é a passagem da minissérie em que o revolucionário pede a um padre para benzer uma medalhinha. “Tenho relatos de que Garibaldi execrava a Igreja. Levei semanas para descobrir como fazer esta cena, sem trair a personalidade histórica”, relata o ator, para quem a mistura do Garibaldi histórico e do fictício é o que vem criando a “bossa” do personagem.

Um toque do além

Thiago Lacerda não tem dúvidas. O espírito de Giuseppe Garibaldi vem acompanhando de perto o trabalho de produção da minissérie. Às vezes, até, interferindo nas gravações. Só assim o ator consegue explicar, por exemplo, a tempestade repentina que surpreendeu a equipe durante a reconstituição de um fato histórico: a travessia, por terra, de dois enormes barcos de ferro, construídos para tomar Laguna, em Santa Catarina. Sob o comando de Garibaldi, os revolucionários levaram nove dias para atravessar os barcos Seival e Farroupilha, puxados por bois em terreno arenoso e sob intenso temporal. O episódio – ocorrido em 1839 – foi considerado o maior feito da Guerra dos Farrapos.

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