“É como um continente a ser descoberto”, diz a diretora Ariane Mnouchkine sobre suas peças. “Há pessoas que se lançaram ao mar dizendo que iam descobrir um continente e, depois, em vez de encontrarem a Índia, descobriram a América. Tenho a impressão de que, quando partimos para uma obra, partimos para aventura.” E foi perdendo-se em águas desconhecidas que ela concebeu “Náufragos da Louca Esperança”.

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A produção, que abre a turnê brasileira nesta quarta, em São Paulo, surgiu justamente quando a trupe se desviou do caminho traçado. A diretora havia proposto uma incursão pelos clássicos. Era um meio de sair do universo de pequenas histórias pessoais e reencontrar o épico – território no qual o mítico grupo francês sempre se mostrou mais à vontade. “Ariane queria um clássico. Pegou Shakespeare, para começar a traduzir”, conta a atriz Juliana Carneiro da Cunha, única brasileira a integrar o elenco. No meio desse caminho, contudo, apareceu uma banquinha de livros à beira do Sena, um volume quase desconhecido de Júlio Verne. E ela corrigiu a rota imediatamente.

Obra obscura e póstuma de Verne, Os Náufragos do Jonathan serve de esteio para o novo espetáculo. É da história das vítimas de um naufrágio que o Soleil tirou o pretexto para falar de utopia e transformação. “Meu país atravessa hoje uma grave crise moral e política. Mas ainda existe, na França e no Brasil, gente verdadeiramente louca para falar em mudar o mundo”, disse Ariane Mnouchkine.

O livro de Verne relata a saga de pessoas que, no fim do século 19, deixam a Costa Oeste dos Estados Unidos rumo à África, em busca de vida nova. Um acidente com o barco, porém, leva-os a uma ilha da América do Sul. Um lugar desabitado, longe dos ditames vigentes, onde terão a chance de criar uma “sociedade ideal”: sem classes e com novos valores.

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“Há quem diga que Júlio Verne era um reacionário. Mas ele foi um aventureiro profético, tanto no sentido político quanto científico. Não podemos esquecer que ele viveu em uma época em que muitas teorias importantes estavam surgindo. Na época de Freud e Marx”, diz a encenadora. Com isso, sugere quão contemporânea pode ser a fábula sobre uma civilização que precisa se reinventar.

“Em Náufragos da Louca Esperança”, outros elementos surgem para ampliar as perspectivas. O público não acompanha a trajetória dos sobreviventes do navio, mas um grupo de pessoas que resolve fazer um filme sobre esse episódio. Os atores do Soleil interpretam, portanto, cineastas. Nem por isso, alerta Ariane, o que se vê no palco se apropria da linguagem cinematográfica. “É um espetáculo sobre a aventura de fazer cinema. Mas é teatro.” As informações são do Jornal da Tarde.

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Os Náufragos da Louca Esperança – Sesc Belenzinho (R. Padre Adelino, 1.000). Tel. (011) 2076-9700. Quarta a dom., 19 h. Até 23/10. R$ 50 (esgotados).