Sul-africano ganha o Nobel de Literatura

Rio de Janeiro – O Nobel de Literatura de 2003 não surpreendeu: o ganhador foi o sul-africano John Maxwell Coetzee, de 63 anos, há anos cotado para receber o prêmio – e o primeiro a receber duas vezes o prestigiado Booker Prize -em 1983, por Vida e época de Michael K, e em 1999, por Desonra, ambos editados no Brasil.

De origem anglo-germânica, Coetzee foi criado em colégios ingleses e faz parte da minoria branca da África do Sul. Assim como acontece com Nadime Gordimer, até hoje a única sul-africana (também da minoria branca) agraciada com o Nobel, em 1991, Coetzee tem sua literatura marcada pelos conflitos do apartheid, mas, comparados aos dela, seus escritos são considerados muito menos politicamente corretos.

Segundo a Academia Sueca, o autor tem uma obra variada: “Ele nunca aplica a mesma receita a seus livros, nos quais seus personagens surgem num vórtice, em tribulações que é preciso superar para chegar à redenção. Coetzee é também um cético escrupuloso, impiedoso na sua crítica ao racionalismo cruel e à moral cosmética da civilização ocidental”, destacou a Academia, que iniciou quarta a temporada de anúncio dos ganhadores do Nobel deste ano.

No Brasil, os livros do autor – o quarto africano laureado com o prêmio de dez milhões de coroas suecas (US$ 1,3 milhão) – são editados pela Companhia das Letras desde 1999. Na década de 80, porém, os leitores brasileiros já podiam ler nas edições da Best-Seller a prosa de Coetzee, que obteve reconhecimento da crítica internacional com Esperando pelos Bárbaros, de 1980, de acordo com a Academia um thriller político da linhagem de Joseph Conrad, em que “a candura idealista abre a porta ao horror”, e no qual se pode reconhecer a brutal sociedade separatista da África do Sul da época.

Luiz Schwarcz, editor da Companhia das Letras, considera Desonra um dos melhores livros que já leu na vida. A ação se passa na África do Sul logo após a queda do apart-heid, e conta a história de um professor universitário humilhado por defender sua honra e a de sua filha. “É um dos meus livros favoritos de todos os tempos. E sempre tenho falado que Coetzee é um dos maiores autores de língua inglesa. Na leitura de Desonra, você se sente sufocado, perde a respiração, mas é uma grande experiência estética, tem-se o sentimento de estar diante do melhor da literatura. Temos esse prazer, apesar da angústia”, afirma Schwarcz.

Lançamentos

A Companhia das Letras já tem programado o lançamento de mais três obras de Coetzee, duas possivelmente este ano: Elizabeth Costello, seu último livro, que chegou às livrarias dos Estados Unidos no mês passado, e O Mestre de São Petersburgo, no qual faz uma paráfrase da vida e do universo romanesco de Dostoiévski. O escritor é avesso a aparições públicas – ele se recusou a participar das cerimônias do Booker Prize nas duas vezes em que foi premiado. Segundo o editor da Companhia, foi um dos autores que os organizadores do Festival Literário de Paraty queriam muito ter trazido ao Brasil no início de agosto, o que, segundo ele, quase teria acontecido.

Coetzee muitas vezes é comparado a Franz Kafka, como voltou a destacar Stephen Watson, diretor do departamento de língua inglesa da Universidade da Cidade do Cabo, colega de Coetzee por 30 anos. No ano passado, o escritor, que tem uma filha, deu aulas em Adelaide, na Austrália, e no momento está nos EUA. No ano que vem, a Companhia editará no Brasil Youth (Juventude), a continuação de Boyhood, suas memórias de infância.

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