O compositor e o silêncio assustador. O verso que não vem à mente, foge da mão com a caneta, escapa pelos dentes antes de formar a canção. O músico, poeta e compositor recifense Siba Veloso se viu diante do bloqueio há cinco anos. Entre trancos e barrancos, conseguiu seguir adiante. Da insegurança veio o disco “Avante”, lançado com patrocínio da Petrobras e apresentado hoje e amanhã, no teatro do Sesc Vila Mariana.
Ele, que já havia trabalhado como líder do Mestre Ambrósio, com sua rabeca, e depois tido uma proveitosa experiência liderando a banda Fuloresta por dois discos, se viu diante de mudanças na sua vida que afetavam seu íntimo como compositor. “Tudo foi ficando tão diferente, que me perdi. Foi um processo longo me encontrar”, diz o músico, em vias de completar 43 anos.
Tudo culminou no fim da gravação de “Toda Vez Que Eu Dou Um Passo o Mundo Sai do Lugar”, segundo disco do Fuloresta carregado de música nordestina, cujo auge foi a indicação ao Grammy Latino na categoria melhor álbum de música tradicional regional. Siba, que, de 2003 a 2006, viveu em Nazaré da Mata, cidade de cerca de 30 mil habitantes na zona da mata pernambucana, para procurar se aprofundar no maracatu dos cancioneiros locais, já não conseguia se encontrar. “Depois de 2006, comecei a me colocar uma série de questionamentos. Eu tinha uma casa em Nazaré, uma em Recife e uma em São Paulo. Isso me fazia pensar muito e me paralisou.”
Fazer parte do cotidiano da cidade, cantando entre “melhores e piores”, como diz, era sua força motriz de criatividade. “Esse bloqueio estava relacionado ao fato de não eu ter mais esse motor que me levava para frente.” Siba precisou parar. E olhar para dentro.
Ali, na escuridão interior, redescobriu-se. Viu no afago do filho, Vicente, hoje de cinco anos, e no reencontro com a guitarra como um instrumento para a criação, formas de retomar o processo de fazer música que havia perdido. Junto a isso, Siba cita dois músicos com diferentes características que o ajudaram nessa jornada: Lirinha, ex-Cordel do Fogo Encantado, e Fernando Catatau, guitarrista líder do Cidadão Instigado. O papel de Lirinha, conta Siba, foi o de um aliado, um confidente, amigo com quem ele pôde dividir suas inseguranças. Ambos caminhavam para essa libertação, gravando discos simultaneamente – “Lira”, primeiro álbum solo de Lirinha, saiu no fim de 2011. “Acho que sempre fomos complementares e opostos. Lirinha nasceu no meio do cancioneiro popular e fez um movimento para sair dele. Eu, por minha vez, quis me inserir nesse movimento aos 20 anos.”
Juntos, entoam versos que melhor traduzem a crise do silêncio em “Verso Preso”, canção curtinha: “Um Verso preso é um tiro que a arma não disparou/Pois o gatilho emperrou e o tambor não deu o giro/Só escuto o suspiro de alguém que escapou assombrado/E o atirador, frustrado, remói a raiva no dente/Sentindo o mesmo que sente alguém que foi baleado.” A canção vem depois de “Mute”, ainda menor, instrumental, como a materialização do silêncio. A música sem letra.
Vicente é mais presente do que parece. Está na capa do álbum, nas costas do pai, que empunha uma guitarra que ganhou do seu pai, aos 16 anos. Na imagem, o círculo da vida. Filho – coincidentemente, segundo Siba – é a última palavra de “Avante”. E, talvez, sua maior explicação e razão de existência. Graças a ele, a batalha contra o silêncio foi vencida. As informações são do Jornal da Tarde.
Siba Veloso – Sesc Vila Mariana (Rua Pelotas, 141). Tel. (011) 5080-3000. Hoje e amanhã, às 21h. Ingressos: R$ 6 a R$ 24.