Quando Afonso Borges criou o Sempre um Papo no longínquo ano de 1986, ele não tinha ideia de que seu projeto seria tão longevo e que cresceria tanto. Hoje, 30 anos depois, a programação iniciada em bares de Belo Horizonte se espalha por diversas cidades brasileiras e a lista de participantes é reforçada sempre que um bom livro é lançado.

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Entre os que já passaram pelos palcos do Sempre um Papo estão Raduan Nassar, José Saramago, Mario Vargas Llosa, Thiago de Mello, Nélida Piñon, Adélia Prado, Mia Couto, Luis Fernando Verissimo, José Eduardo Agualusa, Gonçalo M. Tavares, Moacyr Scliar, Hélio Pelegrino, Carlos Heitor Cony, Chico Buarque, Fernando Morais, Laurentino Gomes e até Jostein Gaarder (de O Mundo de Sofia). Alguns desses escritores foram escalados para voltar neste ano de festa.

Luis Fernando Verissimo, cronista do Caderno 2, do jornal O Estado de S.Paulo, por exemplo, abre a agenda paulistana do evento, que já ocorre há 12 anos, nesta terça-feira, 15, no Sesc Bom Retiro – até o ano passado, o Sempre um Papo era realizado na unidade da Vila Mariana. A partir das 19h30, Verissimo conversa com o público sobre seu mais recente livro – As Mentiras Que As Mulheres Contam (Objetiva). Na sequência, ele autografa a obra. A entrada é sempre gratuita.

E por que abrir as comemorações com Verissimo? “Simples. Ele e Zuenir Ventura são as vozes mais lúcidas do Brasil, na crônica e na qualidade de texto”, responde Borges. Neste primeiro semestre, outros grandes nomes da literatura brasileira se revezam no palco, em São Paulo: Adélia Prado (abril), Lira Neto (maio), Marina Colasanti (junho) e Nélida Piñon (julho). Já em Belo Horizonte, Afonso reúne, em abril, Leonardo Boff, Frei Betto e Mario Sérgio Cortella. Eles vão falar sobre o livro Felicidade Foi-se Embora? (Vozes).

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Ao falar sobre a origem do projeto, Afonso Borges relembra que ele surgiu pouco depois do fim da ditadura. “Imagine-se em 1986 – os estertores da ditadura, início da Anistia. Todos precisando e pedindo debates, palestras, antes proibidos. Foi neste ambiente que surgiu o Sempre Um Papo, com uma proposta de conversa informal, descontraída. E foi onde eu descobri um filão de trabalho profissional na divulgação de livros e autores. Começou assim, despretensioso, e foi conquistando espaço no mercado editorial.”

O mineiro conta que começou suas tentativas de aproximação com as editoras ligando a cobrar de telefone público e que a primeira editora que continuou na linha após a identificação foi a Companhia das Letras, parceira até hoje e que também comemora, agora, 30 anos.

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“Hoje, com atividades semanais em Belo Horizonte, com quase 6 mil eventos realizados e perto de dois milhões de pessoas presentes, é tudo mais simples. Mas, naquela época, bater na porta de um patrocinador pedindo recursos para um debate seguido de lançamento de livro era, digamos, cômico. E eu já ouvi isso, várias vezes”, diz.

Quando o Sempre Um Papo completou 25 anos, Afonso Borges revelou que tinha o sonho de criar um centro cultural. Cinco anos depois, ele diz que isso está “a um passo de virar realidade”. Mas os planos vão muito além.

Agora, ele quer, além de ativar esse centro, transmitir os eventos online, utilizar melhor as redes sociais, fazer uma série de livros populares com os principais debates, lançar um livro contando a história dos 30 anos do Sempre um Papo, distribuir, para todo o Brasil, os vídeos e programas gravados com os autores e criar uma rede de divulgação nacional e internacional do autor brasileiro. Ele sabe que não é pouco e que os desafios são enormes.

Mas o trabalho é recompensado. “O meu patrimônio maior são os amigos. Acompanhei a carreira de vários escritores brasileiros. E fazia, e faço, tudo com muito cuidado e dedicação”, diz ainda.

E as boas lembranças são fartas. “Adélia Prado, em 1986, em um teatro que se chamava Cabaré Mineiro, José Saramago falando para 2 mil pessoas no Palácio das Artes, a madrugada que passei conversando com Mário Vargas Llosa sobre Guimarães Rosa, a primeira palestra de Paulo Coelho, em 1988, as andanças pelo Brasil com mala de livros, fazendo eventos. E fiz eventos até no interior da floresta amazônica.”

Uma história clássica do projeto. No mesmo palco, Raduan Nassar e Chico Buarque. Um leria um trecho, previamente combinado, do livro do outro. Raduan mudou de ideia quanto ao que tinha escolhido e Chico começou, sem ter se preparado, a ler um trecho erótico de Lavoura Arcaica. O músico teve ataque de riso, que contagiou o colega e todas as 1.700 pessoas presentes naquela tarde de 1994, em Belo Horizonte. Uma rara oportunidade de ouvir Raduan. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.