Homenagem

Semana completa quinze anos longe de Tom Jobim

O hino oficial do Rio de Janeiro, definido após anos de pressão da população, é Cidade Maravilhosa, marchinha composta em 1935 por André Filho. Mas desde que Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim surgiu na música brasileira, é nas melodias compostas por ele que nos recordamos da cidade mais bonita do Brasil.

Talvez porque com Tom Jobim temos uma música que é referência de elegância, estilo, beleza e qualidade. E certamente porque temos em Tom a referência definitiva de fidalguia do carioca. E possivelmente do brasileiro, pois não há resumo melhor para o “homem cordial” definido por Darcy Ribeiro que o nosso maestro soberano.

Nesta semana, completaram-se quinze anos da morte de Tom Jobim, em uma série de barbeiragens feitas por médicos norte-americanos. A confirmação da notícia provocou comoção – e o sentimento de que um pedaço daquele Brasil que tanto sonhamos existir estava nos deixando.

Foi interessante a reação daqueles que olhavam para aquele senhor e não o reconheciam, mas que entenderam de quem se tratava quando as emissoras de TV e as rádios começaram a apresentar os grandes momentos do compositor, como Águas de Março, Garota de Ipanema, Corcovado e Samba do Avião.

Não há na música brasileira obra tão consistente quanto a de Tom Jobim. O impressionante dele, em comparação a artistas de seu tamanho, como Dorival Caymmi e Chico Buarque, é que ele conseguiu manter o nível de qualidade mesmo em grande quantidade (Caymmi também tem uma obra sólida, mas muito menor) e sem se afastar da música um momento sequer (Chico já interrompeu a vida musical em dois momentos, para se dedicar à literatura).

Foram quarenta anos, a contar das primeiras composições com Billy Blanco, como Teresa da Praia e a Sinfonia do Rio de Janeiro, de plena atividade, compondo e tocando em todos os cantos do planeta.

Era a vantagem de fazer aquilo que gostava. Apenas a praia (e, depois de um tempo, uma boa bebida) ficava atrás no interesse de Tom – e certamente por isso vários de seus clássicos têm um pé na areia, ou pelo menos o olhar.

Temas como As Praias Desertas (“As praias desertas continuam / esperando por nós dois…”), o próprio Samba do Avião (“Rio, teu mar, praias sem fim / Rio, você foi feito pra mim…”), Teresa da Praia (“Oh, Dick / arranjei um amor no Leblon…) e outros tantos temas foram inspirados no mar ainda azul do Rio de Janeiro que Tom Jobim conheceu.

É verdade que ele teve seus parceiros – e foram grandes parceiros: Marino Pinto, Aloysio de Oliveira, Billy Blanco, Vinícius de Moraes, Chico Buarque e Newton Mendonça. E que o brilho de algumas composições é também dos artistas que trabalharam com Tom.

Retrato em Branco e Preto (com Chico), por exemplo, tem uma melodia inventiva, mas uma letra das mais bonitas da história da música popular. Só Danço Samba (com Vinícius) é uma obra-prima de unidade entre letra e música, só igualada por Desafinado (com Newton) – mas nesta até hoje reside o mistério sobre quem fez a letra e quem fez a música, mistério que, a rigor, ronda toda a obra de Tom e Newton.

E quando você chega nesta parceria é que se ressalta a versatilidade e a genialidade de Jobim. Tal como os grandes, como Cole Porter, ele talvez seja o melhor letrista de sua obra – e olha cada parceiro que ele teve.

Sozinho, Tom Jobim compôs simplesmente algumas das maiores músicas do século (em qualquer idioma), como Wave e Águas de Março. E ainda compôs Lígia, Bebel, Ana Luíza, Correnteza, Corcovado, Bonita, Outra Vez, Triste e Querida, entre outras.

É, portanto, um compositor de mão cheia, mais reconhecido fora do País (certa vez, foi ovacionado no Carnegie Hall, em Nova York, e ele estava na plateia, e lá foi descoberto por Frank Sinatra, este sim no palco).

Sinatra era só um dos fãs de Tom. Todo grande músico nascido ou “surgido’ a partir da década de 1960 admira (quando não venera) o compositor brasileiro. Artistas dos mais variados estilos, como Stevie Wonder, Tony Bennett, Michel Legrand, Burt Bacharach e Madonna já manifestaram seu carinho por Jobim.

Aqui, se ele não é tão reconhecido pelo grande público, é simplesmente o ínicio de uma árvore genealógica que passa por João Gilberto, Caetano Veloso, Chico Buarque, Roberto Carlos, Gal Costa, Novos Baianos, Fernanda Porto, Fernanda Takai e vai desembocar nas novatas Céu e Roberta Sá.

Além de todo esse peso na música mundial, Tom Jobim era um cidadão acima de qualquer suspeita. Não se preocupou em simplesmente ganhar dinheiro com a música – não fosse, não teria desistido de grandes projetos, como o de compor para o filme A Pantera Cor-de-rosa, para o qual foi convidado antes de Henry Mancini.

Apesar de ter casa em Nova York, sua morada era o Rio, perto dos amigos, da praia e da natureza. E, falando nisso, foi o primeiro artista brasileiro que se manifestou a favor da preservação das matas.

O que hoje é natural foi pioneirismo de Tom, que pagou caro por isso, pois nos anos 70s e 80s sua posição foi considerada “brega’ e “idiota’. Mas ele era superior à tanta ignorância. E deve estar olhando por nós, e pelas praias do Rio.

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