A Praça Roosevelt tornou-se o epicentro do teatro alternativo na cidade. Dois dos grupos mais atuantes dessa cena, porém, resolvem agora voltar aos clássicos. Após um hiato de dez anos, os Satyros retornam à tragédia grega com Édipo na Praça, uma versão da obra de Sófocles. Logo ao lado, os Parlapatões também empreendem sua visita aos cânones da dramaturgia. Pela primeira vez, os palhaços encenam um texto daquele que é considerado o mestre da comédia ocidental: Molière.
Curioso é que, nesse pretenso retorno ao passado, ambas as companhias se depararam com o presente. Nas duas criações são os temas e debates contemporâneos que conduzem as tramas. “É impressionante a quantidade de interpretações que um clássico pode suscitar”, comenta Rodolfo García Vázquez, diretor dos Satyros. “Decidimos fazer a peça por um motivo. Mas, no decorrer do processo, a emergência das manifestações nas ruas acabaram mudando o nosso olhar sobre a obra.”
Com estreia marcada para sexta, 16, Édipo na Praça surgiu da vontade do grupo de levar adiante sua pesquisa sobre aquilo que denomina “humanidade expandida”. Desde Hipóteses Sobre o Amor e a Verdade, espetáculo de 2010, investigavam formas de viver e se relacionar suscitadas pelas novas tecnologias. No projeto atual, o intuito era deter-se sobre contradições da reprodução assistida. “Uma geração de crianças está nascendo sem saber quem são seus pais. Isso é justo com elas? Será que deveriam ter esse direito? O tabu do incesto acaba tomando um novo vigor nesse cenário”, observa Vázquez, justificando a escolha do título grego. Édipo, afinal, mata o pai e se casa com a própria mãe sem ter conhecimento da gravidade dos atos que cometia.
Os dilemas éticos e existenciais do rei de Tebas, contudo, também possuíam contornos políticos. E é isso que sobressai nessa versão. “Não havia como negar essa questão. Era algo que estava acontecendo com a gente. As manifestações passaram aqui na praça. Muitas pessoas se abrigaram da polícia aqui dentro do teatro”, conta o diretor. “Logo no início, a peça já coloca que existe uma crise em curso em Tebas. Mostra como essa crise acaba desestruturando uma nação e a responsabilidade dos governantes em tudo isso.”
Outro dado a reforçar o caráter político da montagem é a escolha do espaço público como cenário. Apesar da estreita vinculação entre os Satyros e a Praça Roosevelt, essa é a primeira vez que eles rompem os limites de sua sala de espetáculos e tomam a rua. “Nunca antes tivemos autorização para utilizar a praça em nossas obras. Agora, poderemos explorá-la esteticamente”, observa Vázquez.
O BURGUÊS FIDALGO – Espaço Parlapatões. Pç. Roosevelt, 158, tel. 3258.4449. 6ª e sáb., 21h; dom., 20h. R$ 30. Até 27/10.
ÉDIPO NA PRAÇA – Espaço Satyros. Pç Roosevelt, 214, tel. 3258 6345. 6ª a dom., 20 h. R$ 30.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
