Quando começa o espetáculo, um homem pensativo passeia pelo palco. Ao lado de um menino, ele conversa sobre o passado e, principalmente, o futuro. Aos poucos, a plateia descobre que estão ali a mesma pessoa, mas em diferentes épocas da vida: Alberto Santos Dumont (1873-1932), um dos mais geniais brasileiros de todos os tempos, criador de várias invenções, em especial o 14-Bis, a primeira aeronave a levantar voo. “É impossível não se apaixonar pela figura dele”, comenta Fernanda Maia, autora do texto e das canções de “Além do Ar – Um Musical Inspirado em Santos Dumont”, que fará uma pequena temporada de estreia no belo Auditório Claudio Santoro, em Campos do Jordão, a partir do dia 22 de novembro, para depois chegar a São Paulo.
A escolha da cidade localizada na Serra da Mantiqueira não é aleatória – lá é sede da Fundação Lia Maria Aguiar, cujo programa educativo inclui o ensino de técnicas de teatro, em especial, de musical. Assim, como aconteceu em “Uma Luz Cor de Luar”, musical montado em 2016, o espetáculo inspirado em Dumont vai unir um elenco experiente (encabeçado por Cassio Scapin) com 43 alunos, entre crianças e jovens, aprovados em audições realizadas no núcleo de teatro da fundação.
“Trata-se do resgate de um mito, de um herói brasileiro”, explica Leonardo Faé, responsável pela produção. “A intenção é apontar um exemplo de perseverança, um homem que sempre insistiu, construindo sua carreira na base das tentativas e dos erros.” De fato, trata-se de uma excepcional vivência: dono de incansável curiosidade, o inventor foi evoluindo seu conhecimento na direção tanto da dirigibilidade do balão como no pioneirismo do avião. E, mesmo com as grandes quedas que sofreu com os protótipos anteriores, resistiu até dar o famoso “pulinho” de apenas 60 metros, aquele realizado em 1906, em Paris, com o 14-bis.
“Foi um homem que teve muitas certezas – não em pensamentos, mas no sentido de que era possível estudar, tentar experimentar, cair e levantar de novo”, observa Fernanda Maia, que divide a autoria do texto e das canções com Thiago Gimenes. “Ao mesmo tempo, foi alguém marcado pelas dúvidas, principalmente no fim da vida, sobre como suas invenções eram usadas de uma maneira sangrenta, com irmãos matando irmãos.”
Alguns temas delicados, como o suicídio de Dumont, não são evitados, mas tampouco ganham destaque. “O foco está na pessoa que não economizou vida e sempre tornou disponível suas descobertas”, comenta Cassio Scapin, que viverá o inventor na sua fase madura – André Torquato será o Santos Dumont da fase anterior, enquanto os meninos Francisco Arruda e Raí Palma, selecionados na audição, vão representar a fase da infância e adolescência.
Scapin já tem familiaridade com o personagem, pois o representou na minissérie “Um Só Coração”, de 2004, além de protagonizar um vídeo que era exibido aos visitantes de uma exposição dedicada ao inventor em 2016, no Rio. “O que me chama atenção na figura dele é o olhar, triste”, observa o ator. “Traz uma doçura marcada pela tristeza, como se antevisse o futuro: dele e do Brasil.”
O que mais fascina em Scapin era o rigor com que Santos Dumont comandou seus passos ao longo de toda a vida. “Morreu com a conta justa de uma existência, pois era o oposto do que se prega hoje: apesar de representante da elite cafeeira e com a formação de um dândi, ele cedeu os direitos de seus inventos, ao contrário dos irmãos Wright, que também lutavam pela primazia do primeiro voo, mas que registraram suas descobertas.”
Como não é um ator de musicais, Scapin acelera agora suas aulas de canto – uma realidade diferente de André Torquato, especializado no gênero, no qual é um dos destaques na atualidade. Fascinado pelo personagem, ele já iniciou seu processo de pesquisa. “Além de estudar sua biografia, tento descobrir o que se passava na cabeça dele, pois, de tão moderno, hoje seria um digital influencer”, acredita.
A reportagem acompanhou a tarde em que Scapin, Torquato e os dois meninos testaram o figurino criado por Fabio Namatame. “Vestidos fartos ficam curtos, os costumes estruturados se transformam soltos e confortáveis, as cores alegres e formas geométricas dominam, e Santos Dumont se torna referência de moda, pela criatividade e elegância”, comenta o figurinista.
Livro
Voar é um desejo comum na infância e não foi diferente com Santos Dumont. É sobre esse universo que trata “Albertinho e Suas Incríveis Máquinas Voadoras” (Editora Letras do Brasil), escrito pela jornalista Luciana Garbin e ilustrado por Marcos Müller, profissionais do jornal O Estado de S. Paulo.
A obra acompanha as aventuras do menino Albertinho que, ao encontrar um livro mágico na biblioteca do pai, descobre o universo de Alberto Santos Dumont. É a senha para o garoto, acompanhado de seu cão Bartô, entrar no celeiro abandonado da fazenda onde mora e encontrar quatro das máquinas voadoras criadas por Santos Dumont. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.