Em 1996, no período chamado de ‘retomada’ do cinema brasileiro – após o desmantelamento do sistema de produção e distribuição na era Collor -, a diretora Sandra Werneck conseguiu emplacar um dos grandes sucessos da época. Com apenas 23 cópias, Pequeno Dicionário Amoroso ultrapassou a marca de 400 mil espectadores. Quase 20 anos depois, a diretora retoma os personagens daquele filme e propõe agora Pequeno Dicionário Amoroso 2, que estreou na quinta-feira.
É um lançamento pequeno – apenas 50 salas. “Não é filme para um milhão de espectadores e eu percebo certo estranhamento nas pessoas, porque, na cabeça da maioria, a sequência tem de ser imediata”, reconhece a diretora e (co)roteirista. O desejo de prosseguir com a história vê Gabriel e Luiza, os personagens de Daniel Dantas e Andréa Beltrão, não nasceu de uma vontade repentina. “Queria dar conta de mudanças que ocorreram nesses quase 20 anos.”
Sandra pensava na filha de Gabriel, no desejo de Luiza de ser mãe. No roteiro do novo filme, a garota experimenta uma ligação homo, depois, outra hétero e tenta conciliar as duas. E o filho de Luiza, como todo jovem do terceiro milênio, satisfaz sua curiosidade pesquisando sobre sexo na internet. A história, assim, não é só a do reencontro de Gabriel e Luiza e da tentativa de ambos de retomar a ligação. Vira esse olhar sobre mudanças comportamentais, busca o respeito pela diversidade e o entendimento do outro. Mesmo assim, alguns críticos têm reclamado. Tem gente que se pergunta sobre a necessidade de retomar esses personagens. Parece tão inútil.
A tal inutilidade está nos olhos de quem vê. “Que reconfortante que é ouvir você dizer isso, porque esse filme realmente não nasceu para arrebentar na bilheteria. Existe um outro perfil de comédia que faz mais sucesso. Não vou desdenhar de ninguém, mas é que eu realmente senti necessidade de retomar esses personagens, de dizer mais duas ou três coisas sobre eles.” Sandra reconhece que o momento é delicado, em termos de público. Ela conversou ontem com o repórter, pelo telefone, do Rio. “Estou muito ansiosa e já passei por alguns cinemas que exibem o filme. Vi salas cheias, o que foi animador. Gostei muito do Que Horas Ela Volta? (de Anna Muylaert). Acho que o filme merece estar no Oscar e, mais que isso, merece ganhar, mas o público estava desinteressado. Foram só 25 mil espectadores no primeiro fim de semana. Agora está reagindo, por causa do Oscar. Ainda bem, mas é muito colonialismo”, lamenta.
Cada vez mais Sandra sente necessidade de compartilhar a direção. “No primeiro filme, fui acusada de maltratar o homem para privilegiar a mulher. Chegaram a dizer que o filme era feminista, mas de um feminismo retrógrado, machista. Para a sequência, resolvi que precisava de um codiretor. Tentei o Walter (Carvalho), meu parceiro, mas ele não podia. Terminei fazendo com Mauro Farias e foi muito bom. Não teve essa de um se ocupar dos autores e outro da decupagem. Fizemos tudo junto e a troca de olhares foi muito positiva. Dirigir é uma atividade solitária e me agrada compartilhar.”
Como o primeiro filme, o segundo adota um relato episódico, em forma de abecedário – senão, não seria um pequeno dicionário. E, como reconhece Sandra, boa parte do mérito é do seu elenco. Andréa Beltrão, Daniel Dantas. “Todo mundo elogia ela e quase não fala dele. Acho que é a melhor interpretação do Daniel.” O repórter elogia Camila Amado, tão humana. “A personagem me encanta. Tem horas que é louca e, no final, é uma sábia”, define a diretora.
Glória Pires, maravilhosa
“É uma mãezona, não é? Meio trambiqueira, mas generosa com todo mundo. Amo.” Andréa diz que Sandra Werneck é a diretora mais prática que conhece. O que a prática Sandra promete, a seguir? “Estou fazendo um documentário sobre covers. Sobre o significado de se anular, para assumir a identidade do outro. Tem um cara que faz cover da Ivete Sangalo. E outro genial, cover do Roberto Carlos. Se Roberto faz os shows em cruzeiros, ele faz num catamarã, na baía de Guanabara.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.