‘Samba Futebol Clube’ reúne mais de 40 canções no Rio

“Samba Futebol Clube”, espetáculo em cartaz no Teatro II do Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio, guarda pontos de contato e evidencia diferenças em relação aos outros musicais capitaneados por Gustavo Gasparani – Otelo da Mangueira, Opereta Carioca, Oui Oui… A França É Aqui! A Revista do Ano e As Mimosas da Praça Tiradentes (os dois últimos com textos escritos em parceria com Eduardo Rieche).

As aproximações dizem respeito à fidelidade à temática brasileira e à presença de uma perspectiva histórica, mesmo que, no caso dessa nova encenação, não haja uma ordenação linear dos acontecimentos. A proposital ausência de uma organização facilmente perceptível (início, meio e fim), inclusive, é um elemento que marca a singularidade de “Samba Futebol Clube”. “Esse musical não tem uma história com curva dramática. É mais poético e menos racional ou cronológico”, confirma Gasparani, que, ao contrário das encenações anteriores, não atua. “Eu estabeleci que os atores precisariam tocar instrumentos. Como não toco, fui eliminado pelo critério que criei”, explica Gasparani, que venceu o Prêmio Shell de autor por Oui Oui… e de melhor ator por As Mimosas da Praça Tiradentes. Agora, dirige e responde pelo roteiro da montagem, ainda sem temporada prevista em São Paulo, que tem uma utilização mais realçada do aparato multimídia.

Gasparani começou o processo com o vasto material musical ligado ao futebol, selecionado pelo ator e pesquisador Alfredo Del-Penho. Examinou as letras, separou as que mais agradaram, passou a ouvi-las. Depois, percebeu os momentos do espetáculo em que deveria inserir texto, concebido com depoimentos pessoais sobre futebol (Gasparani realizou workshops com os atores para estimular as improvisações), produção literária (selecionada pelo jornalista João Pimentel) acerca do assunto assinada por diversos e renomados escritores e trechos de canções falados em vez de cantados.

A estrutura se tornou mais complexa com a inclusão do multimídia na malha da encenação. “Entrelacei Pelé, música infantil de Paulo e Zé Tatit, com uma crônica de Carlos Drummond de Andrade (Letras Louvando Pelé) e um clipe reunindo gols de Pelé. São misturas radicais”, exemplifica Gasparani, que se preocupou em conceituar os dois atos: no primeiro, o público se depara com a ótica do torcedor; no segundo, com a do jogador. “Nos dois atos, os atores transitam entre os registros da narração e o da interpretação propriamente dita”, informa Gasparani, referindo-se ao elenco integrado por Alan Rocha, Cristiano Gualda, Daniel Carneiro, Gabriel Manita, Jonas Hammar, Luiz Nicolau, Pedro Lima e Rodrigo Lima. O fato de se tratar de um time masculino não foi planejado. “Não houve preconceito. Existe futebol feminino. E várias mulheres gostam do esporte. Entretanto, acabamos juntando um entrosado grupo de atores apaixonado por futebol.”

O projeto de Samba Futebol Clube não partiu de Gasparani, que nunca travou elo passional com o esporte. “Acompanho a Copa do Mundo. Meu avô era tricolor doente. Meu irmão é. Sigo a tradição familiar e torço pelo Fluminense”, afirma. A semente foi lançada por João Pimentel, em 2010. A montagem não nasceu, portanto, diretamente vinculada ao contexto da Copa de 2014. “Acho que faltam musicais ligados ao futebol. Uma lacuna, já que dispomos de um cancioneiro voltado para esse universo. Encontrei Gasparani no Capela e falei sobre a ideia”, relata o flamenguista Pimentel, citando o restaurante boêmio na Lapa carioca. “Um tempo depois, ele me telefonou e pediu que eu fizesse a pesquisa de texto”, revela. Pimentel enveredou por sebos e livrarias e apresentou o material garimpado. Feita a escolha, ficaram textos de José Lins do Rego (Fla X Flu), Carlos Drummond de Andrade (O Torcedor, Ganhar, Perder, Viver, Letras Louvando Pelé), Nelson Rodrigues (O Campeão da Espanhola, Sofrer pelo Botafogo, O Escrete de Loucos), Paulo Mendes Campos (O Botafogo e Eu, Copa 1974), Armando Nogueira (Na Grande Área), Ferreira Gullar (Gol), Roberto Assaf e Clovis Martins (A História do Futebol).

O espetáculo – que conta com direção musical de Nando Duarte e coreografias de Renato Vieira – traz mais de 40 canções de várias épocas e vários ritmos. Entre elas, cabe destacar Um a Zero (Pixinguinha/Benedito Lacerda/Nelson Ângelo), Marcha do Botafogo (Lamartine Babo), Touradas em Madri (Braguinha/Alberto Ribeiro), Nega Manhosa (Herivelto Martins), … e o Juiz Apitou (Wilson Batista/Antonio Almeida), Pra Frente Brasil (Miguel Gustavo), Aqui É o País do Futebol (Milton Nascimento/Fernando Brant), E por Falar no Rei Pelé (Gonzaguinha), Fio Maravilha (Jorge Benjor), Ponta de Lança Africano – Umbabarauma (Benjor), Gol Anulado (João Bosco/Aldir Blanc), O Que É, O Que É (Moraes Moreira) e Uma Partida de Futebol (Skank).

Apesar do musical despontar munido do caráter lúdico próprio de lembranças de infância talvez universais, a passagem do tempo detectada através da música pode sinalizar alterações no vínculo com o futebol. “Tenho 44 anos e a minha relação com o futebol mudou. Fiquei mais velho e tolerante. Contudo, não foi ‘só’ uma travessia pessoal. Cresci no Maracanã vendo Zico, o ídolo da minha vida. Atualmente, o jogador brasileiro vai embora muito cedo para times internacionais. Permanecem os que não têm condições para jogar no exterior. E há os que retornam para cá depois dos 30 anos. Noto um esvaziamento do nosso futebol”, opina Pimentel. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

SAMBA FUTEBOL CLUBE

CCBB. Teatro II. Rua Primeiro de Março, 66, Centro, Rio de Janeiro, (21) 3808-2020. 5ª a 2ª, às 19h30. De R$ 5 e R$ 10. Até 14/7.

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