Russell Crowe brilha em épico naval

Enquanto estiverem subindo os créditos deste Mestre dos Mares – O Lado Mais Distante da Terra, do australiano Peter Weir, que estréia hoje nos cinemas, é bem provável que você pense: como pode este filme estar concorrendo ao Oscar em dez categorias? A primeira impressão é de que Hollywood jamais colocou tanta água e tantos homens juntos na tela… um mar de testosterona. Mas se olharmos com mais atenção, vamos ver que o épico naval adaptado da série de 20 livros de Patrick O?Brian é muito mais do que isso.

O cenário é o Atlântico Sul, em plenas guerras napoleônicas, e o ponto de partida é o fulminante ataque que o H.M.S Surprise, o velho navio do capitão Jack Aubrey (Russell Crowe), sofre da fragata francesa Acheron. A embarcação inglesa é praticamente destroçada, e só escapa porque entra num nevoeiro. É nesse momento que se desenrola a cena mais “forçada” do filme, quando os marujos tentam rebocar a remo o gigantesco navio avariado a bordo de dois escaleres.

O quase naufrágio desperta a fúria do “lobo-do-mar” Jack, e ele decide sair na caça aos franceses – isso depois de consertar o navio nas costas brasileiras, de onde vêm as índias que virão a ser as únicas mulheres a dar o ar da graça em mais de duas horas. Em seguida, o capitão, chamado de “O Sortudo” pela tripulação, insiste na perseguição a bordo de um navio mais lento, menos armado e muito mais frágil que o oponente.

É nesse contexto que desponta a figura do melhor amigo de Jack, o naturalista Stephen Maturin (Paul Bettany). Amante da ciência, Maturin é também o médico da expedição, o que reforça o seu lado humanista e o opõe ao destemido e truculento Jack Aubrey.

Crowe é magnífico no papel de Jack. Tem vigor físico nas cenas de ação e expressa com economia as densidades e sutilezas de seu personagem. Que personagem é esse? Jack Sortudo e seu amigo/oponente Stephen Maturin expressam diferentes concepções num mundo em acelerado processo de mudança.

O capitão, num certo sentido, representa o velho e experiente lobo-do-mar. O Acheron, que ele persegue como a uma quimera, representa o futuro que ameaça atropelá-lo. E Maturin, com seu comportamento de cientista, mais do que de estrategista de guerra, também é parte desse futuro. O problema é que, nesse duelo entre a estratégia beligerante e a ponderação científica, a primeira acaba vencendo por pequena margem – como não poderia deixar de ser no mundo pós-11 de setembro.

Peter Weir desvia a atenção dessas minúcias com uma produção impecável. Weir filmou durante seis meses e, por mais que tenha recorrido a tanques de estúdio e efeitos especiais (quase imperceptíveis, diferentes da febre digital que tem assolado Hollywood), seu mar possui mais fúria do que aquele filmado pelo alemão Wolfgang Petersen, há coisa de três ou quatro anos. As tempestades que ameaçam tragar o H.M.S. Surprise não são apenas forças da natureza a abater-se sobre os personagens como pragas bíblicas. São a própria expressão dos conflitos que consomem essas figuras que o diretor quis desenhar como maiores que a vida.

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