“Olha, Rodrigo, não dá mais. Em todas as cenas, eles me colocam sentada. Faço exercícios todos os dias. O que eles estão pensando?” É com carinho e uma dose de espontaneidade que Rodrigo Lombardi se recorda da saudosa Cleyde Yáconis, com quem contracenou na novela Passione, em 2011. “Sempre aprendi muito com essa gerações de grandes atores”, disse Rodrigo, ao Estado, desta vez, acompanhado de Sérgio Mamberti. Os dois contracenam em Um Panorama Visto da Ponte, que está em cartaz no Teatro Raul Cortez.

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Mesmo sendo considerada um clássico da dramaturgia, a peça de Arthur Miller, de 1955, sempre concorreu com suas outras criações: as antecessoras Morte de Um Caixeiro Viajante (1949) e As Bruxas de Salém (1953). No Brasil, a segunda chegava em 1960, com direção de Antunes Filho, lembra Mamberti. “Foi uma coisa que todos estranharam. Tanto pelo tema como pela forma que o diretor conduziu aquela história sombria.”

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Apesar de se inspirar nos relatos de perseguição a mulheres por bruxaria no povoado de Salém, em 1692, Miller elaborava em sua peça uma crítica ao Macartismo norte-americano e a perseguição aos comunistas nos EUA, da qual também foi vítima. “Em grande parte de sua obra, Miller debate a ilusão do sonho americano”, aponta o diretor Zé Henrique de Paula. “Isso ficou marcado também em seu casamento com Marilyn Monroe e a complicada relação com Hollywood.”

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Em Um Panorama Visto da Ponte, o autor descreve a vida de uma família de imigrantes italianos. Eddie Carbone (Rodrigo Lombardi) é um trabalhador das docas do Brooklyn que vive com a mulher Beatrice e a sobrinha Catherine. A chegada dos primos Marco e Rodolfo, ilegais no país, torna-se centro de uma disputa, nem sempre expressa em palavras. Rodolfo e Catherine se apaixonam e o patriarca percebe que seu lar e seus sentimentos foram desrespeitados. “Eddie tem uma ingerência sobre a própria vida”, aponta Lombardi. “Ele não consegue pronunciar, dar nome aos seus problemas.” Para Mamberti, que vive o advogado Alfieri, “a dimensão de Eddie é a de um herói trágico”, diz. “Ele não age como se estivesse em dúvida. Eddie tem certeza de que seus sentimentos estão certos.”

A sensação de que uma palavra dita poderia solucionar essa crise tem a ver com o recorrente diálogo de Miller com a obra de Ibsen, autor de Um Inimigo do Povo, e o chamado realismo psicológico. Contemporâneo de Miller, o dramaturgo Tennessee Williams criou no Stanley Kowalski, de Um Bonde Chamado Desejo, um homem represado de palavras, assim como Eddie. “São autores que dão morfina para a realidade”, diz Lombardi. Em Um Panorama…, fica explícito que as perguntas desesperadas da mulher do personagem nunca dão conta de acessar o universo sombrio de Eddie, transmitido em ciúmes e raiva crescentes.

Quem regula a energia destrutiva do italiano – ao menos tenta – é o advogado vivido por Mamberti que, nessa montagem, ultrapassa o estatuto de narrador da peça. No ensaio aberto antes da estreia, o ator de quase 80 anos demonstra a força e a clareza de uma geração forjada desde os clássicos do Teatro Brasileiro de Comédia até o experimentalismo de O Balcão, na versão de Victor García, da qual Mamberti participou. “Mesmo assim, ele continua com a energia de um garoto”, diz Lombardi. “São minhas sessões de pilates”, explica Mamberti.

Para a dupla que trabalhou pela primeira vez na novela O Astro (2011), a peça também é motivo para pensar o mundo e a situação do Brasil. A crise imigratória continua sendo debatida na Europa e nos EUA, e começa a surgir no País com os haitianos e venezuelanos que passaram a fronteira brasileira nos últimos meses. “Na peça, todos estavam em busca do sonho americano, de conquistar um emprego e sobreviver. Precisamos ver como vamos tratar essas pessoas aqui”, diz Lombardi.

No palco do Raul Cortez até novembro, Lombardi ainda interpreta Adriano na série Carcereiros, cuja 1ª temporada continua no segundo semestre, na Globo, com mais oito episódios.

UM PANORAMA VISTO DA PONTE

Teatro Raul Cortez. R. Dr. Plínio Barreto 285; 3254-1631. 6ª, 21h30, sáb., 21h, dom., 18h. R$ 80. Até 25/11

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.