Um batalhão de operários ainda trabalhava nessa segunda-feira, 30, nos últimos retoques da reforma do Cinesesc. Tudo tem de estar nos trinques para quarta-feira, 1º de abril, quando a sala da Rua Augusta volta a funcionar, sediando o Festival Melhores do Ano. A reabertura será para convidados – e o filme escolhido é A Luneta do Tempo, de Alceu Valença, em presença do cantor e compositor convertido em diretor. É um musical rico em colorido e musicalidade, contando a história de Lampião e Maria Bonita. A partir de quinta, 2, o público em geral poderá conferir as novidades, e elas são muitas. Na fachada nem tanto. Nem no lobby, que reabre com uma exposição de Marcelo Cipis, retratando a visão do artista de grandes filmes nacionais e estrangeiros. Vá logo para os painéis referentes a Praia do Futuro, de Karim Aïnouz, e Boyhood, de Richard Linklater. O fato de esses dois estarem sendo destacados não significa que os outros dez não estejam no mesmo nível.
A grande mudança está lá dentro. Nos últimos anos, o cinéfilo acostumou-se ao formato interno do Cinesesc. A plateia dividida em dois blocos de assentos. Agora, são três. Os 328 lugares foram diminuídos para 254. Não apenas as poltronas foram mudadas e estão mais confortáveis – as antigas também eram boas, mas saíram de mercado -, como aumentou o espaço entre as fileiras. Os muito altos e os obesos terão mais conforto na hora de esticar as pernas. Os espectadores de terceira idade e os deficientes vão agradecer ainda mais. Com programas voltados para o público idoso, há tempos o Cinesesc vinha se preocupando com a questão da segurança. A sala está cheia de corrimãos para garantir a acessibilidade.
Para o mezanino, onde costumam ocorrer debates, há agora um sistema que atende a cadeirantes. E durante todas as sessões do Festival dos Melhores, deficientes auditivos e visuais serão contemplados com sistemas para lhes garantir a inclusão. O bar continua operante e será possível continuar assistindo às sessões lá de dentro. A novidade é que o vidro que isolava o bar da plateia era formado pela junção de várias placas e, a partir desta terça, 31, será um bloco único – que ainda não havia sido instalado nessa segunda, 30. A tela também vai mudar, mas como foi encomendada no exterior ainda está chegando – de navio. O sistema de projeção não muda. Dois projetores para películas, mais o sistema digital instalado há três anos. A operadora Daniela Fava garante a funcionalidade. Com 11 anos de experiência na rede Cinemark, mais cinco no próprio Cinesesc , ela exibe os novos sistemas de lentes. “Tudo do mais moderno”, celebra.
O coordenador de Comunicação Social do Sesc, Ivan da Hora, acompanha o repórter e informa – “Há tempos essa reforma vinha se fazendo necessária.
Pode até parecer piada, e os funcionários contam como se fosse, mas um dia um espectador se levantou e o casaco enganchou no braço da poltrona, que foi junto. Não era o caso de fazer pequenos remendos. O Sesc preferiu fechar a sala para promover uma grande reforma.” Orçada em R$ 900 mil, quem ganha é o público. Mas vêm mais transformações por aí. Há outro projeto para transformar o Cinesesc num conjunto, com uma ou duas salas adicionais. A casa do lado já foi adquirida, mas o projeto ainda aguarda luz verde.
Ocorre uma coisa curiosa em São Paulo. As salas de rua, como o Cinesesc – o Espaço Augusta, a Reserva Cultural e Caixa Belas Artes -, especializaram-se em salas de arte, formando o circuito cinéfilo da cidade. Ademar Oliveira, do Espaço Augusta, observa que esses espaços, na verdade, resistiram à ‘shopinização’ do circuito cinematográfico. “Com o investimento maciço nas salas de shopping, esses espaços viraram mais alternativos, atendendo a um tipo específico de produção artística.” E ele diz mais – “As salas de shopping necessitam de um aval para exibir filmes mais seletivos. Tem de ter o Oscar ou algum prêmio importante, mas que seja conhecido. Minha programação é diferente no Espaço Augusto e no Arteplex Frei Caneca. É diferente até no Cine-Sala, ex-Sabesp, em Pinheiros.”
Jean-Thomas Bernardini, da Reserva Cultural e da distribuidora Imovision, lembra que há alguns anos ainda era possível encontrar filmes de arte nos Multiplex. “Hoje, eles se afastaram da gente. Ninguém quis exibir um filme como Timbuktu, mesmo que tenha ido para o Oscar.” O Cine-Sala, na Fradique Coutinho, onde já funcionou a Cinemateca Brasileira, foi reformado – e digitalizado – por Ademar Oliveira em parceria com a empresa que cuida da imagem de Raí – sim, o jogador -, e também tem como sócios Paulo Velasco e outras figuras destacadas. Enquanto busca patrocinador para a sala, Ademar admite que o público tem respondido ao conceito ‘Multiplex numa salinha’. “Exibimos três filmes em quatro sessões diárias e o público de Pinheiros está correspondendo.” As redes sociais podem destruir, mas têm ajudado na divulgação dos bons filmes, sem discriminação dos espaços. O cinema de rua virou a salvação do filme de arte. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.