Referência em programação infantil

No quesito imaginação, parece que o reino “Rá-Tim-Bum” continua na dianteira. A estréia de “Ilha Rá-Tim-Bum”, a terceira edição da série, só vem confirmar que a TV Cultura ainda é referência em programação infantil.

História bem elaborada, direção segura, cenários e figurinos primorosos são destaques, assim como os efeitos especiais, que dão o tom mágico à trama criada por Flávio de Souza. Outro grande mérito do infantil, exibido diariamente às 15:30 h na Rede Brasil e TV Paraná -, é não menosprezar a inteligência das crianças. O que, diga-se de passagem, é virtude rara na programação infantil da tevê aberta.

O “Ilha Rá-Tim-Bum”, na verdade, não tem muito em comum com as edições anteriores. Pelo menos no que diz respeito à história. Afinal, não se trata de uma continuação e, sim, de uma nova trama, com cenários e personagens diferentes. De fato, “Ilha Rá-Tim-Bum” mais parece uma reinvenção do clássico “Robinson Crusoé”, de Daniel Defoe. Só que, em vez de um bravo e solitário náufrago, que tenta sobreviver numa ilha desconhecida, são cinco garotos, três meninos e duas meninas, os heróis da saga infantil.

A vilania fica por conta de um estranho ser, habilmente interpretado por Ernani Moraes, que viveu o desajeitado Boneca na novela “Torre de Babel”. Em seu esconderijo na ilha, uma referência pode deleitar os mais velhos: a tela de onde o vilão observa os “forasteiros” faz lembrar antigos desenhos, como “He-Man” e filmes de ficção científica, bem como os rasos “reality-shows” da atualidade. O jeito “Big Brother”, aliás, ganha ainda mais força com o “olho indiscreto”, que persegue os náufragos por toda a ilha. A vantagem é que, na ficção, o resultado é muito mais interessante.

Armação inspiradora

O conteúdo didático da produção não aparece sob a forma de quadros inseridos na história, como acontecia nas versões anteriores, “Rá-Tim-Bum” e “Castelo Rá-Tim-Bum”. Desta vez, o autor optou por uma abordagem mais sutil. Assim, temas como solidariedade e ecologia misturam-se à ficção já no capítulo de estréia, o primeiro dos 52 episódios desta edição.

Uma mistura de aventura, suspense, mistério e comédia compõe a receita destinada ao público dos sete aos 12 anos. É fácil, contudo, deduzir que autor e diretores assistiam à série “Armação Ilimitada”, nos idos anos 80. Apesar das diferenças inquestionáveis entre as produções, algumas passagens resgatam uma linguagem típica do antigo seriado da Globo. Um desses momentos é o modo como a telinha do vilão Nefasto traça o perfil de cada um dos garotos náufragos, abusando de linguagem figurada e humor.

O elenco mirim, visivelmente desigual, é o ponto vulnerável da produção. Apesar da seleção ter sido feita entre quase 2 mil crianças, algumas demonstram total falta de preparo. A grande exceção é o pequeno Rafael Chagas, intérprete do impagável Micróbio. Além dele e de Ernani Moraes, Ângela Dip destaca-se também, como a surpreendente aranha Nhã-nhã-nhã.

Parece que a produção fez questão de mostrar que os R$ 10 milhões do projeto foram bem empregados. Às vezes, os efeitos especiais aparecem um pouco mais do que deveriam. O importante, porém, é que eles traduzem de modo eficiente o espírito fantástico da história. Já a caracterização, com figurino e maquiagem, é irretocável. Só não tira o brilho das tiradas críticas da história. A maioria delas sai da boca do próprio vilão. Decidido a estudar a humanidade para, assim, poder destrui-la, Nefasto tira suas próprias conclusões sobre a civilização. Numa delas, por exemplo, deduz que os passageiros de um trem lotado são, na verdade, vítimas engolidas por um monstro comprido e cruel. Ninguém que já tenha pego uma condução lotada na hora do “rush” questionaria esta dedução.

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