Jorge Rodrigues Jorge/Carta Z Notícias
Aguinaldo Silva está tratando personagens como alunos.

Aguinaldo Silva garante que está se reinventando como autor em Duas caras. Além de enfocar as transformações dos personagens na trama das oito da Globo, este pernambucano de Carpina assegura que deixou definitivamente de lado o realismo fantástico para debruçar-se sobre uma história hiper-realista. No início deste mosaico de papéis de várias personalidades, histórias inspiradas em jornais, uma favela urbana e muitas discussões sociais, Aguinaldo trata seus personagens como alunos.

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Para saber se estão aparecendo demais ou muito pouco nos capítulos, o autor utiliza simples recursos escolares para ter controle supremo sobre suas criaturas. ?Tenho uma caderneta de chamada de escola com todos os personagens por ordem alfabética. No final de cada capítulo, marco presença. Os que faltam dois dias, já estão de volta no terceiro. Assim controlo com precisão a história?, explica.

P – Senhora do destino, sua última novela, teve uma das maiores audiências de novelas dos últimos dez anos. Que diferencial você reserva para Duas caras?

R – Os personagens são muito humanizados e não tenho nenhuma grande vilã como a Nazaré – de Renata Sorrah em Senhora do destino. Vou retratar a realidade de uma favela, a Portelinha. Falo de muitos conflitos existenciais e priorizo os trabalhadores, não os marginais. Nessa obra, falo principalmente da necessidade que todos têm de mudar, de se transformar. Como em todas as novelas, me mato de trabalhar para agradar. Espero ser recompensado com uma boa audiência. Na verdade, às vezes eu me rasgo com o ibope (risos).

P – Esta é mais uma de suas recentes novelas sem realismo fantástico. Por que você não utiliza mais o gênero?

R – O realismo fantástico fica tolo se comparado ao nosso cotidiano, com tiroteios nas ruas, agressões por toda a parte. Acho que essa minha fase passou. Não me interesso mais por personagens imaginários. Estou mais urbano e naturalista. Eu gostava muito desse gênero, mas agora me divirto com assuntos verídicos.

P – Você escrevia sobre a realidade quando era repórter policial na década de 60 e 70. O que essa visão jornalística acrescenta em suas novelas?

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R – Trago a disciplina que o jornalismo nos concede. Íamos atrás da notícia vorazmente. Trago também uma percepção muito forte da realidade. Por ter sido repórter, sou uma pessoa mais safa, sei me virar. O jornalismo me ajudou muito a ser autor de novelas. Hoje, o uso guardando recortes de revistas e jornais e faço um banco de dados de fatos. Na novela, vou usar a história do homem que morre num circo, vítima de bala perdida, quando estava com a amante. É o caso do João Pedro, personagem do Hérson Capri. Queria usar desesperadamente essa história.

P – Essa novela também tem uma inspiração autobiográfica. O Fernando, personagem do José Wilker, é inspirado na sua história. De que forma?

R – Tem coisas minhas e também de intelectuais e políticos que já tinham saído da adolescência na década de 60. É um personagem positivo. Eu o adoro. É o único papel que não vai morar na Barra. Ele tem um apartamento no Castelo, no centro do Rio. Me enxergo um pouco nele, também tenho um apartamento por lá. Fora isso, quem não quer ser o Wilker?

P – Você lançou dois livros consecutivamente, Prendam Giovanni Improtta e 98 tiros de audiência e prepara uma exposição de fotos e outro livro. Como ficam estes projetos durante a novela?

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R – Sou um dos maiores colecionadores brasileiros de fotos dos primeiros anos do século XX. Vou fazer uma exposição em janeiro com fotos inéditas de flagrantes até 1937. O próximo livro, que também se passa na primeira década do século passado, é sobre o João do Rio. Mas só vou lançar no intervalo desta novela com a próxima, que torço para que seja enorme (risos).