De longe, Sadek impressiona. Parece um gigante. De perto, os olhos e o sorriso traem o garoto. Sadek tem 26 anos. Quem? Rapper e, agora, também ator, integrou, como tal, a delegação francesa que veio ao Brasil em junho, no Festival Varilux. Contracena com Gérard Depardieu em Tour de France, e o filme de Rachid Djaidani estreou na quinta, 13. Dele, pode-se dizer o que o próprio Sadek disse de seu companheiro de elenco – “É um amor de pessoa.” É mais que um tipo afável. Como homem e artista, Sadek é perfeitamente consciente dos problemas dos árabes, como ele – é meio tunisiano -, na sociedade francesa. Nem por isso é amargurado.

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Tour de France é sobre esse jovem rapper (Sadek) escolhido para abrir o concerto de um rapper famoso, Yasiin Bey, ex-Mos Def. Às vésperas do que será seu grande salto na carreira, ele se envolve numa confusão e tem de desaparecer – até o grande dia. Seu empresário tem a ideia – coloca-o como acompanhante de seu velho pai (Depardieu), que pretende fazer o tour da França, não esportivo, mas em busca das paisagens pintadas por um artista do século 18, Joseph Vernet. No início, estranham-se. Um não tem nada a ver com o outro, e Depardieu parece o típico representante da França profunda, a que exclui imigrantes e vota no Front National. Terminam por descobrir que as diferenças talvez não sejam assim tão grandes.

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Há um momento-chave em Tour de France e é quando Depardieu canta a Marseillaise em ritmo de… rap. “Allons enfants/de la patrie/le jour de gloire/est arrivé…” Separe as palavras, as frases, ponha veemência no tom de voz, torne-se cavernoso. O hino nacional francês vira um belo rap. A própria celebração patriótica vira… Protesto? Sadek conta um pouco de sua história. “O rap é uma lupa. Amplia o que ocorre na periferia. Sou filho de uma união mista, pai de ascendência tunisiana e mãe russa. (NR – O próprio diretor é filho de argelino com sudanesa.) Cresci no quartier, que são os guetos nas periferias em que ficam confinados os imigrantes e seus descendentes. Aos 11 anos, sofri um acidente e tive de ficar imobilizado. Toda a minha energia de garoto reprimida dentro de mim… Comecei a escrever, uma poesia cheia de raiva. Liberado, fui participar de batalhas de rua. Foi o que me levou ao label Hostile Records, com quem assinei meu primeiro contrato.”

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Isso foi em 2012. Sadek tinha 21 anos. Na ficção de Tour de France, o personagem chama-se Far’hook e também começou em batalhas de rua. E vai abrir o concerto de Moz Def, um rapper lendário, que Sadek idolatra. Apesar dessas, digamos, similaridades, Sadek descarta que o personagem seja ele. “Nada a ver”, diz. Se aceitou fazer, nem foi tanto pensando na carreira, mas porque ali dentro tem uma proposta de entendimento que achou interessante. “Nosso grande problema, digo dos filhos e netos de imigrantes, é que não nos sentimos cidadãos na França. O sistema não permite. Começa na escola. Uma turma inteira de negros e árabes, nenhuma referência ao passado colonial e ficam entupindo a cabeça da gente com a história do grande herói Vercingetórix… Não estou exigindo nenhum pedido de desculpas, mas se o sistema reconhecesse as diferenças como herança do passado colonial já seria, quem sabe, um começo para que as pessoas, na própria escola, tentassem se conhecer e entender melhor.”

E por que Sadek idolatra tanto Yasiin Bey/Mos Def? “Porque ele permanece muito autêntico, não é como os rappers norte-americanos, que transformam o protesto em máquinas de fazer dinheiro, inseridos na indústria do entretenimento. Carrões, mansões com piscinas e discurso de contestação. São como os políticos. De esquerda ou direita, não me interessam. Dizem o que as pessoas querem ouvir. Você olha nos olhos e vê a falsidade. São rappers sem consciência.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.