Quarto disco solo de Nando Reis rompe laços com a antiga banda

Há algumas semanas, a rotina de Nando Reis não tem sido outra. Quando não está em turnê (nesta sexta se apresenta em Curitiba, no Teatro Guaíra), ele vem se dedicando a fazer, por telefone ou viajando por algumas capitais, as muitas entrevistas de divulgação do seu novo álbum, A Letra A, lançado recentemente pela Universal.

Quarto álbum da carreira e o primeiro após dois acontecimentos marcantes (sua conturbada saída dos Titãs e a morte de Cássia Eller, sua melhor e mais conhecida intérprete), A Letra A representa uma evolução na sua carreira como cantor e compositor.

Além de mostrar-se por inteiro (não há qualquer parceria nas doze composições), Nando dá um passo adiante neste que é seu terceiro disco lançado em apenas quatro anos. Ele se firma como nome de ponta na música pop brasileira, conjugando a melhor herança da MPB com seu passado no terreno do rock. Da primeira vertente traz os versos simples sobre amor e cotidiano, porém caprichosamente bem-construídos. Do outro segmento, revela-se um grande amante do violão, impregnando suas composições com a deliciosa veia folk que forma um dos braços do rock?n?roll americano. Esta mistura não poderia deixar de resultar em um pop sofisticado e de alta qualidade.

“Gosto de tocar, fazer discos”, explica. “Agora que estou livre, solo, quero fazer quanto mais discos eu puder.” Sobre a recente leva de álbuns de gravações inéditas – algo incomum para um artista do primeiro escalão do mercado fonográfico, seja daqui ou de fora – ele acredita que isso o faz se desenvolver como artista. “Tenho uma carreira atípica. Sempre tenho um disco pronto na cabeça”, observa.

Impensado

Para Nando, música não se faz pensando. Assim como não foi nada pensada sua saída do Titãs, grupo que ajudou a criar e que integrou por 19 anos e 11 meses. “Meu desligamento se deu exatamente porque eu tinha planos para fazer outro disco. Não digo pressão, mas um forte desejo. E isso assombrou meus companheiros. Mas no dia seguinte eu liguei para a Universal, com quem eu já vinha trabalhando no disco póstumo da Cássia.”

Enquanto terminava a turnê de Infernal… (álbum de 2002, no qual gravou composições suas que já haviam sido registradas por outros intérpretes), já ia desenvolvendo as novas músicas. “Há, sim, uma relação entre esses dois discos”, reconhece. “Até os músicos são os mesmos.”

Bastaram três semanas de ensaio e dez dias de gravações no Brasil. Depois, alguns overdubs de teclados e percussões foram acrescentados nos Estados Unidos. Barrett Martin, ex-baterista do Screaming Trees que trabalhou com os Titãs em dois discos e com Nando em seu segundo álbum solo, Quando o Arco-Íris Encontrar o Pote de Ouro, ainda trouxe colaboradores mais que especiais para o disco: Peter Buck e Scott McCaughey. Buck é um dos fundadores do celebradíssimo REM. McCaughey é músico de apoio da mesma banda.

“Gravamos em Taos, Novo México. Um dia fomos para Austin, Texas, durante o festival South By Southwest [a maior celebração anual da música independente americana, com muitos shows simultâneos, e que ultimamente tem contado com bandas brasileiras como MQN, Valv e PexbaA.]. E em uma noite estava tocando o Minus 5”, conta. Como eles são todos amigos, não foi nada difícil convencer McCaughey e Buck a darem uma passadinha no estúdio de Barrett para registrarem guitarras, violões e bandolim em quatro das doze faixas.

Mulheres, corujice e serenidade

Homenagear a letra inicial do alfabeto no título deste disco foi, para o artista, algo natural. “Queria contextualizar este momento. Depois de passar quase vinte anos dentro de uma banda, estou informando que este é o início de uma outra história, tanto pessoal e profissional. Este disco, embora seja o quarto da carreira, para mim tem a mesma conotação da letra que começa o alfabeto”, relata.

Nando vai além e ainda ressalta uma segunda explicação para o batismo do álbum. “O artigo definido feminino também é muito do objeto para qual o disco é definido. As letras são para esta terceira pessoa, ?ela?. Há uma graça, harmonia, sonoridade, uma métrica que me encanta.”

A maior presença feminina de A Letra A canta na faixa-título. Sophia Reis, filha de 15 anos do cantor e compositor, faz sua estréia no mundo artístico. “Ela sempre esteve ligada em música. Então pensei em convidá-la, porque o refrão tem uma parte grave e eu queria colocar uma voz na oitava acima da minha. Chamei-a para poder dar a ela uma opção a mais na sua decisão sobre que carreira seguir no futuro”, revela o pai coruja. Por falar em corujice, uma outra faixa, Púrpura, é dedicada à sua filha mais nova, Zoé, de quatro anos (e que também dá nome à editora musical de Nando).

A Letra A deixa claro que o ex-titã, torcedor fanático do São Paulo, respeita o velho ditado futebolístico que diz que em equipe que está ganhando não se mexe. Manteve a mesma banda, a mesma sonoridade. Dentro de um mesmo time – não resistindo ao trocadilho que remete ao título da música que ganhou videoclipe e está tocando em algumas rádios (e se parece muito com os arranjos progressivos do Radiohead de OK Computer) – só não podem estar mais juntos Nando Reis e Titãs. “Dentro de um mesmo time devem existir a diversidade e a diferença de pontos de vista.” E conclui: “O confronto é necessário. É preciso admitir que as coisas têm fim. Isso não mata ninguém. Só a morte”.

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