Quadro muito pouco animador

Achar um desenho animado nacional na tevê é tarefa inglória. Atualmente, nenhuma emissora brasileira exibe sequer uma produção do gênero. Todas as que são vistas no país têm origem estrangeira, desde os tradicionais Pica-pau e Tom & Jerry até os mais recentes Bob Esponja e Os Anjinhos. Para emissoras como Globo e SBT, o motivo da evidente ausência de desenhos “made in Brazil” é a falta de produtos de qualidade no País. Já para renomados cartunistas que já se aventuraram na animação, como Maurício de Sousa e Ziraldo, a questão passa pelo baixo preço que as emissoras pagam pelos produtos importados. “Nem por decreto as emissoras vão comprar desenho brasileiro se custar 20 vezes mais caro que os de fora. É a lei da oferta e da procura”, afirma Maurício de Sousa.

O mercado de compra deste tipo de produto funciona de acordo com o tempo que o desenho está no mercado. Quando ainda é inédito, um bloco de 30 minutos alcança preços médios de US$ 1.500. O preço vai diminuindo conforme o número de exibição e se torna baixíssimo quando o desenho sai de moda. “Já presenciei um capítulo de 20 minutos do desenho japonês Pokémon ser oferecido por R$ 350. Não tem como competir com um preço destes”, lamenta Walbercy Ribas, proprietário da Start, produtora de desenhos animados há 35 anos no Brasil e que ficou famosa pelos comerciais da “Barata do Rodox” e o “Homenzinho Azul do cotonete Johnson & Johnson”.

Para o criador do Menino Maluquinho e de A Turma do Pererê, o cartunista Ziraldo, o problema é que não se montou uma estrutura para a produção de desenhos animados em grande escala no País. Além disso, a falta de tradição na área abriu uma brecha para americanos e japoneses, que estão presentes não só na televisão do Brasil como da maioria dos países do mundo. “Os caras vendem o Pica-pau por uma mixaria e as emissoras podem ficar exibindo por 50 anos. Infelizmente, hoje ainda é impensável ter uma produção de desenhos nacionais no país”, acredita o veterano cartunista.

Sucesso na Itália

Mas nem todos têm uma visão tão pessimista quanto Ziraldo. Maurício de Sousa, por exemplo, já pode contradizer as emissoras que garantem que só não passam desenhos nacionais porque os estrangeiros dão maior garantia de audiência. Isto porque desde dezembro do ano passado A Turma da Mônica está sendo exibida com sucesso na Itália pela emissora RAI 2. Com os desenhos de Maurício – produzidos na década de 80 e remasterizados em 2003 -, a audiência da emissora italiana pulou de 2 para 10 pontos, sendo que quando aparece o personagem Chico Bento há um acréscimo de um ponto. A parceria do cartunista com a Globo, no entanto, não foi como o programado. A emissora chegou a produzir em parceria com os estúdios de Maurício cerca de 80 minutos de desenhos de A Turma da Mônica e exibir vinhetas de 1 minuto diariamente, mas o cartunista resolveu não seguir adiante. “O processo de feitura não deu certo e não houve o programa da Mônica de 30 minutos como o combinado”, explica Maurício.

A Globo, por sua vez, gaba-se de ter exibido os desenhos de A Turma da Mônica, mas se esquiva de explicar em pormenores o porquê da parceria com Maurício de Sousa – que detém 70% do mercado de revistas infantis no Brasil – não foi como o combinado. A emissora – que tem como slogan que “acreditar no Brasil é a nossa vocação” -, através da Central Globo de Comunicação, se limita a tergiversar que “é inquestionável o compromisso da empresa com a cultura nacional e o interesse em desenhos animados da mesma procedência”. Já o superintendente comercial do SBT, Antônio Athaíde, é bem mais direto. Para ele, a produção nacional é incipiente e por isso não tem condições de concorrer com desenhos americanos e japoneses. No entanto, manda um aviso. “Quando houver oferta de produção nacional a preços competitivos, o SBT certamente analisará as propostas”, acena.

A Liga dos VJs Paladinos na MTV

A MTV será a primeira emissora a produzir no Brasil uma série de animação nacional para adultos. Em 5 de abril, estréia na MTV o seriado Mega Liga de VJs Paladinos, que terá 20 episódios de 30 minutos cada. A produção, que será exibida todas as segundas-feiras, às 23 h, transforma os VJs da emissora em super-heróis e vilões e já teve uma pré-estréia em outubro passado no formato de programetes de três minutos dentro do programa Gordo a Go-go. A maneira que o produto surgiu na MTV não deixa de ser pitoresca. Há dois anos, a emissora abriu espaço para exibir animações caseiras no programa de João Gordo e recebeu neste período cerca de 200 vídeos das mais variadas qualidades. Até que um dia chegou uma animação de 5 minutos que misturava na história VJs e artistas. “Nós amamos e contratamos o Pavão, um moleque”, explica a diretora de programação Cris Lobo.

Na verdade, a MTV americana já tem uma tradição de investir em animações e a filial brasileira também queria seguir o mesmo caminho. Mas só agora que vai conseguir produzir um desenho animado mais barato do que comprava os importados. Um capítulo de Beavis and Butt-Head, por exemplo, saía para a emissora por US$ 1.500, custo superior ao que a emissora vai gastar para produzir um capítulo de 30 minutos de Mega Liga dos VJs Paladinos. “Até porque vamos ter três patrocinadores, sendo que a Fiat já comprou uma das cotas”, comemora Cris. Além de ter a ver com o universo dos espectadores adolescentes – alvo da MTV -, a diretora acredita que é uma maneira de trazer prestígio e diversidade para a programação. “As emissoras também precisam arriscar”, alfineta.

Primeiro foi na década de 50

# O primeiro longa de animação no Brasil foi Sinfonia Amazônica, produzido na década de 50 pelo carioca Anélio Latine Filho.

# Tramita atualmente na Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei do deputado Vicentinho em que as emissoras de televisão abertas e por assinatura deverão veicular desenhos nacionais. O percentual aumenta 10 pontos a cada ano, até chegar a 50% no quinto ano de vigência.

# A Turma do Pererê, de Ziraldo, deve virar filme de animação produzida pela O2, de Fernando Meirelles. A técnica será a mesma de A Fuga das Galinhas.

# O longa Cine Gibi Turma da Mônica vai estrear em julho no Brasil e Itália. O custo foi de R$ 5 milhões e levou um ano e meio para ficar pronto. Maurício já tem programados mais quatro longas, um protagonizado pelo personagem Horácio.

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